RELATO DE CASO
|
|
|
|
Autho(rs): Simone Elias, Marina Celli Francisco, Cláudio Kemp, Beatriz Daou Verenhitach, Fabiano Celli Francisco, Maria del Carmen M. Wolgien |
|
Descritores: Mastopatia diabética, Diabetes mellitus, Doença benigna da mama |
|
Resumo: VMestre, Médico Radiologista do Hospital de Caridade São Braz de Porto União, Porto União, SC, Brasil
INTRODUÇÃO A mama não é classicamente incluída entre os órgãos lesados pelas complicações diabéticas. Todavia, em raros casos (menos de 1% das doenças benignas) pode ocorrer uma manifestação patológica, chamada de mastopatia diabética(1), que acomete até 13% das pacientes com diabetes mellitus tipo 1 em algum período durante o curso de sua doença. Foi primeiramente descrita por Soler e Khardori, em 1984, como uma enfermidade benigna que simulava, clinicamente, carcinoma mamário(2). Sua patogênese não é totalmente conhecida, mas acredita-se que seja decorrente de uma reação auto-imune induzida pela hiperglicemia, que resultaria em produção aumentada de colágeno(1), com conseqüente infiltrado linfocítico com linfócitos tipo B contra os produtos finais da glicosilação da matriz extracelular anormal(3).
RELATO DO CASO Paciente com 35 anos de idade no momento da queixa, de área endurecida na intersecção dos quadrantes laterais da mama direita, próxima à região retroareolar, percebida em auto-exame das mamas. Portadora de diabetes mellitus, insulino-dependente, desde os 16 anos. Referia controle inadequado da glicemia por erro alimentar e falta de atividades físicas regulares. No exame clínico apresentava espessamento na topografia já referida, medindo aproximadamente 4,0 cm. A mamografia apresentava padrão parcialmente lipos-substituído e não mostrava lesões, mesmo na área palpável (Figura 1). A avaliação por ultra-sonografia mostrava imagem nodular, fortemente hipoecóica, com acentuada sombra acústica posterior, medindo cerca de 2,0 cm no maior diâmetro (Figura 2).
Na ocasião, a paciente foi inicialmente submetida a punção aspirativa com agulha fina, cujo resultado foi inconclusivo (esfregaço apresentando raras células epiteliais, isoladas e sem atipias). Em razão do resultado insatisfatório, realizou-se biópsia de fragmento com agulha grossa (tipo core biopsy) auxiliada por ultra-sonografia. O laudo anatomopatológico concluiu por fibrose mamária com infiltrado perivascular, com características de mastite linfocítica (Figura 3).
DISCUSSÃO O primeiro relato de mastopatia diabética foi feito por Soler e Khardori(2), com 12 pacientes que apresentavam doença fibrosa da mama, tireoidite e artropatia das mãos associadas com diabetes mellitus tipo 1. A entidade possui freqüência estimada em 1:1.694 mulheres diabéticas(1). Sua presença também já foi descrita em homens(4). Uma revisão de 120 casos de mastopatia diabética mostrou que o diabetes mellitus do tipo 1 de longa data (aproximadamente 20 anos) estava presente em 115 dessas pacientes, com presença de lesões mamárias quase sempre múltiplas e com tamanho variando de 5 mm a 6 cm(5). A idade das pacientes variava entre 25 e 40 anos e a mais idosa tinha 64 anos. O quadro clínico é de nódulo mamário endurecido, com margens irregulares, móvel e indolor, sem espessamento ou retração da pele. Pode ser unilateral, bilateral, múltiplo ou não-palpável(1). Sessenta e três por cento das lesões são bilaterais e múltiplas. A recidiva é freqüente, ocorrendo em cerca de 80% dos casos, e conhecendo-se esta característica evitam-se biópsias desnecessárias(6). A mamografia pode revelar área de aumento da densidade (assimetria focal). Venta et al.(7) descreveram a presença de nódulo na mamografia, que pode ser lobulado em 52% dos casos, ovalado em 50% e redondo em 18%. Já a ultra-sonografia pode demonstrar nódulo hipoecóico, irregular, com acentuada sombra acústica posterior, em que o principal diagnóstico diferencial se faz com carcinoma mamário(1). Existem poucas publicações sobre a utilização da ressonância magnética nesses pacientes. Mais recentemente, foi proposta a utilização do recurso da espectroscopia para confirmar a benignidade das lesões, mostrando a presença ou ausência do pico de colina, com sensibilidade e especificidade variando entre 82% e 100%(8). O diagnóstico histológico é indispensável quando existe suspeita clínica e radiológica de mastopatia diabética. Alguns autores propuseram a obtenção do diagnóstico por punção aspirativa, todavia, o método só tem sucesso em menos da metade dos casos, pelo fato de as lesões serem duras e pouco celulares. Para se estabelecer o diagnóstico definitivo, considera-se mais adequado biópsias histológicas, preferencialmente a biópsia por fragmento(1).
CONCLUSÃO O conhecimento das manifestações clínicas e imaginológicas da mastopatia diabética permite o diagnóstico adequado desta doença, cujo principal diagnóstico diferencial é o carcinoma mamário.
REFERÊNCIAS 1. Mottola Jr J, Mazzoccato FMLC, Berretini Jr A, et al. Mastopatia diabética: causa incomum de doença inflamatória da mama. RBGO. 2002;24: 5359. [ ] 2. Soler NG, Khardori R. Fibrous disease of the breast, thyroiditis, and cheiroarthropathy in type I diabetes mellitus. Lancet. 1984;1:1935. [ ] 3. Kudva YC, Reynolds C, O'Brien T, et al. "Diabetic mastopathy", or sclerosing lymphocytic lobulitis, is strongly associated with type 1 diabetes. Diabetes Care. 2002;25:1216. [ ] 4. Weinstein SP, Conant EF, Orel SG, et al. Diabetic mastopathy in men: imaging findings in two patients. Radiology. 2001;219:7979. [ ] 5. Boullu S, Andrac L, Piana L, et al. Diabetic mastopathy, complication of type 1 diabetes mellitus: report of two cases and a review of the literature. Diabetes Metab. 1998;24:44854. [ ] 6. Costantini M, Belli P, Magistrelli A, et al. MRI in insulin-dependent diabetic mastopathy. A case report. Rays. 2002;27:30712. [ ] 7. Venta LA, Wiley EL, Gabriel H, et al. Imaging features of focal breast fibrosis: mammographic-pathologic correlation of noncalcified breast lesions. AJR Am J Roentgenol. 1999;173:30916. [ ] 8. Balan P, Turnbull LW. Dynamic contrast enhanced magnetic resonance imaging and magnetic resonance spectroscopy in diabetic mastopathy. Breast. 2005;14:6870. [ ]
Endereço para correspondência: Recebido para publicação em 14/9/2006. Aceito, após revisão, em 9/1/2007.
* Trabalho realizado na Disciplina de Mastologia do Departamento de Ginecologia da Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina (Unifesp/EPM), São Paulo, SP, Brasil. |