ARTIGO ORIGINAL
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Autho(rs): Maxime Figueiredo de Oliveira Freire, Artur da Rocha Corrêa Fernandes, Yara Juliano, Neil Ferreira Novo, Mario Carneiro Filho, Edison de Oliveira Freire Filho, Alex Franco de Carvalho, Débora da Costa Silva |
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Descritores: Ressonância magnética, Esqueleto apendicular, Joelho, Estudo comparativo, Equipamentos, Seqüências de imagem |
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Resumo: VProfessor de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Federal de Sergipe
INTRODUÇÃO Condromalácia de patela é um termo aplicado à perda de cartilagem envolvendo uma ou mais porções da patela; sua incidência na população é muito alta, aumentando conforme a faixa etária, sendo mais comum em pacientes do sexo feminino e com excesso de peso(1). As causas de condromalácia incluem instabilidade, trauma direto, fratura, subluxação patelar, aumento do ângulo do quadríceps (ângulo Q), músculo vasto medial ineficiente, mau alinhamento pós-traumático, síndrome da pressão lateral excessiva e lesão do ligamento cruzado posterior(2). Dois tipos de alterações podem ocorrer na gênese da condromalácia patelar: degeneração superficial dependente da idade (pessoas de meia-idade e idosos) e degeneração basal (adolescentes)(1). Nos pacientes jovens, as lesões da cartilagem, se não forem diagnosticadas e tratadas, podem resultar em osteoartrose prematura(3). Utilizando-se a radiografia simples e a tomografia computadorizada, consegue-se diagnosticar lesões condrais, indiretamente, pela presença de osteófitos, cistos e esclerose subcondrais e redução do espaço articular(4), e injetando-se contraste intra-articular é possível, por meio destes dois métodos, demonstrar diretamente lesões condrais, notadamente pela tomografia computadorizada(5). A ressonância magnética, com seu excelente contraste de partes moles, é a melhor técnica de imagem disponível para estudo das lesões de cartilagem(3). Os aparelhos de ressonância magnética são divididos, segundo a força do campo magnético principal, em aparelhos de ultrabaixo campo (< 0,1 T), baixo campo (0,1 a 0,3 T)(6), médio campo (entre 0,3 e 1,0 T)(7), alto campo (entre 1,0 e 2,0 T)(8) e ultra-alto campo (> 2,0 T)(9). As vantagens dos aparelhos de baixo campo, em comparação com os aparelhos de alto campo, são os menores custos de compra, instalação e manutenção(6), os artefatos de suscetibilidade magnética e por deslocamento químico ("chemical shift") bastante reduzidos(8) e a possibilidade de se usar magnetos de configuração "aberta", permitindo que pacientes claustrofóbicos sejam examinados(10). Desvantagens técnicas incluem menor relação sinal-ruído intrínseca, com necessidade de mais excitações, resultando em maiores tempos de aquisição(6), e a impossibilidade de se usar a supressão de gordura freqüência-seletiva. Aparelhos de baixo campo dependem da seqüência STIR para suprimir o sinal da gordura, que é uma seqüência demorada e com relação sinal-ruído baixa(8). A seqüência FSE T2 é uma técnica com boa acurácia para detecção das lesões de cartilagem, em razão de seu efeito "artrográfico"(11) e pelo alto sinal do edema na medular óssea(3,12), havendo também boa correlação entre o grau de lesão de cartilagem e a artroscopia(13-15). A acurácia dos aparelhos de baixo campo para o estudo da cartilagem hialina depende da seqüência utilizada. James e Buirski(16), utilizando seqüências spin eco T1 e T2, conseguiram detectar lesões condrais de grau avançado; Parizel et al.(6), utilizando seqüências spin eco T1 e gradiente eco 3D, obtiveram imagens de qualidade semelhante às do aparelho de alto campo; Kladny et al.(17), utilizando a seqüência gradiente eco 3D, não conseguiram avaliar os diferentes graus de lesão; Ahn et al.(18) concluíram que as lesões de cartilagem de alto grau podem ser avaliadas com confiança pelas seqüências gradiente eco 2D e gradiente eco 3D. O objetivo deste estudo foi comparar a eficácia diagnóstica dos aparelhos de ressonância magnética de baixo campo e de alto campo para estudo da cartilagem articular da patela usando as seqüências GRE 2D, GRE 3D, FSE T2 e STIR (baixo campo) e TSE T2 SPIR.
MATERIAIS E MÉTODOS Indivíduos O estudo foi aprovado pelo comitê de ética da Universidade Federal de São Paulo. Este estudo avaliou, prospectivamente, dois grupos de pacientes. O grupo 1 incluiu 15 pacientes com dor patelo-femoral e o grupo 2 incluiu dez voluntários assintomáticos. Dessa forma, 25 indivíduos foram incluídos no estudo, 13 deles do sexo feminino e 12 do sexo masculino. A idade variou entre 19 e 49 anos (média de 30,8 anos). Os exames foram realizados em 40 joelhos, dos quais 20 eram sintomáticos e 20 eram assintomáticos. Pacientes e voluntários com cirurgia prévia ou lesões traumáticas no joelho a ser examinado foram excluídos. Exames Os exames de ressonância magnética foram feitos em todos os indivíduos, em aparelho de alto campo de 1,5 tesla (Gyroscan T15; Philips) e em aparelho aberto de baixo campo de 0,2 tesla (Profile; General Electric Medical Systems), utilizando-se bobina de quadratura para joelho. Foram feitos cortes transversais (axiais) da patela com os pacientes em posição supina, usando as seqüências "turbo spin echo T2 with selective presaturation inversion recovery" (TSE T2 SPIR) no alto campo e "gradient echo 2D" (GRE 2D), "gradient echo 3D" (GRE 3D), "fast spin echo T2" (FSE T2) e "short tau inversion recovery" (STIR) no baixo campo (Tabela 1). Cada seqüência foi impressa em filme separado.
Análise dos achados de imagem Os dois grupos foram unidos em grupo correspondendo a 40 exames (160 seqüências de baixo campo e 40 seqüências de alto campo)(19). Cada seqüência foi analisada separadamente por um radiologista especialista em radiologia músculo-esquelética, com cinco anos de experiência e que não conhecia os dados do paciente ou os resultados das outras seqüências. Para a análise da cartilagem patelar os critérios considerados foram: alteração do sinal ou do contorno da cartilagem, e exposição e alteração do osso subcondral (Figura 1), baseado nos estudos de Bredella et al.(12) e McCauley e Disler(20). A localização da lesão condral também foi descrita: faceta medial, faceta lateral e ápice.
Analise estatística Os testes de Kappa e McNemar foram usados para estudar concordância e discordância entre as seqüências do aparelho de baixo campo e a seqüência TSE T2 SPIR (alto campo).
RESULTADOS As características dos indivíduos estão mostradas na Tabela 2.
As freqüências de lesões condrais observadas estão descritas nas Tabelas 3, 4, 5, 6 e 7.
Na faceta medial houve baixas concordâncias e as discordâncias abaixo da diagonal de concordância foram significantes (Tabela 8).
Na faceta lateral houve boas concordâncias e as discordâncias não foram significantes (Tabela 9).
No ápice houve boas concordâncias e as discordâncias acima da diagonal de concordância foram significantes (Tabela 10).
DISCUSSÃO Na faceta medial, o teste de Kappa revelou concordância baixa entre as seqüências do aparelho de baixo campo e a seqüência TSE T2 SPIR (alto campo). O teste de McNemar demonstrou discordância estatisticamente significativa para todas as seqüências, havendo superestimação de todas as seqüências do baixo campo. A principal causa para esta discordância está relacionada a áreas de aumento de sinal no interior da cartilagem, provavelmente artefatuais (Figura 2), talvez por efeito de ângulo mágico(8,21), que em algumas situações, junto com a menor resolução espacial das seqüências do aparelho de baixo campo, dificultou a gradação das lesões, o que foi também observado por James e Buirski(16) e por Ahn et al.(18).
Na faceta lateral, o teste de Kappa revelou boa concordância entre as seqüências do aparelho de baixo campo e a seqüência TSE T2 SPIR. O teste de McNemar demonstrou discordância estatisticamente não significativa para todas as seqüências. No ápice, o teste de Kappa revelou boa concordância entre as seqüências do aparelho de baixo campo e a seqüência TSE T2 SPIR. O teste de McNemar demonstrou discordância estatisticamente significativa para todas as seqüências, havendo subestimação de todas as seqüências de baixo campo. A principal causa para esta discordância pode estar relacionada, na nossa opinião, à melhor resolução espacial da seqüência TSE T2 SPIR(10) e, por conseguinte, melhor delimitação anatômica e das lesões, ou à dificuldade de definição exata do ápice, porque ele é a região que separa as facetas da patela e não existe um ponto anatômico definido entre elas (Figura 3).
A seqüência STIR apresentou os melhores resultados em todas as localizações, sendo que a seqüência GRE 3D obteve os mesmos resultados no ápice. O fato de a seqüência STIR ter apresentado as melhores concordâncias com a seqüência TSE T2 SPIR está relacionado à importância da supressão do sinal da gordura para a análise da cartilagem articular(11,15,22,23) (Figura 4).
As melhores concordâncias se deram com lesões de grau 3, como antes já observado por Ahn et al.(18) (Figura 5).
O nosso estudo apresentou algumas limitações: 1. O número de exames foi limitado; entretanto, devemos lembrar que estudos prospectivos e comparativos consomem tempo, são caros e dependem da colaboração das pessoas que vão ser examinadas. 2. Nós não usamos outros planos de corte: os cortes transversais (axiais) são os melhores para estudo da cartilagem patelar; no entanto, na prática, os cortes sagitais podem contribuir para melhor caracterização de lesões ou apenas para melhor localização das alterações no plano de corte transversal. 3. Os cortes não foram feitos exatamente na mesma localização nos aparelhos de alto e baixo campo; apesar de as espessuras de cortes serem semelhantes, o número de cortes ser igual e a programação dos cortes ser criteriosa, alguma variação é esperada, pois os exames foram feitos em aparelhos e dias diferentes. 4. Não foi utilizada artroscopia para confirmação das lesões condrais, o que não foge do nosso objetivo, ou seja, comparar os aparelhos de ressonância magnética. 5. Os exames foram direcionados para estudo da cartilagem patelar, levando o observador, talvez, a uma análise mais criteriosa da cartilagem do que seria em um exame de rotina.
CONCLUSÕES 1. A seqüência STIR teve a melhor concordância com a seqüência TSE T2 SPIR. 2. Lesões de alto grau são mais bem caracterizadas pelas seqüências do aparelho de baixo campo. 3. Áreas de aumento de sinal dificultam o estudo da cartilagem da faceta medial da patela no aparelho de baixo campo.
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Endereço para correspondência: Recebido para publicação em 31/3/2005.
* Trabalho realizado no Departamento de Diagnóstico por Imagem da Universidade Federal de São Paulo-Escola Paulista de Medicina, São Paulo, SP. |