QUAL É O SEU DIAGNÓSTICO?
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Autho(rs): Sérgio Daher, Wilson Eloy Pimenta Júnior, Zeno Augusto de Souza Júnior, Márcio Martins Machado, Ana Cláudia Ferreira Rosa, Murilo Tavares Daher, Renato Tavares Daher, André Luiz Passos Cardoso, Frederico Barra de Moraes |
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Paciente do sexo masculino, com 15 anos de idade, referia que há aproximadamente cinco meses iniciou quadro de lombociatalgia à esquerda, irradiando pela face posterior da coxa até o calcâneo. Relatava, ainda, que a dor era contínua e persistia mesmo em repouso, com leve melhora quando fazia uso de antiinflamatórios não-esteróides. Ao exame físico apresentava Lasègue positivo à esquerda, porém sem déficit motor ou sensitivo. Relatava também antecedente de acidente motociclístico há nove meses, com trauma lombar, mas com melhora da lombalgia em três dias, sem outras repercussões. Ainda nos antecedentes, referia esforço contínuo há um ano, decorrente de auxílio nos cuidados a idoso em cadeira de rodas. Achados de imagem Foi feita radiografia de coluna lombar, que não apresentou alterações ósseas. A tomografia computadorizada (TC) mostrou abaulamento discal difuso no nível L4-L5 (Figura 1) e à ressonância magnética (RM) se observou a presença de imagem cística arredondada, com hipersinal nas imagens ponderadas em T2, localizada no recesso lateral esquerdo de L4-L5, deformando o contorno do saco dural e borrando a gordura local, compatível com cisto sinovial (Figuras 2A a 2D). Não foi evidenciado sinal de hemorragia.
O paciente foi submetido a ressecção microscópica do cisto por foraminotomia ampla ao nível de L4-L5 e o material encaminhado para exame anatomopatológico, no qual se observou tecido de coloração pardacenta, consistência elástica, medindo 0,5 × 0,3 × 0,1 cm, que confirmou o diagnóstico de cisto sinovial cronicamente inflamado, com sinais de hemorragia antiga e recente (Figura 3AC).
Diagnóstico: Cisto sinovial lombar.
COMENTÁRIOS A maioria dos autores distingue os cistos sinoviais, envoltos por células sinoviais, dos cistos ganglionares, que não possuem tais células(1). No entanto, alguns autores têm preferido não fazer essa distinção, já que estes só podem ser diferenciados por meio de exame histopatológico, e do ponto de vista clínico e de tratamento são semelhantes, agrupando-os sob o termo cistos justafacetários(2,3). A principal hipótese para a sua etiologia seria a degeneração(47) ou trauma(79) das articulações zigoapofisárias, levando a uma hipermobilidade e conseqüente herniação da sinóvia(4,9). De fato, a maioria dos casos está associada a espondilolistese(1012). Isso explicaria o maior acometimento do nível L4-L5(7,13), que é o segmento com maior mobilidade da coluna vertebral, e a maior incidência após a quinta década de vida(14). Alguns autores têm relatado média de idade de 60 anos, com extremos de 33 e 80 anos(7,15), porém alguns têm descrito casos em pacientes mais jovens, relacionados a traumas(8). Cameron e Hanscom(16) descreveram o caso de um adolescente de 19 anos de idade que desenvolveu cisto sinovial em L4-L5 após a fusão posterior de L5-S1. Também Maezawa et al.(17) relataram o caso de um estudante de 15 anos de idade portador de cisto sinovial em L4-L5, possivelmente relacionado a excesso de atividade esportiva. No caso do nosso paciente, também com 15 anos de idade, a história clínica sugere que o cisto possa estar relacionado ao episódio de trauma e ao esforço contínuo a que ele vinha sendo submetido. Em seus exames de imagem não foram evidenciados sinais de espondilolistese. Com a difusão da TC e da RM, tem havido aumento no diagnóstico dessa entidade(10,13,1820). A TC geralmente mostra lesão cística adjacente à faceta articular, com densidade semelhante à periferia do disco intervertebral e valor de atenuação semelhante ao do líquido cefalorraquidiano no centro(16). Pode, também, evidenciar a presença de gás no interior do cisto, sugerindo a sua comunicação com a faceta articular ou com o disco degenerado(21,22). Já na RM o cisto sinovial normalmente se apresenta como lesão cística, regular, bem circunscrita, com hipersinal nas imagens ponderadas em T2, contígua à articulação(7,15,20,23) . Os cistos hemorrágicos podem se apresentar com sinal hiperintenso em relação ao líquor nas imagens em T1, devido à grande quantidade de proteínas presentes no cisto, e hipossinal em T2, possivelmente devido à presença de depósitos de hemossiderina na cápsula fibrosa(17). No presente caso, apesar de não terem sido observados sinais de hemorragia nos exames de imagem, o estudo histopatológico comprovou a presença de hemorragia tardia e recente, que no nosso caso não esteve relacionada com início súbito dos sintomas ou exacerbação destes. A presença de hemorragia no anatomopatológico é pouco freqüente nesse tipo de lesão(13,24), correspondendo apenas a 18 dos 161 casos estudados por Lyons et al.(13). Os sintomas correspondem, na maioria dos casos, em radiculopatia (85%) e claudicação neurogênica (44%), associados a perda sensitiva (43%) e fraqueza muscular (27%). Ao exame físico também podem apresentar variações dos reflexos (57%) e variantes da síndrome da cauda eqüina (13%)(13), mimetizando o quadro de uma hérnia discal lombar. O tratamento usualmente consiste na ressecção cirúrgica, infiltração com corticóides, aspiração percutânea e imobilização, estes últimos apresentando apenas alívio temporário dos sintomas(25,26). Recentemente, tem sido descrita a excisão percutânea guiada pela TC(27), no entanto, a ressecção cirúrgica ainda é o tratamento de escolha para os casos que cursam com dor persistente ou déficit neurológico. Neste paciente foram realizadas foraminotomia ampla e ressecção total do cisto com auxílio de microscópio, com resolução total dos sintomas. A lombociatalgia é queixa incomum em crianças e adolescentes e que deve ser bastante investigada, buscando sempre seu diagnóstico etiológico. Assim, além de fazerem parte dos diagnósticos diferenciais de radiculopatia em pacientes acima de 50 anos, os cistos sinoviais também devem ser lembrados na avaliação dos pacientes jovens que apresentam essa queixa, principalmente quando houver história de trauma e/ou esforço contínuo.
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Endereço para correspondência
Trabalho realizado no Serviço de Cirurgia da Coluna Vertebral do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás (FMUFG), Goiânia, GO. |