ARTIGO ORIGINAL
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Autho(rs): Alberto Domingues Vianna, Edson Marchiori, Alexandre de Souza Vianna, Pedro Erthal de Souza Vianna |
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Descritores: Calcificações arredondadas, Mamografia, Câncer de mama |
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Resumo: IIIProfessor Adjunto de Ginecologia da UFF
INTRODUÇÃO O câncer de mama é hoje a principal causa de morte por câncer entre as mulheres brasileiras. Estimativas do Instituto Nacional de Câncer (INCa), RJ, indicam que, em 2000, 8.390 mortes foram decorrentes deste tipo de câncer e que somente no ano de 2003 tenham ocorrido 9.335 óbitos pela doença e 41.610 novos casos diagnosticados no Brasil(1). Alguns estudos revelam aumento da incidência em pacientes com menos de 55 anos e mais de 65 anos, além de aumento dos casos diagnosticados em virtudo dos programas de rastreamento mamográfico. Hoje, o rastreamento é plenamente aceito, mostrando redução da mortalidade de 24% nas mulheres entre 40 e 49 anos e de 30% nas pacientes com mais de 50 anos(24). O câncer de mama, quando diagnosticado na fase in situ, é potencialmente curável com tratamento por mastectomia em cerca de 90% dos casos(5,6). O tratamento conservador com quadrantectomia isoladamente ou associada à radioterapia é considerado boa alternativa, com índices de recidiva local de 7% a 16%(7). Cerca de 75% a 95% dos carcinomas ductais in situ (CDIS) são hoje diagnosticados na fase pré-clínica somente pelo achado de calcificações na mamografia, presentes em 50% de todos os casos de câncer de mama(811). Portanto, é fundamental o diagnóstico precoce do câncer, principalmente na fase in situ, quando é de extrema importância o conhecimento das calcificações mamárias pelo médico radiologista, para que indique corretamente biópsias nos casos suspeitos. O conhecimento da estrutura arquitetural dos CDIS permite prever que tumores micropapilares, cribriformes e papilíferos, por terem cavidades arredondadas, darão origem a calcificações com esta forma. Assim, calcificações arredondadas em trajeto ductal são suspeitas, levando-se em consideração diagnósticos diferenciais que incluem, além dos CDIS, as hiperplasias (por possuírem padrão arquitetural semelhante ao CDIS cribriforme) e os papilomas (por serem arquiteturalmente iguais ao CDIS papilífero)(12).
MATERIAIS E MÉTODOS Foram correlacionados os achados mamográficos e anatomopatológicos de 16 pacientes com diagnóstico histopatológico de câncer de mama, cujas mamografias apresentaram como única alteração calcificações arredondadas, no período entre 1988 e 2002. As mamografias foram realizadas no Serviço de Radiologia do Hospital Antônio Pedro, da Universidade Federal Fluminense (UFF), e em clínica particular (Instituto de Radiologia S/A IRSA), ambos em Niterói, RJ, em mamógrafos DMR e 600T da General Electric do Brasil, com filmes e "écrans" Kodak Min-R e Min-R 2000. Os exames histopatológicos foram realizados no Departamento de Patologia da Faculdade de Medicina da UFF e nos laboratórios particulares Saddy Diagnósticos e Nucleolab, em Niterói. Nas mamografias constavam, além das incidências básicas (crânio-caudal e médio-lateral oblíqua), incidências localizadas com ampliação das calcificações suspeitas. Foram avaliados, além da forma, o padrão de distribuição e o número de calcificações. Quanto à distribuição, elas foram classificadas como: Ductais Aglomerados com forma triangular/trapezoidal, em linha e fusiformes, em nítido trajeto ductal. Lobulares Aglomerados arredondados (cacho de uva ou roseta). Indefinido Quando não se enquadraram nos padrões acima. Em relação ao número, foram divididos em até 10, de 10 a 20 e mais de 20. Foram analisados os achados mamográficos e as radiografias das peças cirúrgicas, sendo usada a classificação anatomopatológica de Rosen(13) quanto à arquitetura dos CDIS: micropapilar, cribriforme, sólido, comedocarcinoma e papilífero.
RESULTADOS Quanto aos resultados histopatológicos, das 16 lesões biopsiadas, cinco apresentaram dois tipos histológicos concomitantes, perfazendo um total 21 tumores. Nove (42,9%) lesões eram do tipo cribriforme (Figuras 1 e 2), sendo cinco puros e quatro associados dois ao carcinoma ductal infiltrante, um ao CDIS micropapilar e um ao CDIS tipo comedo. Cinco (23,8%) lesões eram CDIS micropapilares (Figura 2), sendo três puros e dois associados um ao CDIS cribriforme e um ao CDIS tipo comedo. Quatro (19%) lesões eram do tipo comedo (Figura 3), sendo dois puros e dois associados um ao CDIS cribriforme e um ao tipo micropapilar. Duas lesões (9,5%) eram carcinoma ductal infiltrante, ambos associados ao CDIS cribriforme. Uma lesão (4,7%) era CDIS papilífero puro (Figura 4).
Entre os 16 tumores estudados, nove (56,25%) apresentaram padrão de distribuição indefinido, cinco (31,25%) mostraram padrão ductal e dois (12,5%) tinham padrão lobular (Figura 5). Em relação ao número de calcificações, 12 (75%) apresentaram mais de 20, dois (12,53%) tinham entre 10 e 20, e dois (12,5%), menos de 10 calcificações.
DISCUSSÃO Apesar da ocorrência de calcificações arredondadas ser esperada em CDIS tipos micropapilar, cribriforme e papilífero, por suas estruturas anatômicas serem formadas por pequenas cavidades arredondadas no interior dos ductos que servem de molde para as calcificações, o relato de tumores diagnosticados apenas pelo achado de calcificações arredondadas nas mamografias é incomum. Lanyi(6) encontrou cinco casos (4%) dentre 121 estudados, todos relacionados a tumores cribriformes e micropapilares. Stomper e Connolly(11), em estudo de tumores com calcificações, correlacionando os achados nas mamografias com os resultados histológicos, encontraram calcificações arredondadas (granulares) em 16 (94%) dos 17 CDIS tipo cribriforme. Entretanto, não há referência ao achado de somente calcificações arredondadas nos casos estudados. Em 1999, Evans et al.(13) publicaram trabalho no qual revisaram mamografias de 50 pacientes com CDIS. Foram comparados os achados mamográficos na época do diagnóstico com as mamografias anteriores. Onze mamografias prévias foram consideradas anormais, todas com calcificações. Os autores concluíram que os achados não valorizados nos primeiros exames foram: pequenos aglomerados com menos de dez calcificações, ausência de calcificações lineares, ausência de distribuição ductal e a presença predominante de calcificações puntiformes. Em 2002, Vianna e Marchiori(14) publicaram trabalho de correlação entre achados mamográficos e anatomopatológicos de 30 casos de carcinomas de mama que apresentaram calcificações nas mamografias. Entre os 30 casos, 14 eram do tipo cribriforme e, destes, seis (42,5%) apresentaram somente calcificações arredondadas. Sete tumores eram do tipo micropapilar, um era CDI e um estava associado ao tipo comedo (ambos apresentaram calcificações pleomórficas). Dos cinco tumores restantes, quatro (80%) evidenciaram apenas calcificações arredondadas. A ocorrência freqüente de calcificações pleomórficas nos CDIS deve-se à concomitância dos vários subtipos histológicos, principalmente ao CDIS tipo comedo que, por não possuir cavidades arredondadas, predispõe à formação de calcificações lineares e ramificadas. Exemplos claros deste fato são tumores que começam somente com calcificações arredondadas e que, por não serem diagnosticados, evoluem com o aparecimento de formas lineares, ramificadas e nódulo (invasão). Quanto à distribuição, o esperado seria o padrão ductal, que nem sempre ocorre, devido às calcificações formarem aglomerado muito pequeno ou estarem distribuídas de maneira esparsa. O padrão lobular, encontrado em dois casos do nosso estudo, pode ser explicado pela cancerização do lóbulo (invasão do lóbulo pelo CDIS)(12). A grande dificuldade no diagnóstico diferencial mamográfico entre as lesões benignas e malignas está nos casos em que o padrão de distribuição é indefinido ou lobular, uma vez que, nesses casos, o diagnóstico diferencial envolve alterações fibrocísticas (que são as alterações mais freqüentemente encontradas na mama)(15), os vários tipos de adenose, fibroadenomas, neoplasias lobulares e calcificações que ocorrem em dúctulos lobulares de causas indeterminadas (possivelmente depósito de sais de cálcio em restos celulares após descamação normal do epitélio)(16).
REFERÊNCIAS 1.Instituto Nacional de Câncer (INCa). Câncer de mama. Disponível em www.inca.gov.br/cancer/tipos/mama. Consultado em 8 de junho de 2004. [ ] 2.Shapiro S. Screening: assessment of current studies. Cancer 1994;74:2318. [ ] 3.Smart CR, Hendrick RE, Rutledge JH III, Smith RA. Benefit of mammography screening in women ages 40 to 49 years. Current evidence from randomized controlled trials. Cancer 1995;75:161926. [ ] 4.Tabar L, Fagerberg G, Chen HH, et al. Efficacy of breast cancer screening by age: new results from the Swedish Two-County Trial. Cancer 1995;75: 250717. [ ] 5.Frasson A, Koch HA, Mariguchi EH. Lesões mamárias não-palpáveis: quando não biopsiar? Rev Bras Mastol 1999;9:714. [ ] 6.Lanyi M. Diagnosis and differential diagnosis of breast calcifications. 1st ed. Berlin: Springer-Verlag, 1986:108. [ ] 7.Silverstein MJ. Ductal carcinoma in situ of the breast. 1st ed. Baltimore: Williams & Wilkins, 1997:chapt. 42. [ ] 8.Holland R, Hendriks JH. Microcalcifications associated with ductal carcinoma in situ: mammographic-pathologic correlation. Semin Diagn Pathol 1994;11:18192. [ ] 9.Kopans DB, Nguyen PL, Koermer FC, et al. Mixed form, diffusely scattered calcifications in breast cancer with aprocrine features. Radiology 1990; 177:80711. [ ] 10.Queiroz RY, Hummel AC. O valor das calcificações agrupadas no diagnóstico precoce do câncer de mama. Rev Bras Câncer 1995;41:2031. [ ] 11.Stomper PC, Connolly JL. Ductal carcinoma in situ of the breast: correlation between mammographic calcification and tumor subtype. AJR 1992;159: 4835. [ ] 12.Rosen PP. Breast pathology. 1st ed. Philadelphia: Lippincott-Raven, 1997:chapt. 14. [ ] 13.Evans AJ, Wilson AR, Burrell HC, Ellis IO, Pinder SE. Mammographic features of ductal carcinoma in situ (DCIS) present on previous mammography. Clin Radiol 1999;54:6446. [ ] 14.Vianna AD, Marchiori E. Calcificações malignas da mama. Correlação mamografia-anatomia patológica. Radiol Bras 2002;35:1317. [ ] 15.Tavassoli FA. Pathology of the breast. 2nd ed. Stanford: Appleton & Lange, 1999:chapt. 5. [ ] 16.Kopans DB. Breast imaging. 2nd ed. Philadelphia-New York: Lippincott-Raven, 1998:chapt. 2. [ ]
Endereço para correspondência Recebido para publicação em 1/9/2004. Aceito, após revisão, em 23/9/2004.
* Trabalho realizado no Departamento de Radiologia da Universidade Federal Fluminense (UFF), Rio de Janeiro, RJ. |