ARTIGO ORIGINAL
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Autho(rs): Juan Fernando Delgado, André Mozart Miranda Vieira, José Carlos Cruz, Laura Natal Rodrigues |
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Descritores: Radioterapia, Radiocirurgia estereotáxica, Acelerador linear, Controle de qualidade em radioterapia, Cálculo de unidades monitoras, Colimador micromultilâminas |
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Resumo:
INTRODUÇÃO Um programa de controle de qualidade em radioterapia externa deve realizar a verificação de unidades monitoras em forma independente do cálculo do sistema de planejamento. Em técnicas de tratamento convencionais esta constatação pode ser feita manualmente e de modo muito simples. Com o uso de novas técnicas de tratamento, como a radioterapia por intensidade modulada de feixe (IMRT) e o arco dinâmico, o cálculo da dose pontual e as distribuições de dose dos planejamentos são mais complexos e a verificação de forma manual chega a ser muito difícil ou mesmo inviável. Nesses casos, a utilização de ferramentas computacionais ajuda nessa verificação e, junto com a medição da dose absoluta, torna-se um componente essencial do programa de controle de qualidade para as técnicas mencionadas. Cada tratamento de arco dinâmico possui um número significativo de segmentos a ser verificado, já que a cada 10º de arco, o sistema de planejamento gera um segmento. Um tratamento geralmente é constituído por vários arcos. Uma das técnicas de tratamento para radiocirugia estereotáxica é o arco dinâmico. O principio é a conformação do volume-alvo para liberar nele uma dose alta, poupando os tecidos sadios circundantes. Ao mesmo tempo em que o sistema de suporte funcional (gantry) do acelerador gira, formando um arco, as lâminas do colimador micromultilâminas (mMLC) conformam o alvo em forma dinâmica, adaptando-se ao volume-alvo em cada projeção. Esta técnica apresenta vantagens com relação às outras técnicas na conformação da dose, desde que a implementação, o diagnóstico, o planejamento, o controle de qualidade e o tratamento sejam realizados de forma rigorosa. Apresentam-se, neste trabalho, os resultados obtidos por meio de um programa computacional de tipo planilha eletrônica que foi desenvolvido como ferramenta de verificação e controle de qualidade no Departamento de Radioterapia do Hospital Israelita Albert Einstein. O algoritmo usado na elaboração do programa permite o cálculo de unidades monitoras, ou dose absorvida, em tratamentos de arco dinâmico.
MATERIAIS E MÉTODOS O equipamento utilizado nos tratamentos de radioterapia e radiocirurgia com arco dinâmico do Hospital Israelita Albert Einstein é um acelerador monomodal Clinac 600C (Varian Medical Systems; Palo Alto, Califórnia, EUA) com sistema de mMLC modelo m3 (BrainLAB, AG; Heimstetten, Alemanha) acoplado nele. O sistema tem a capacidade de produzir campos conformados, campos de intensidade modulada, em modo dinâmico e estático, e terapia rotatória dinâmica, mais conhecida como arco dinâmico(1). O sistema de planejamento utilizado para gerar os tratamentos é o Brainscan v. 5.3 (BrainLAB, AG; Heimstetten, Alemanha). O cálculo é realizado em etapas: a definição geométrica das projeções do arco, a otimização considerando as características físicas das lâminas, e, por último, a contribuição da transmissão através do mMLC. O cálculo direto da distribuição de dose é baseado no algoritmo de feixe estreitamente colimado (pencil beam)(2,3) e utiliza correção para heterogeneidades. Terminado o planejamento de um tratamento por arco dinâmico, este é revisado e discutido conjuntamente entre radioterapeuta e físico para sua aprovação. Uma vez aceito, os dados do plano de tratamento são enviados pela rede de registro e verificação para o controle do acelerador linear. Nesse momento devem ser desenvolvidas tarefas de controle de qualidade do plano de tratamento escolhido. O sistema de planejamento permite exportar o plano a um objeto simulador, no qual é possível realizar medidas de dose absoluta, com câmara de ionização, e de distribuição de dose, com filme de verificação dosimétrica. Os dados de tratamento para cada arco, como ângulo inicial e final do sistema de suporte funcional, ângulo de mesa, pontos de localização do isocentro, configuração do mMLC, dose e unidades monitoras, são, então, verificados. Deve-se determinar a dose absoluta a partir do plano gerado no objeto simulador seguindo os protocolos de determinação de dose absorvida(4,5). Outra etapa muito importante, como parte do programa de controle da qualidade, é a verificação das unidades monitoras calculadas pelo sistema de planejamento(6?9). Para isso, foi desenvolvido um programa computacional de verificação do tipo planilha eletrônica, com o objetivo de facilitar o cálculo de unidades monitoras, que, diferentemente das técnicas convencionais de radioterapia, não pode ser feito de forma direta e intuitiva. A idéia inicial é verificar o cálculo com poucos dados de entrada(10). Para verificar as unidades monitoras, o programa desenvolvido precisa de alguns parâmetros para calcular a dose prevista pelo sistema de planejamento no ponto de normalização. São utilizados os seguintes parâmetros: ? os arquivos com as posições das lâminas do mMLC de cada arco, divididas em segmentos separados por um ângulo de gantry de 10º, exportados pelo sistema de planejamento; ? as profundidades médias, equivalentes à água, do ponto de normalização para cada arco; ? as unidades monitoras (ou dose) no relatório final do plano escolhido. Na Figura 1 encontra-se um exemplo da tela com o arquivo em formato texto (.txt), exportado pelo sistema de planejamento, contendo a informação do número de segmentos e as posições das lâminas de cada segmento de campo de tratamento.
Com esses três conjuntos de dados, o programa calcula o quadrado equivalente de cada segmento dos arcos de tratamento usando a relação de Sterling(11). Com a profundidade equivalente de cada arco, o programa determina os valores da razão tecido máxima, dos fatores de espalhamento e das razões fora do eixo central, a partir dos valores obtidos no comissionamento do equipamento(12,13). Para determinar as razões fora do eixo central de cada segmento, as coordenadas gravitacionais devem ser calculadas por meio das seguintes relações: O número total de unidades monitoras de cada arco dinâmico é distribuído igualmente entre os segmentos que o compõem. A contribuição de cada segmento do arco (coni), para a dose prescrita no ponto de normalização (no eixo central), é definida de acordo com o grau de cobertura do ponto de normalização pelas lâminas. Se a distância do ponto de normalização até a borda mais próxima das lâminas é maior que 0,5 cm, a contribuição do campo descoberto é máxima (coni = 1,0). Para os pontos cobertos pelas lâminas em pelo menos 0,5 cm, a contribuição é aquela determinada pela transmissão do sistema de multilâminas, obtida no comissionamento do sistema(13). Quando o ponto de normalização está entre os pontos descritos anteriormente, localizados a 0,5 cm da borda das lâminas e cobertos até 0,5 cm, o algoritmo determina a contribuição interpolando-a linearmente, dependendo da posição do ponto de normalização com relação à posição das lâminas. Assim, as unidades monitoras de cada segmento são determinadas a partir da seguinte relação: em que UMSP são as unidades monitoras calculadas pelo sistema de planejamento e UMi são as unidades monitoras de cada segmento. A dose com a qual cada segmento contribui para o ponto de normalização é calculada pela seguinte expressão: Na ultima equação, Di é a dose de cada segmento, UMi são as unidades monitoras de cada um dos segmentos, TMRi é a razão tecido máximo na profundidade equivalente para cada segmento, Scp,i é o fator total de espalhamento para o campo equivalente do segmento que está sendo calculado. OARi é a razão fora do eixo obtida a partir da posição do ponto de gravitação do segmento. A dose total do arco é obtida pela soma das contribuições dos segmentos: As doses calculadas pelo software desenvolvido (DAD-VER) foram comparadas com as doses calculadas pelo sistema de planejamento (DAD-SP): Também foram comparados os resultados a partir das doses totais em tratamentos diferentes. Nesses casos, as diferenças entre a dose de tratamento gerada pelo programa de verificação desenvolvido (DTOTAL-VER) e a dose total calculada pelo sistema de planejamento (DTOTAL-SP) foram encontradas da seguinte forma: Todos os campos testados foram comparados com os respectivos cálculos do sistema de planejamento. Alguns casos foram calculados a partir das imagens de tomografia do paciente (DAD-VER-PAC), outros a partir das imagens de tomografia de um objeto simulador sólido equivalente à água (Solid Water® ? SW), sendo as doses calculadas pelo sistema (DAD-VER-SW), e por fim, os casos usando um objeto simulador de polimetilmetacrilato (PMMA) (DAD-VER-PMMA), este último desenvolvido justamente para testar campos de arco dinâmico e de intensidade modulada, simulando um crânio. Para todos os casos utilizou-se a correção por densidade de material que é própria do sistema de planejamento. Como foi descrito, cada arco de tratamento está constituído por certo número de segmentos que depende da amplitude do arco. Neste trabalho, o número maior de segmentos por arco usado nos cálculos foi 13, e o menor número foi de sete segmentos, correspondendo a arcos de 120º e 60º, respectivamente. A tela de resultados da planilha desenvolvida, para um exemplo de cálculo de um arco com nove segmentos, é apresentada na Figura 2.
RESULTADOS O programa desenvolvido foi testado com 229 feixes de arco dinâmico com o algoritmo apresentado no item anterior. Esses 229 feixes representam 42 tratamentos de crânio. Desse total, 109 campos foram calculados no sistema de planejamento nas imagens do paciente, 109 foram calculados no objeto simulador de PMMA e 21 no objeto simulador de SW. A diferença encontrada para as doses totais nos 42 tratamentos de arco dinâmico entre o programa de verificação e a dose calculada pelo sistema de planejamento foi de +1,73%, com desvio-padrão de 0,76%. A diferença máxima encontrada foi de 3,32% e a mínima, de ?020%. Os resultados são mostrados na Figura 3.
Para os 229 arcos testados, a diferença média encontrada foi de 1,61%, com desvio-padrão de 1,04%. Estes resultados encontram-se na Figura 4. Os valores máximos e mínimos das diferenças obtidos foram 4,01% e ?2,04%, respectivamente.
Os 229 arcos foram analisados segundo o meio no qual foi feito o cálculo do sistema de planejamento (imagens de tomografia do paciente, do objeto simulador de PMMA e as imagens do objeto simulador de SW). Os resultados são apresentados nas Figuras 5, 6 e 7, e na Tabela 1.
Do total de casos, 80,35% dos feixes testados encontram-se na faixa de ± 2,5% de diferença com relação às doses geradas pelo sistema de planejamento. Os valores encontrados se encontram de acordo com os citados na literatura por Linthout(14) e Linthout et al.(15).
DISCUSSÃO Uma causa dos desvios encontrados é a utilização de uma única profundidade média, chamada pelo sistema de planejamento de equivalent depth, para todos os segmentos de um mesmo arco, situação que é aproximada. Para se ter um cálculo mais exato, deveria ser utilizada a profundidade de cada segmento, e não a média das profundidades dos segmentos. No entanto, este dado é utilizado por ser o fornecido no relatório do tratamento, podendo ser facilmente inserido na planilha para o respectivo cálculo. Já no caso de utilizar este método para verificação independente de campos de IMRT, esta profundidade é a mesma para todos os segmentos que formam um campo. Outra causa das diferenças encontradas é que o algoritmo do programa de verificação considera o meio de cálculo um meio homogêneo, sem heterogeneidades (ossos, cavidades de ar, etc.), apesar de sanar, em parte, o problema ao utilizar a profundidade equivalente. O algoritmo utilizado permite que o método seja extrapolado para campos de IMRT, uma vez que o cálculo desses campos no sistema de planejamento é realizado através do algoritmo de feixe estreitamente colimado(16). Para isso, deve ser levado em consideração que nos campos de IMRT o número de segmentos por campo de tratamento é maior, e que muitos desses segmentos contribuirão à dose total devido apenas à transmissão das lâminas.
CONCLUSÕES O programa de verificação desenvolvido é ferramenta útil dentro do programa de controle de qualidade dos tratamentos de arco dinâmico com o sistema BrainLab e com campos gerados pelo algoritmo de feixe estreitamente colimado do BrainScan. O uso do programa descrito neste trabalho é recomendado para os serviços de radioterapia que utilizam esse tipo de equipamento e técnica, já que adiciona um método a mais na conferência dos dados resultantes do cálculo do sistema de planejamento para os tratamentos de arco dinâmico. Em 80,35% dos arcos testados, as doses calculadas encontram-se na faixa de ± 2,5% de diferença com relação às doses geradas pelo sistema de planejamento. Este algoritmo pode ser implementado em serviços de radioterapia que possuem o sistema de mMLC BrainLab m3, desde que os dados dosimétricos do equipamento sejam alimentados junto com os valores de penumbra e transmissão obtidos no comissionamento.
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Endereço para correspondência: Recebido para publicação em 16/10/2005.
* Trabalho realizado no Departamento de Radioterapia do Hospital Israelita Albert Einstein, São Paulo, SP. |