ARTIGO DE REVISÃO
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Autho(rs): Danilo Bianchini Höfling, Giovanni Guido Cerri, Adriana Gonçalves Juliano, Suemi Marui, Maria Cristina Chammas |
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Descritores: Ultra-sonografia, Ecogenicidade, Tireoidite, Crônica, Auto-imune |
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Resumo: VDoutora, Diretora do Serviço de Ultra-Sonografia do Instituto de Radiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (InRad/HC-FMUSP), São Paulo, SP, Brasil
INTRODUÇÃO As doenças auto-imunes da glândula tireóide representam um espectro de várias desordens que têm em comum a presença de infiltrado linfocítico de intensidade variável no parênquima tireoidiano e produção de anticorpos antitireóide(1). Dentre tais desordens, a tireoidite crônica linfocítica auto-imune destaca-se como a causa mais comum de hipotireoidismo(2) e uma das mais freqüentes doenças auto-imunes organoespecíficas que afetam os seres humanos(3). A tireoidite crônica auto-imune apresenta tendência para se manifestar após os 50 anos de idade(4,5). Acomete 5% a 15% das mulheres e 1% a 5% dos homens, de acordo com os critérios diagnósticos e a localização geográfica(6), podendo ser até nove vezes mais freqüente na mulher(7). Do ponto de vista clínico, a tireoidite crônica auto-imune apresenta-se principalmente sob duas formas: a forma atrófica (tireoidite atrófica) e a forma com bócio ou tireoidite de Hashimoto, descrita por este autor em 1912(8,9). Ambas são caracterizadas pela presença de tireoidite linfocítica, anticorpos antitireóide no sangue e vários graus de disfunção tireoidiana(6). A doença de Graves representa um dos espectros da doença auto-imune da glândula tireóide, que pode estar associada à presença de anticorpos antitireoidianos(6). A tireoidite silenciosa (indolor) e a pós-parto são, também, desordens auto-imunes que apresentam infiltrado linfocítico, geralmente autolimitadas, ambas supostamente atribuídas a manifestações de tireoidite crônica auto-imune(4). Outra forma de doença auto-imune da glândula tireóide, a tireoidite focal, pode simular neoplasias da tireóide(1,10). A tireoidite crônica auto-imune com bócio é caracterizada por infiltrado linfocítico difuso, com ocasionais centros germinativos, folículos tireoidianos contendo escasso colóide, fibrose, alterações oxifílicas, tais como as células de Hürthle ou Askanazy. Na tireoidite crônica auto-imune atrófica a glândula tireóide é pequena, com infiltrado linfocítico e fibrose substituindo o parênquima glandular(6). Em ambas as variantes, o infiltrado linfocítico é o achado patológico característico da presença de auto-imunidade na glândula tireóide(11).
DIAGNÓSTICO CLÍNICO-LABORATORIAL E CITOLÓGICO Os critérios diagnósticos da tireoidite crônica auto-imune baseiam-se no exame clínico e nos exames subsidiários(6). Os pacientes podem apresentar sintomas de hipotireoidismo e o exame físico pode revelar sinais de hipotireoidismo, mas tipicamente encontra-se apenas um bócio difuso, de consistência aumentada, cuja superfície é lobulada ou bocelada que, raramente, pode ser grande o suficiente para causar sintomas compressivos. Por definição, pacientes com a forma atrófica da tireoidite crônica auto-imune não têm bócio(6); ao contrário, apresentam-se com volume glandular reduzido ao diagnóstico. Esta forma pode apresentar-se sem que haja bócio preexistente ou pode resultar de evolução lenta e gradual da forma com bócio(12). O principal marcador laboratorial da tireoidite crônica auto-imune é a presença de anticorpos antitireóide no soro. Anticorpos antitireoglobulina (TgAb) mostram-se presentes em 60% dos pacientes, enquanto os anticorpos antimicrossomal estão presentes em aproximadamente 95% dos pacientes(6). As concentrações de anticorpos antimicrossomal são, na maioria das vezes, mais elevadas do que as de TgAb, e um teste positivo para anticorpos antiperoxidase tireoidiana (TPOAb) é um indicador discretamente mais sensível para a tireoidite crônica auto-imune do que um teste positivo para anticorpos antimicrossomal(6). A cintilografia de tireóide é desnecessária para a confirmação do diagnóstico de tireoidite crônica auto-imune(4,6). Na presença de suspeita clínica desta doença, um teste mostrando altas concentrações de anticorpos antitireóide e um teste para determinação dos níveis de TSH são suficientes para confirmar o diagnóstico(4,6). A biópsia aspirativa por agulha fina deve ser considerada naqueles pacientes em que, apesar de apresentarem manifestações clínicas de tireoidite crônica auto-imune e concentrações elevadas de anticorpos antitireóide, se suspeita de nódulo tireoidiano e, também, na presença de um bócio difuso de crescimento rápido, especialmente nos que recebem terapia com tiroxina, com o intuito de afastar o diagnóstico de linfoma da glândula(1,13).
DIAGNÓSTICO ULTRA-SONOGRÁFICO Embora na presença de manifestações clínicas de tireoidite crônica auto-imune um teste positivo para anticorpos antitireóide possa ser considerado suficiente para o seu diagnóstico(6), este método pode se mostrar negativo na fase inicial da doença, bem como em alguns pacientes com hipotireoidismo subclínico(6). Com o desenvolvimento de ensaios mais sensíveis para a detecção de TPOAb, concentrações relativamente baixas podem ser constatadas em indivíduos com outras doenças tireoidianas (bócio multinodular e neoplasias da tireóide)(6) e em indivíduos saudáveis (falso-positivos)(14). Além disso, embora a confirmação de anticorpos antitireóide indique a presença de linfócitos na glândula tireóide (auto-imunidade), esses testes não contribuem para a distinção entre os diversos tipos de doenças auto-imunes da glândula tireóide, tais como a tireoidite focal, a tireoidite difusa e a doença de Graves(1). Dessa forma, um método simples, rápido, não-invasivo, reprodutível e que apresenta alta sensibilidade e especificidade, como a ultra-sonografia (US), pode ser de extrema utilidade para o diagnóstico precoce da tireoidite crônica auto-imune. A US vem evoluindo de forma muito rápida nos últimos anos e está assumindo papel cada vez mais importante no diagnóstico das doenças da glândula tireóide. Vários parâmetros avaliados pela US contribuem para o diagnóstico da tireoidite crônica auto-imune, desde a avaliação ao modo B (volume glandular, textura e ecogenicidade do parênquima tireoidiano) até a realização do dúplex-Doppler colorido. Na prática clínica, o volume da tireóide e a textura do parênquima são descritos em praticamente todos os laudos ultra-sonográficos; embora altamente correlacionado com a presença de tireoidite crônica auto-imune, o relato de ecogenicidade freqüentemente está ausente. Dessa maneira, este artigo tem o objetivo de revisar a importância da avaliação da ecogenicidade ultra-sonográfica do parênquima tireoidiano para o diagnóstico da tireoidite crônica auto-imune, recomendando a descrição sistemática desta variável. A análise da ecogenicidade do parênquima tireoidiano é realizada de modo subjetivo ao compará-la à ecogenicidade dos músculos pré-tireoidianos e da glândula submandibular, classificando-a em isoecogênica, hiperecogênica e hipoecogênica em relação a tais estruturas. Tipicamente, a glândula tireóide normal apresenta ecogenicidade maior que a dos músculos pré-tireoidianos e semelhante ou discretamente maior que a das glândulas submandibulares. Considera-se o parênquima tireoidiano hipoecogênico quando seus níveis de ecos são menores do que nas glândulas submandibulares, ou aproximam-se àqueles dos músculos pré-tireoidianos(15,16). Correlação entre a ecogenicidade e a citopatologia na tireoidite crônica auto-imune As evidências de correlação entre os achados citopatológicos (infiltrado linfocítico) e a redução da ecogenicidade foram obtidas com auxílio da punção aspirativa por agulha fina. Esta técnica foi empregada para avaliar a área ocupada por infiltração linfocítica e fibrose de pacientes com tireoidite crônica auto-imune e observou-se forte correlação entre a presença difusa de acentuado infiltrado linfocítico e fibrose com a intensa redução da ecogenicidade tireoidiana(15). O grau de ecogenicidade foi, também, correlacionado com o diâmetro médio do lúmen folicular, ou seja, ecogenicidade normal foi observada em pacientes com diâmetro médio do lúmen folicular de 67 µm e hipoecogenicidade nos pacientes com diâmetro médio de 25 µm. Dessa forma, a ecogenicidade normal representou estrutura tecidual normofolicular ou macrofolicular, enquanto um padrão de hipoecogenicidade indicou estrutura microfolicular ou sólida, nos pacientes com tireoidite crônica auto-imune(16). A diminuição da ecogenicidade foi provocada, provavelmente, pela redução da interface celular-coloidal dominante da tireóide, que representa o fator essencial na reflexão do som. Assim, na estrutura normofolicular (glândula tireóide normal) ou macrofolicular (bócio colóide), uma grande quantidade de ondas ultra-sônicas interagem com a porção celular-coloidal e são refletidas para o transdutor, proporcionando aspecto ecogênico normal (Figura 1).
Na redução ou ausência de folículos há redução da interface acústica, provocando grande espalhamento e absorção das ondas ultra-sônicas e pouca reflexão sonora, originando o padrão hipoecogênico (Figura 2)(16). Desse modo, fica claro que a ecogenicidade do parênquima tireoidiano apresenta correlação inversa à presença de infiltrado linfocítico e à desagregação da estrutura folicular. Na doença de Graves a presença de hipoecogenicidade manifesta-se por um mecanismo diferente daquele encontrado na tireoidite crônica auto-imune, uma vez que é decorrente da hipervascularização e da hipercelularidade(17).
Ecogenicidade no diagnóstico da tireoidite crônica auto-imune: valor preditivo, sensibilidade, especificidade, acurácia e comparação com outros métodos Os valores preditivos da hipoecogenicidade para o diagnóstico das doenças auto-imunes da glândula tireóide (tireoidite crônica auto-imune e doença de Graves) foram estabelecidos com base em amostra de pacientes com hipoecogenicidade da tireóide. A punção aspirativa por agulha fina foi compatível com tireoidite crônica auto-imune em 352 pacientes e com doença de Graves em 47 pacientes. Os valores preditivos positivos e negativos de hipoecogenicidade como indicadores de doenças auto-imunes da glândula tireóide foram, respectivamente, 88,3% e 93%, demonstrando que a redução da ecogenicidade indica alta probabilidade de diagnóstico dessas doenças. Os valores preditivos positivos e negativos, isoladamente, para tireoidite crônica auto-imune foram, respectivamente, 59% e 93%, deixando claro que a ausência de hipoecogenicidade representa baixa probabilidade de diagnóstico dessa enfermidade(9). A avaliação de pacientes com diagnóstico de tireoidite crônica auto-imune por meio de punção aspirativa por agulha fina mostrou que 29,3% dos pacientes não apresentavam manifestações clínicas, 13% não tinham anticorpos antitireóide presentes e o hormônio estimulante da tireóide (TSH) estava normal em 41%. Enquanto a citologia foi isoladamente efetiva para o diagnóstico em 91,3% dos pacientes, a US mostrou sensibilidade de 94,6% para o diagnóstico da tireoidite crônica auto-imune (presença de hipoecogenicidade)(18). Quando o padrão isoecogênico é encontrado em uma população não-selecionada para doenças de tireóide, a especificidade deste parâmetro, isoladamente, para excluir tireoidite crônica auto-imune excede 95%(19). Em uma amostra selecionada em um ambulatório de doenças da tireóide, a ausência de hipoecogenicidade foi eficaz para afastar o diagnóstico de tireoidite crônica auto-imune em 84% dos pacientes(8). Dessa forma, a US apresenta alta especificidade para excluir esta doença. Já a presença de um padrão hipoecogênico não pode, isoladamente, diferenciar entre tireoidite crônica auto-imune e doença de Graves, principalmente em uma amostra selecionada de pacientes com doenças de tireóide, já que vários pacientes podem apresentar doença de Graves. Assim, a presença de hipoecogenicidade não é específica para o diagnóstico de tireoidite crônica auto-imune. Nesse caso, porém, a combinação dos achados clínico-laboratoriais com o estudo ultra-sonográfico permitirá a diferenciação, uma vez que esta combinação apresenta alta especificidade para o diagnóstico da tireoidite crônica auto-imune, mesmo em uma população selecionada(19). Além disso, o uso do dúplex-Doppler colorido pode, também, auxiliar na diferenciação entre tireoidite crônica auto-imune e doença de Graves(17). Aproximadamente 10% dos indivíduos de uma população geral apresentam algum grau de hipotireoidismo, cuja principal causa é a tireoidite crônica auto-imune(20). A presença de hipotireoidismo não-diagnosticado pode representar um grave problema, tanto em crianças, devido ao risco de retardo de crescimento(21), como em gestantes, pelo risco de abortamentos, complicações perinatais e retardo do desenvolvimento neurológico do feto(22). Por isso, o interesse em avaliar quais os métodos mais acurados para o diagnóstico. Com o objetivo de comparar a acurácia diagnóstica da hipoecogenicidade ultra-sonográfica com as concentrações elevadas de TPOAb no diagnóstico da tireoidite crônica auto-imune, Raber et al. avaliaram 451 pacientes com status tireoidiano desconhecido de ambulatório com alta freqüência de doenças tireoidianas. A ecogenicidade do parênquima foi classificada em três graus: grau 1 normal, ecogenicidade similar à glândula submandibular e hiperecóico em relação à musculatura pré-tireoidiana; grau 2 parênquima hipoecóico em relação à glândula submandibular e hiperecóico em relação à musculatura pré-tireoidiana; grau 3 iso ou hipoecóico em relação à musculatura pré-tireoidiana. Quando foi observado o grau 3, o valor preditivo positivo da doença foi de 95% e a sensibilidade foi de 56%. Já a sensibilidade, incluindo os graus 2 e 3 para o diagnóstico da doença, foi de 84%, enquanto a sensibilidade do TPOAb foi de 58%. A especificidade do grau 1 (normal) para excluir tireoidite crônica auto-imune foi de 96%. Esses autores observaram que 95% dos pacientes com o grau 3 na US apresentavam concentrações elevadas de TPOAb(23). Corroborando esses resultados, outra pesquisa, na qual a tireóide foi classificada de acordo com quatro tipos de padrões ultra-sonográficos distintos, revelou que os pacientes que exibiram o padrão mais alto (grau 4 glândula tireóide com volume aumentado e com difusa e marcada hipoecogenicidade do parênquima) apresentaram as maiores concentrações de anticorpos antitireóide, os menores níveis de T4 e os mais altos níveis de TSH(24). Nos pacientes com diagnóstico de tireoidite crônica auto-imune confirmado pelo estudo citopatológico, evidenciou-se que a presença de hipoecogenicidade do parênquima tireoidiano está associada a maior probabilidade de hipotireoidismo do que à presença de isoecogenicidade do parênquima(25). A hipoecogenicidade ultra-sonográfica é, também, mais eficaz do que os anticorpos antitireóide para predizer o desenvolvimento de hipotireoidismo durante o seguimento dos pacientes(26). É importante salientar que, em 90% dos casos, a hipoecogenicidade é decorrente de doenças auto-imunes, especialmente as tireoidites ou a doença de Graves. Todavia, uma forma de apresentação característica de hipoecogenicidade acentuada associada à presença de traves hiperecogênicas (fibróticas) atravessando o parênquima não deixa dúvida quanto ao diagnóstico de tireoidite crônica auto-imune(27). A forma atrófica da tireoidite crônica auto-imune também pode mostrar padrão ultra-sonográfico de hipoecogenicidade difusa ao exame de ultra-som. Esta condição apresenta uma típica redução de volume e da ecogenicidade glandular em 94,5% dos pacientes(28). Na tireoidite pós-parto, a hipoecogenicidade revelou-se máxima no período pós-parto, com normalização gradual durante o período de seguimento. Hipoecogenicidade persistente indicou processo contínuo de tireoidite destrutiva(29). A tireoidite focal pode representar uma forma mais branda ou precoce de tireoidite crônica auto-imune e apresenta-se, à US, habitualmente com aspecto nodular focal hipoecóico (Figura 3)(7). Entretanto, também pode se apresentar com aspecto nodular hiperecóico, isoecóico e, mesmo, com ecogenicidade mista. Calcificações e degenerações císticas podem estar presentes no nódulo. Neste caso, a biópsia aspirativa por agulha fina é necessária para comprovar a doença e descartar neoplasia(10).
Vários estudos reportaram um padrão caracterizado por redução difusa da ecogenicidade em pacientes com tireoidite crônica auto-imune. Este parâmetro é importante tanto no diagnóstico da doença(8,9,15, 16,18,19,24,25,30) como para predizer disfunção tireoidiana ao longo do acompanhamento dos pacientes(25,26). Convém, dessa forma, salientar que o aspecto ultra-sonográfico clássico da tireóide em pacientes com tireoidite crônica auto-imune exibe, além da textura heterogênea(25,30) ou de padrão finamente micronodular(31), a presença da hipoecogenicidade (Figuras 2, 4, 5 e 6).
O volume tireoidiano mostra-se aumentado na maioria dos pacientes (Figura 7) e reduzido nos pacientes com tireoidite atrófica (Figura 8), mas pode apresentar-se normal em parte dos pacientes. A presença de linfonodos de aspecto habitual na cadeia cervical VI corrobora ainda mais o diagnóstico de tireoidite crônica auto-imune(32).
Diagnóstico ultra-sonográfico por meio do histograma computadorizado Nos estudos já citados, a avaliação e a classificação da ecogenicidade da tireóide foram realizadas por examinadores experientes, comparando-a à ecogenicidade da musculatura pré-tireoidiana ou das glândulas submandibulares; entretanto, a interpretação e a quantificação são realizadas de maneira subjetiva. Apesar de a padronização dos procedimentos de utilização do equipamento de ultra-som e da classificação ter sido proposta por alguns autores, o método ainda é dependente do operador. Na busca de uma avaliação mais objetiva e quantitativa, foram desenvolvidos programas de computador que atribuem escalas numéricas aos vários tons de cinza do histograma da glândula tireóide (Graw-Wert-Einheiten GWE). Quanto maior a resolução das imagens, maior o número de tonalidades de cinza identificado. A cor preta corresponde ao valor 0 e a cor branca corresponde ao maior valor, que depende da resolução da imagem. Tal técnica permite eliminar a subjetividade do método ao quantificar numericamente a ecogenicidade, tornando-a uma variável objetiva, quantitativa, altamente sensível e reprodutível e, portanto, capaz de proporcionar análises estatísticas mais precisas. Este método foi empregado por vários autores, tanto na avaliação de doenças da tireóide quanto de outras estruturas. O histograma computadorizado foi utilizado na avaliação do corte transversal dos lobos tireoidianos (ganho de brilho constante) e mostrou redução significativa da ecogenicidade nos pacientes com tireoidite crônica auto-imune (GWE = 19,6) em comparação à do grupo controle (GWE = 25,6). Além disso, o alto grau de hipoecogenicidade foi correlacionado à ocorrência de altos níveis de TSH (incluindo hipotireoidismo subclínico) e TPOAb, contudo, sem correlação com os níveis de TgAb(33). Na experiência dos autores desta revisão, o histograma computadorizado pode, também, ser realizado utilizando-se o corte longitudinal do parênquima tireoidiano na comparação com a musculatura adjacente (Figura 9).
Considerando que a ecogenicidade da tireóide ao histograma computadorizado varia de acordo com o equipamento utilizado e, também, com o ajuste do ganho de brilho, foi proposto utilizar a comparação entre os valores obtidos no histograma da tireóide e dos músculos pré-tireoidianos em cortes transversais, com o objetivo de eliminar tais problemas. Este método torna o exame reprodutível mesmo com a utilização de diferentes aparelhos e, inclusive, permite que o examinador ajuste o ganho de brilho para melhor visualização do parênquima, desde que se utilize o mesmo ganho para a avaliação da musculatura. A tireóide foi considerada hipoecogênica quando os valores médios ± dois desvios-padrão do parênquima apresentaram sobreposição com aqueles da musculatura pré-tireoidiana. Todos os pacientes com tireoidite crônica auto-imune (100%) apresentaram valores de GWE do parênquima tireoidiano sobrepostos aos dos músculos pré-tireoidianos e todos os pacientes com hipotireoidismo apresentaram hipoecogenicidade envolvendo mais do que 68% da glândula(34). Além disso, em pacientes com tireoidite crônica auto-imune, o histograma revelou que pacientes com hipotireoidismo apresentaram significativa redução da ecogenicidade, quando comparados aos pacientes com eutireoidismo(35). Tais resultados obtidos com o histograma computadorizado corroboram a utilidade da hipoecogenicidade do parênquima tireoidiano no diagnóstico de tireoidite crônica auto-imune e também para predizer o hipotireoidismo. Os estudos acima avaliaram a ecogenicidade, selecionando regiões de interesse (ROI) em cortes transversais dos lobos direito e esquerdo. Inicialmente, era necessário armazenar as imagens em arquivos tipo JPEG e transportá-las ao microcomputador para efetuar a análise, o que limitava a utilização do método em decorrência do trabalho e do tempo necessários. Atualmente, alguns aparelhos de ultra-som disponibilizam o programa, realizando a análise em tempo real, o que adiciona praticidade ao procedimento (Figuras 10, 11 e 12).
O rápido desenvolvimento de novos programas para a avaliação da ecogenicidade resultou em novos aprimoramentos. Um deles permite a avaliação da ecogenicidade em uma ROI de três dimensões(36); o outro possibilita delinear os contornos de uma estrutura durante o exame, estimando o volume e a média volumétrica da ecogenicidade de todo o tecido e não apenas de um corte transversal ou longitudinal da área selecionada(37). Esta evolução permitirá que a região selecionada pelo examinador seja representativa da média real da ecogenicidade de toda a estrutura, proporcionando coeficientes de concordância elevadíssimos, tanto intra-observadores como interobservadores, tornando esse parâmetro ainda mais sensível e reprodutível.
CONCLUSÃO Demonstrado o valor do estudo da ecogenicidade no diagnóstico da tireoidite crônica auto-imune, recomenda-se a descrição sistemática no relatório ultra-sonográfico da glândula tireóide, além do volume e da textura, também a ecogenicidade do parênquima, ainda que de forma subjetiva.
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Endereço para correspondência: Recebido para publicação em 14/4/2008. Aceito, após revisão, em 5/6/2008.
* Trabalho realizado no Instituto de Radiologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (InRad/HC-FMUSP), São Paulo, SP, Brasil. |