ARTIGO ORIGINAL
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Autho(rs): Inês Minniti Rodrigues Pereira, Beatriz Regina Álvares, Jamal Baracat, Daniel Lahan Martins, Ricardo Minniti Rodrigues Pereira |
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Descritores: Lesão hipodensa hepática, Tomografia computadorizada, Infância |
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Resumo:
INTRODUÇÃO Tumores hepáticos constituem apenas 5% a 6% de todos os tumores abdominais na criança. Neoplasias hepáticas primárias são a terceira causa de malignidade na infância, depois do tumor de Wilms e do neuroblastoma, e são a malignidade mais comum do trato gastrintestinal nas crianças(1). Tais tumores são ainda um desafio para o radiologista e o clínico. Por vezes, tumores benignos simulam lesões expansivas malignas ou metástases, levando a decisões terapêuticas equivocadas. Assim, é importante que o radiologista se familiarize com as diferentes técnicas e características da variedade de tumores hepáticos(2). A ultra-sonografia (US) é freqüentemente a modalidade de imagem inicial na avaliação da criança com suspeita de lesão expansiva abdominal. Quando a US confirma a origem hepática do tumor, imagens adicionais são obtidas por tomografia computadorizada (TC) ou ressonância magnética (RM). Quanto à escolha da TC ou RM como próxima modalidade, há controvérsia e depende da experiência e disponibilidade das técnicas na instituição. A TC é técnica adequada para imagem hepática. Em virtude da rápida aquisição de imagens, é possível avaliar o parênquima hepático em duas fases (imediata e tardia), tendo em vista que o fígado tem suprimento sanguíneo duplo, melhorando assim a detecção e caracterização do tumor(3). O objetivo dos autores é relatar os diferentes aspectos tomográficos das lesões hepáticas hipodensas na infância, orientando às diferentes possibilidades diagnósticas.
MATERIAIS E MÉTODOS Foram realizados estudos tomográficos de lesões hipodensas hepáticas previamente diagnosticadas por US em 50 pacientes com idade até 16 anos, antes e após contraste venoso dinâmico e/ou helicoidal, nas dosagens de 1,5 ml/kg/peso. Realizou-se estudo com cortes de 3 a 5 mm de espessura numa primeira fase, sem injeção de contraste venoso, e numa segunda fase realizaram-se os mesmos cortes, imediatamente após injeção do contraste (fase imediata). Após 15 a 20 minutos da injeção inicial (fase tardia), foram realizados os mesmos cortes, observando-se assim o comportamento das lesões na fase imediata e na tardia. Foram analisados os aspectos das lesões e, posteriormente, algumas delas, correlacionadas com o diagnóstico anatomopatológico.
RESULTADOS Dos 50 casos estudados, 30 foram confirmados por meio de estudo anatomopatológico hepático. Os casos não biopsiados foram lesões relacionadas a hemangiomas, hemangioendoteliomas e cistos hepáticos, em que o diagnóstico foi elaborado pela história clínica, exames de US e TC e por controles posteriores. A maioria das lesões era benigna, e o hemangioma foi o mais freqüente (20% dos casos). Tais lesões apresentaram captação mais homogênea do contraste, principalmente na fase tardia (Quadro 1). As lesões malignas mais freqüentes foram as metástases (18%). A impregnação por contraste dessas lesões é irregular na fase imediata e não se altera na fase tardia (Quadro 1).
DISCUSSÃO Assim como na literatura, as lesões hepáticas benignas foram as mais freqüentes neste estudo, sendo em sua maioria hemangiomas(4,5), que são tumores mesenquimais e lesões vasculares sintomáticas mais comuns na infância(6,7). Podem apresentar-se como lesões expansivas abdominais associadas a insuficiência cardíaca de alto débito. Na TC aparece como lesão hipodensa com ou sem calcificações e após contraste venoso há captação periférica na fase imediata e na fase tardia há homogeneização da lesão (Figura 1).
O hemangioendotelioma do lactente é o tumor hepático benigno mais comum nos seis primeiros meses de vida(8,9). Na fase anterior ao contraste venoso observam-se lesões hepáticas de contornos bem definidos, com áreas centrais hipodensas e septações internas, constatando-se o mesmo comportamento dos hemangiomas na fase após contraste (Figura 2).
Hamartoma mesenquimal é uma lesão rara e benigna, acometendo mais freqüentemente crianças abaixo dos dois anos de idade. É considerado mais como falha no desenvolvimento do que uma neoplasia verdadeira. Aparece como lesão hepática cística, multiloculada, com finas septações internas. Cistos hepáticos simples são encontrados acidentalmente, mostrando-se na TC como imagens hipodensas, de contornos lisos e finos, geralmente solitários e periféricos. Não apresentam realce após injeção do contraste(10,11). Fibrose hepática congênita geralmente complica com hipertensão portal, e na TC observam-se múltiplas lesões hipodensas com calcificações das paredes, podendo ocorrer hemorragia no seu interior(12). As causas mais freqüentes de abscessos hepáticos na infância são decorrentes de apendicite perfurada ou doença granulomatosa. Apresentam-se como áreas hipodensas, com captação heterogênea após contraste venoso (Figura 3).
Quanto às lesões malignas, as mais comuns são as metastáticas. Variam de tamanho e de forma e são hipodensas na fase anterior ao contraste, bem delimitadas e múltiplas. Por serem pouco vascularizadas tornam-se irregulares com graus variados de impregnação ou mantêm-se hipodensas (Figura 4). A metástase hepática mais comum na infância é por neuroblastoma(13,14).
O hepatoblastoma é o tumor hepático mais comum na faixa etária dos lactentes jovens, antes de um ano de idade(6,15). Apresenta-se como grande lesão sólida hipodensa e central, podendo conter calcificações e áreas de hemorragia. Na fase após o contraste há realce intenso, acentuando a lobulação interna e a nodularidade (Figura 5).
O carcinoma hepatocelular (hepatoma) tem incidência elevada no adulto jovem, porém, quando aparece na infância, é mais comum nos lactentes(16). Na TC aparece como lesão solitária, grande ou multinodular hipodensa, e freqüentemente apresenta-se com área de necrose central e hemorrágica. Na fase após contraste há realce nas áreas não necrosadas (Figura 6).
O sarcoma indiferenciado hepático tem origem embrionária e representa a quarta neoplasia mais comum da infância(17,18). Apresenta-se como massa hipodensa com aspecto cístico ou heterogêneo, que depende do grau de necrose e das áreas de hemorragia, dando aspecto de áreas septadas e sólidas. Na fase pós-contraste a impregnação é irregular. Observa-se que as lesões benignas apresentam captação mais homogênea do contraste, principalmente na fase tardia, diferenciando-se assim das lesões malignas. Associando achados clínicos às características tomográficas das lesões hepáticas, direciona-se a hipótese diagnóstica.
CONCLUSÃO O presente estudo constatou que o exame tomográfico, antes e após a administração do contraste venoso, dinâmico e/ou helicoidal, foi de grande valia para a complementação da hipótese diagnóstica nas lesões hipodensas hepáticas na infância, devendo ser rotina após o diagnóstico ultra-sonográfico.
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Endereço para correspondência: Recebido para publicação em 24/6/2004.
* Trabalho realizado no Departamento de Radiologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP. |