ENSAIO ICONOGRÁFICO
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Autho(rs): Daniel Lahan Martins, Inês Minniti Rodrigues Pereira, Beatriz Regina Alvares, Lívio Nanni, Jamal Baracat |
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Descritores: Doenças torácicas, Malformação adenomatóide cística, Enfisema lobar congênito, Hérnia diafragmática congênita |
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Resumo:
INTRODUÇÃO Diversas doenças se manifestam como lesões radiotransparentes assimétricas no tórax infantil, algumas delas letais. O reconhecimento da variada manifestação radiográfica facilita o diagnóstico imediato. Malformação adenomatóide cística congênita (MACC), hérnia diafragmática congênita (HDC) e enfisema lobar congênito (ELC) podem ser condições de ameaça à vida que requerem correção cirúrgica, algumas vezes em situação emergencial. Enfisema pulmonar intersticial e pneumatoceles também podem ser letais, mas geralmente respondem a tratamento clínico. Hemitórax radiotransparente também é incluído nesta categoria e pode ser decorrente de pneumotórax, oclusão brônquica parcial ou hiperinsuflação compensatória de pulmão (sem obstrução)(1,2). Condições que se manifestam como dispnéia em recém-nascidos podem necessitar cirurgia ou procedimento intervencionista. A radiografia de tórax geralmente permite um diagnóstico precoce e acurado. Casos que necessitam de tratamento clínico geralmente têm acometimento bilateral. Casos cirúrgicos geralmente têm acometimento unilateral e efeito de massa(3,4). Existem condições encontradas incidentalmente nos estudos por imagem que não requerem intervenção imediata. Apresentamos diversos achados radiográficos destas condições e sugerimos um algoritmo diagnóstico, apontando os diferentes diagnósticos diferenciais com casos ilustrados.
MALFORMAÇÃO ADENOMATÓIDE CÍSTICA CONGENITA MACC dos pulmões é causa incomum de anomalia do desenvovimento em que há um aprisionamento da maturação pulmonar, que se pensa ser secundária a atresia brônquica primária ou falha na segmentação brônquica normal e subsequente desenvolvimento de tecido pulmonar displásico distal ao segmento afetado(5,6). Nem todos pacientes com MACC são sintomáticos ao nascimento, alguns têm apresentação tardia e diagnóstico somente na vida adulta. O ultra-som pré-natal (US) é um meio de o radiologista identificar MACC na população de crianças assintomáticas na infância(7). A alteração é geralmente unilateral, envolvendo um ou mais lobos, mas acometimento bilateral tem sido descrito. A manifestação é variável (Figuras 1 e 2), mas os três tipos principais têm sido descritos: 1) uma única e extensa área predominantemente cística; 2) múltiplas áreas císticas de tamanhos variados (0,5-1,5 cm); 3) lesão sólida(1,4,8). Quando existe preenchimento completo das áreas císticas, a radiografia demonstra um hemitórax opacificado, o que ocorre no momento do nascimento(9). Embora seja importante reconhecer esta classificação morfológica para a compreensão do espectro clínico e patológico desta doença, o reconhecimento do tipo patológico de MACC não é clinicamente importante porque o resultado, na maioria dos casos, é a ressecção cirúrgica. Ademais, existem pacientes com MACC que se apresentam com lesões histopatologicamente mistas dos tipos 1 e 2(5).
A tomografia computadorizada (TC) é exame valioso antes da cirurgia, no sentido de acessar o grau de envolvimento do pulmão ipsilateral e para diagnosticar áreas de possível envolvimento do pulmão contralateral(4).
HÉRNIA DIAFRAGMÁTICA CONGÊNITA O hemitórax assimétrico causado por HDC usualmente é visto em recém-nascidos com defeito póstero-lateral esquerdo do diafragma, conhecido como hérnia de Bochdalek(4). Estes defeitos ocorrem no lado esquerdo em 85% a 90% dos casos(10). Um efeito de massa da alça intestinal herniada pode prejudicar a ramificação e o desenvolvimento normal das vias aéreas e vasos, tanto ipsilateralmente como no pulmão contralateral. Com o aumento no diagnóstico pré-natal pelo US, terapias clínicas e cirúrgicas têm sido planejadas e realizadas com sucesso(11). O diagnóstico radiológico pós-natal geralmente não é difícil, e seus achados ajudam a predizer a sobrevivência em neonatos com HDC(12). As chaves no diagnóstico radiográfico incluem identificação de alças intestinais no tórax e abdome escavado secundário a herniação do seu conteúdo para o tórax (Figuras 3A,B e 4A,B). Daí a importância de se incluir o abdome no filme. Exame contrastado do trato gastrintestinal geralmente não é necessário para o diagnóstico (Figura 4C,D)(4).
ENFISEMA LOBAR CONGÊNITO ELC é caracterizado por distensão progressiva de um, às vezes dois lobos pulmonares. Acredita-se resultar de mecanismo valvulado brônquico, que causa hiperinsuflação progressiva do pulmão por permitir entrada de ar na inspiração(13). Em geral é diagnosticado no período neonatal ou na infância e é mais comum no sexo masculino do que no sexo feminino (3:1). O lobo superior esquerdo e o lobo médio são localizações usuais. Lobos inferiores raramente são afetados(14). Os achados radiológicos são hiperinsuflação com retenção de ar na expiração (Figura 5).
ENFISEMA PULMONAR INTERSTICIAL Bebês com ventilação com pressão positiva podem desenvolver enfisema intersticial de aparência multicística. Os cistos têm paredes finas e aparência de múltiplas pneumatoceles (Figura 6), ocasionalmente produzindo efeito de massa(4).
PNEUMATOCELES Pneumatoceles são coleções de ar com paredes finas que se desenvolvem como lesões pós-inflamatórias (Figura 7), freqüentemente após pneumonia estafilocócica(1). Também podem ser vistas após trauma e geralmente resolvem espontaneamente. Podem romper e produzir pneumotórax.
PNEUMOTÓRAX Quando os contornos do pulmão são vistos delineados por ar intrapleural, é feito o diagnóstico de pneumotórax. Um hemitórax pode aparecer maior e mais radiotransparente que o outro com áreas de aparência cística. Pneumotórax hipertensivo é suspeitado quando existe efeito de massa causando desvio mediastinal, compressão pulmonar e distorção diafragmática (Figura 8). Decúbito lateral com raios horizontais permite diagnóstico correto.
HIPERINSUFLAÇÃO COMPENSATÓRIA Hiperinsuflação compensatória de pulmão normal com desvio mediastinal em hemitórax opacificado pode ser visto em crianças com aspiração por corpo estranho (Figura 9), agenesia pulmonar, hipoplasia pulmonar, síndrome da cimitarra e seqüestro pulmonar, produzindo um tórax de aparência cística(4,15).
CONCLUSÃO Os aspectos radiológicos de tórax assimétrico pediátrico são marcados por uma ênfase em diagnóstico emergencial, pois muitas das doenças que assim se manifestam são ameaçadoras à vida. Interpretação acurada da radiografia de tórax é essencial para o diagnóstico precoce, disponibilizando informações necessárias no amplo espectro de diagnósticos diferenciais.
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Endereço para correspondência: Recebido para publicação em 7/3/2005. Aceito, após revisão, em 18/5/2005.
* Trabalho realizado no Departamento de Radiologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas, SP. |