Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 38 nº 1 - Jan. / Fev.  of 2005

ARTIGO ORIGINAL
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Page(s) 11 to 15



Prevalência de achados pulmonares em 55 pacientes com neoplasias esofagianas

Autho(rs): Tiago Alves de Brito Zan, Fabrício Corrêa de França, Marcos Pontes Muniz, José Antônio Cordeiro, Aldenis Albenese Borim, Patrícia Maluf Cury

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Texto em Português English Text

Descritores: Câncer do esôfago, Pulmão, Tabagismo, Metástase

Keywords: Cancer of esophagus, Lung, Smoking, Metastasis

Resumo:
OBJETIVO: Identificar alterações pulmonares em pacientes com neoplasia esofágica. Comparar os dados obtidos, além de mostrar sua relação com o tabagismo. MATERIAIS E MÉTODOS: Estudo transversal tipo série de casos. Foram analisados prontuários e exames de imagem (tomografias computadorizadas e radiografias) de 55 pacientes com câncer de esôfago, diagnosticados entre 1998 e 2001, no Hospital de Base de São José do Rio Preto. Comparou-se a freqüência dos tumores encontrados e outras alterações pulmonares em dois grupos de pacientes: tabagistas e não tabagistas. RESULTADOS: Quarenta e seis (83%) pacientes apresentaram carcinomas espinocelulares, sete (13%) adenocarcinomas, um (2%) carcinoma de pequenas células e um (2%) linfoma não-Hodgkin. Quarenta e oito (87%) pacientes eram tabagistas e sete (13%) eram não tabagistas. Entre os tabagistas, 89% possuíam carcinoma espinocelular, 9% adenocarcinoma e 2% carcinoma de pequenas células. Entre os não tabagistas, 57% apresentaram adenocarcinoma, 28% carcinoma espinocelular e 15% linfoma não-Hodgkin. Houve metástases em quatro tabagistas e em dois não tabagistas. A prevalência das alterações pulmonares (infiltrado intersticial, enfisema e pneumonia) foi maior nos tabagistas (73%) do que nos não tabagistas (27%) (p = 0,03). CONCLUSÃO: Este fato reforça a importância da avaliação pulmonar nos pacientes com neoplasia esofágica.

Abstract:
OBJECTIVE: To identify lung abnormalities in patients with esophageal cancer, to compare the obtained data and to demonstrate its relationship with smoking. MATERIALS AND METHODS: This was a series of cases type of cross-sectional study. We studied 55 patients with esophageal carcinoma diagnosed between 1998 and 2001 at "Hospital de Base de São José do Rio Preto", SP, Brazil. Chest plain films and computed tomography scans were analyzed. The frequency of the tumors and other lung abnormalities in two groups of patients were compared: smokers and non-smokers. RESULTS: Forty-six (83%) patients had spinous cell carcinoma, seven (13%) adenocarcinomas, one (2%) carcinoma of small cells and one (2%) non-Hodgkin lymphoma. Forty-eight (87%) patients were smokers and seven (13%) were non-smokers. In the smokers group, 89% had spinous cell carcinoma, 9% adenocarcinoma and 2% small cells carcinoma. In the non-smokers group, 57% had adenocarcinoma, 28% spinous cell carcinoma and 15% non-Hodgkin lymphoma. Metastases were identified in four smokers and in two non-smokers. The prevalence of the lung abnormalities (interstitial infiltration, emphysema and pneumonia) was higher in the smokers group (73%) than in the non-smokers group (27%) (p = 0.03). CONCLUSION: This fact reinforces the importance of evaluation of the lungs in patients with esophageal neoplasms.

IIIMédico, Professor do Serviço de Radiologia da Funfarme/Famerp
IVProfessor Doutor, Livre-Docente de Estatística da Famerp
VMédico, Professor Doutor do Departamento de Cirurgia da Funfarme/Famerp
VIMédica, Professora Doutora do Departamento de Patologia da Funfarme/Famerp

Endereço para correspondência

 

 

INTRODUÇÃO

Os tumores malignos do esôfago são mais comuns em negros do que em brancos, em homens do que em mulheres e aparecem mais freqüentemente depois dos 50 anos de idade(1). Estão entre os mais sombrios dos tumores viscerais, devido aos sintomas pouco expressivos e ao seu estágio avançado na época do diagnóstico(2,3), pertencendo a maioria ao estágio TNM III(4,5).

Apresentam comportamento biológico agressivo, com infiltração local, comprometendo linfonodos mediastinais, supraclaviculares, celíacos e cervicais(6). Na maioria dos casos esses tumores se estendem para fora da parede esofágica, pois a ausência da serosa favorece a extensão(1). Desse modo, existe o comprometimento direto de estruturas torácicas, principalmente pulmões(7), traquéia e árvore brônquica(8-10), aorta, nervo laríngeo recorrente esquerdo, e também extratorácicas, como o cérebro e outros órgãos(11).

O carcinoma de células escamosas (com incidência maior que 85%) e o adenocarcinoma são os tipos mais freqüentes de carcinomas esofágicos(1,3,12,13) e estão relacionados com o consumo de álcool e tabaco, além de outras causas(14-17).

O tabaco é descrito como um dos fatores envolvidos na gênese dos tumores malignos do esôfago e também está intimamente relacionado à neoplasia pulmonar. Nos casos de neoplasia pulmonar, os tipos freqüentemente relacionados são o carcinoma epidermóide e o carcinoma de pequenas células ("oat cell")(18).

As alterações pulmonares comumente observadas nos exames de imagem do tórax de pacientes com neoplasias são pneumonite, enfisemas parasseptal e centrolobular, derrame pleural, abscesso pulmonar(6) e nodulações(18-20).

Os sintomas podem corresponder tanto à presença direta do carcinoma esofágico, comprometendo o pulmão, como também pelo tabaco, que pode ocasionar alterações pulmonares como neoplasia primária pulmonar, maior incidência de infecções respiratórias, e também o enfisema e alterações intersticiais (os quais podem limitar o prognóstico diante de uma diminuição da reserva cardiopulmonar destes pacientes)(21,22).

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Estudo transversal tipo série de casos, no qual foram analisados prontuários e exames de imagem, tomografias computadorizadas (TC) e radiografias (raios-X) de 55 pacientes com câncer de esôfago. O período estudado foi de janeiro de 1998 a agosto de 2001. Foram comparadas a freqüência dos tumores encontrados e as alterações pulmonares em dois grupos de pacientes: tabagistas e não tabagistas.

De acordo com o protocolo do serviço, foram realizados broncoscopias e lavados broncoalveolares na maioria dos casos.

 

RESULTADOS

Dos 55 pacientes estudados, 46 eram do sexo masculino (84%) e nove eram do sexo feminino (16%). Em relação ao fumo, 48 eram tabagistas (87%) e sete eram não tabagistas (13%).

Quanto ao tipo histológico de câncer de esôfago, o mais freqüente foi o carcinoma espinocelular, presente em 46 indivíduos (83%). Sete pacientes (13%) apresentaram adenocarcinoma e um paciente (2%), carcinoma de pequenas células. Em um outro paciente (2%) foi diagnosticado linfoma não-Hodgkin através da realização da imuno-histoquímica em fragmentos da peça cirúrgica.

Entre os tabagistas, a lesão esofágica mais freqüente foi o carcinoma espinocelular, em 43 pacientes (90%). Em quatro pacientes (8%) foi diagnosticado o adenocarcinoma e em um (2%), carcinoma de pequenas células.

Entre os não tabagistas, as formas espinocelular e adenocarcinoma ocorreram, respectivamente, em três pacientes cada, com freqüência aproximada de 43% para ambas as formas. Um paciente (14%) apresentou linfoma não-Hodgkin.

Em nenhum dos não tabagistas foi realizada broncoscopia com lavado broncoalveolar, ao passo que entre os tabagistas, em 35 (73%) foi possível realizá-la. Dentre esses, nove (26%) apresentaram lavado positivo para células neoplásicas e 26 (74%) eram negativos.

A prevalência de alguma alteração pulmonar nos pacientes com câncer de esôfago, baseada na análise dos raios-X e das TC do tórax, foi de 67%.

No grupo dos tabagistas as alterações pulmonares verificadas foram: 27 (56%) dos pacientes apresentaram enfisemas parasseptal e centrolobular (Figura 1); seis (12%), bolhas (Figura 2); 12 (25%), espessamento intersticial peribroncovascular; sete (15%), derrame pleural (Figura 3); seis (12%), pneumonias (Figura 4); e seis (12%), metástases (Figuras 5, 6 e 7).

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Entre os não tabagistas não se evidenciaram as alterações descritas acima.

A freqüência de alterações pulmonares, independente da presença ou não de metástases, foi maior entre os indivíduos tabagistas do que entre os não tabagistas (73% e 29%, respectivamente; p = 0,03) (Gráfico 1).

 

 

DISCUSSÃO

A prevalência das alterações pulmonares nos pacientes com câncer esofágico, independente da presença ou ausência de metástases pulmonares, foi maior entre os tabagistas, reforçando a relação do tabagismo com doenças nos pulmões. Apesar de nove tabagistas terem apresentado lavados broncoalveolares positivos para células neoplásicas, apenas quatro deles tinham metástases pulmonares aos exames de imagem. Sessenta e sete por cento dos pacientes com câncer esofágico apresentaram alguma alteração pulmonar aos raios-X e às TC de tórax. Considerando esses resultados, a avaliação pulmonar e a continuidade do estudo se mostram relevantes. Ambas contribuem para uma melhor abordagem terapêutica, minimizando, assim, os impactos que acometimentos do sistema respiratório promovem sobre o prognóstico desses pacientes.

 

REFERÊNCIAS

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Endereço para correspondência
Profa. Dra. Patricia Maluf Cury
Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto, Departamento de Patologia
Avenida Brigadeiro Faria Lima, 5416, Vila São José
São José do Rio Preto, SP, 15090-000
E-mail: pmcury@famerp.br

Recebido para publicação em 12/8/2003. Aceito, após revisão, em 3/3/2004.

 

 

* Trabalho realizado na Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp)/Hospital de Base - Fundação Faculdade Regional de Medicina de São José do Rio Preto (Funfarme), São José do Rio Preto, SP.


 
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