ARTIGO ORIGINAL
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Autho(rs): Inês Minniti Rodrigues Pereira, Antônio de Azevedo Barros Filho, Beatriz Regina Alvares, Evanisi Teresa Palomari, Lívio Nanni |
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Descritores: Diâmetros cranianos, Tamanho craniano, Índice craniano, Infância, Radiografia |
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Resumo: IVLivre-Docente, Professor do Departamento de Radiologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM-Unicamp), Campinas, SP, Brasil
INTRODUÇÃO A determinação radiológica dos diâmetros cranianos na infância tem importância na prática radiológica para a clínica pediátrica e neuropediátrica na avaliação do crescimento do crânio. Por intermédio destes diâmetros, pode-se estabelecer alterações no seu crescimento e desenvolvimento, principalmente nos primeiros anos de vida. Estudos de MacKinnon et al.(1), Taveras e Wood(2), Gordon(3), Cronqvist(4), Austin e Gooding(5), Gooding(6) e Haas(7) descreveram índices de avaliação radiográfica do tamanho craniano e cefálico utilizando as medidas dos diâmetros cranianos e correlacionando com a faixa etária e o sexo, sendo o de maior importância o índice de Haas, no qual este estudo se baseou. Porém, esses estudos foram realizados em uma população infantil não-brasileira, com pouca miscigenação, de países com melhor desenvolvimento socioeconômico e sem avaliação estatística adequada. Alguns desses trabalhos não apresentavam dados sobre a casuística, o processo amostral e o estudo das medidas de variabilidade. Desnutrição, doenças genéticas, distúrbios endócrinos e doenças encefálicas são responsáveis por uma série de modificações sistêmicas, algumas das quais provocam retardo, e outras, aumento excessivo no crescimento do crânio. Faz-se então necessária a avaliação radiológica do tamanho craniano a partir dos seus diâmetros(2,8,9). O volume do crânio aumenta cerca de quatro vezes entre o nascimento e a vida adulta, enquanto o aumento do volume da região facial é em torno de 12 vezes (6,10). Além disso, 80% do crescimento pós-natal do crânio ocorrem nos três primeiros anos de vida (1114). Quando a medida do índice craniano está próxima do limite da normalidade, mesmo na vigência de alterações neurológicas clínicas, a simples inspeção radiológica pode não detectar anormalidades do parênquima encefálico, principalmente quando houve o fechamento das suturas e fontanelas. Por isso, devem ser utilizados outros métodos diagnósticos para a avaliação do encéfalo, por exemplo, a tomografia computadorizada. O crânio infantil, de acordo com Moss e Young(15), Dorst(16) e Momose(17), é uma estrutura dinâmica, em função de dois fatores que provocam as mudanças no seu crescimento: o conteúdo no interior do crânio e as suturas que sofrem progressivas acomodações. Quando existe aumento encefálico ou soldaduras precoces das suturas, ocorrem alterações do tamanho craniano, com conseqüências para o parênquima encefálico. Os exames radiográficos podem ser de grande auxílio no estudo do desenvolvimento do crânio, mas devem ser evitados por serem uma técnica de radiação ionizante; por isso, não se pode fazer um estudo radiográfico longitudinal do crescimento normal do crânio. O propósito deste estudo foi a realização das medidas dos diâmetros cranianos obtidos por método radiológico e a elaboração do índice craniano e do tamanho craniano em uma população infantil brasileira, em casos que apresentaram indicação de investigação radiológica por traumatismo craniano, sem sinais de fraturas.
MATERIAIS E MÉTODOS Foram selecionadas 1.464 radiografias de 732 pacientes de ambos os sexos (428 do sexo masculino e 304 do sexo feminino), desde neonatos até 18 anos de idade completos, com indicação prévia de radiografia de crânio por traumatismo. Todos os pacientes responderam a um questionário de inclusão sobre a avaliação do desenvolvimento neuropsicomotor e de doenças pregressas, sendo assim estabelecidos critérios de inclusão. Todos os pacientes que fizeram parte deste estudo não apresentavam nenhuma doença física ou craniana. O método empregado foi o convencional, nas incidências póstero-anterior ou ântero-posterior e perfil, a um metro de distância ampola-filme, fazendo-se a medida dos diâmetros cranianos. O diâmetro fronto-occipital (FO) é a medida de maior diâmetro da região frontal até a região occipital, e a altura craniana (A) é a maior medida realizada perpendicularmente à linha de base craniana, ou seja, a linha paralela ao assoalho do seio esfenoidal até a margem posterior do forame magno, para medidas de tábua interna a tábua interna (Figura 1A). O diâmetro biparietal (BP) é a medida de maior diâmetro entre os dois parietais, de tábua interna a tábua interna (Figura 1B).
As mensurações dos diâmetros cranianos foram analisadas por três médicos radiologistas. Estatisticamente, por método comparativo, foi realizado estudo para amostras emparelhadas das médias dos diâmetros cranianos. Constatou-se não haver variação significativa em relação ao método utilizado, sendo p > 0,05 (Tabela 1).
Após a coleta das medidas radiográficas dos diâmetros cranianos dos 732 pacientes, elaboraram-se tabelas com os valores das médias e o desvio-padrão das variáveis estudadas os diâmetros fronto-occipital e biparietal e a altura craniana , segundo a faixa etária e o sexo. As comparações das variáveis em cada faixa etária, segundo o sexo, foram feitas utilizando-se o teste t de Student para amostras independentes, tanto de tábua externa a tábua externa como de tábua interna a tábua interna. Após a análise dos dados obtidos, deu-se preferência às medidas de tábua interna porque demonstram maior proximidade do crescimento do crânio com o do encéfalo. O índice craniano e o tamanho craniano foram calculados pelas variáveis já estudadas, baseadas nas equações proposta por Haas, com as quais se equacionou o índice craniano por meio da divisão da largura pelo seu comprimento transformado em percentuais, e o tamanho craniano pela média dos três diâmetros: Índice craniano = (BP / FO) × 100 Tamanho craniano = (FO + BP + A) / 3
RESULTADOS O estudo comparativo das médias dos diâmetros, em ambos os sexos e segundo a idade, realizado por medidas internas é demonstrado nas Tabelas 2, 3 e 4, nas quais se observam aumento do crescimento francamente progressivo no primeiro ano de vida para ambos os sexos e aumento menor a partir do segundo ano de vida. Observa-se que o sexo feminino apresenta valores de crescimento do diâmetro fronto-occipital menor em relação ao sexo masculino, mas os valores médios do crescimento, tanto no primeiro ano de vida como nos anos subseqüentes, são proporcionais para ambos os sexos, sem valores estatisticamente significantes.
Nota-se que as médias globais dos diâmetros não apresentam diferença significativa entre o sexo feminino e o sexo masculino, quando comparadas por médias emparelhadas pelo teste t de Student. Após a elaboração dos diâmetros cranianos, formularam-se o índice craniano e o tamanho craniano apresentados, respectivamente, nas Tabelas 5 e 6 , fundamentados na equação do módulo craniano e no índice cefálico, propostos por Haas(7), através de medidas de tábua interna a tábua interna.
Nos valores obtidos neste estudo verifica-se existir um decréscimo acentuado no valor médio do índice craniano no primeiro ano de vida e um decréscimo mais moderado nas idades de quatro a cinco anos, e a partir daí se estabiliza, como mostrado na Tabela 5 comparativamente com a Tabela 7 do estudo de Haas(7). Tal fato se explica porque, a partir de um ano de idade o índice craniano independe da idade. Um dos fatores que contribuem para isso é que o crescimento do diâmetro fronto-occipital apresenta velocidade de crescimento maior que os demais diâmetros, como mostrado na Tabela 2. Já o tamanho craniano ou módulo craniano de Haas(7) é a média da soma dos três diâmetros, mensurados de tábua interna a tábua interna, e se comporta da mesma maneira que o crescimento dos diâmetros. No primeiro ano de vida, os valores das médias apresentam aumento maior e, posteriormente, aumento menor até os quatro anos de idade, estabilizando-se a partir desta idade até os 18 anos, como apresentado na Tabela 6 comparativamente com a Tabela 8.
DISCUSSÃO Entre os trabalhos considerados para comparação de resultados com o presente estudo, o realizado por Haas(7), avaliando o índice cefálico e o módulo craniano, foi o que apresentou resultados mais satisfatórios na análise comparativa dos dados amostrais. Por meio das medidas dos diâmetros cranianos realizados neste estudo, foi possível constatar que alguns índices cranianos são bons indicadores do crescimento, podendo ser utilizados para o acompanhamento do desenvolvimento do crânio. A tomografia computadorizada é sem dúvida um excelente método para avaliação encefálica, mas não é eficaz para fazer seguimento do crescimento craniano porque é impossível estabelecer sempre os mesmos pontos de referência para medidas dos diâmetros cranianos(9,12). Em relação ao histórico do crescimento craniano, Haas(7) desenvolveu seu trabalho com 1.427 pacientes europeus, desde recém-nascidos até 21 anos de idade, sendo sua amostra um pouco maior que a de outros trabalhos citados, porém sem miscigenação. Haas utilizou distância ampola-filme de 97,0 cm, sendo que a distância recomendada é de 100 cm. Ele não relata o posicionamento do crânio para a realização das incidências e faz referência à angulação do raio central em relação ao crânio estudado. Além disso, sua amostra para o primeiro ano de vida, período em que a velocidade de crescimento do crânio é mais acelerada, é composta de 23 pacientes, ao passo que os valores dos diâmetros cranianos estabelecidos no presente estudo são de uma amostra de 62 pacientes no primeiro ano de vida, justificando um tamanho amostral maior, que indica medidas e avaliações estatísticas mais fidedignas. O crânio apresenta crescimento muito acelerado no primeiro ano de vida, demonstrado pelo crescimento dos seus diâmetros cranianos nas tabelas deste estudo. As mudanças dos diâmetros cranianos são mais lentas após os três primeiros anos de vida e estão associadas a um aumento de 25% do peso do encéfalo, segundo o estudo de MacKinnon et al.(1). A comparação da avaliação do índice craniano do presente estudo com o trabalho de Haas(7) demonstrou, praticamente, o mesmo resultado, com variações de valores estatisticamente insignificantes. Todavia, o nosso estudo apresentou casuística maior, melhor miscigenação e análise estatística melhor. Estes índices não servem para avaliar se houve comprometimento encefálico e sim para acompanhar o crescimento craniano.
CONCLUSÃO O índice craniano avaliado no presente estudo é um bom indicador do crescimento craniano, principalmente nos quatro primeiros anos de vida, quando o crescimento craniano apresenta velocidade maior. Após esta idade, por apresentar velocidade de crescimento menor e estável e valor estatístico diminuído, a utilização do tamanho craniano ou das tabelas dos diâmetros cranianos é mais bem usada para o acompanhamento do desenvolvimento craniano para ambos os sexos.
REFERÊNCIAS 1. MacKinnon IL, Kennedy JA, Davis TV. The estimation of the skull capacity from roentgenologic measurements. Am J Roentgenol Radium Ther Nucl Med. 1956;76:30310. [ ] 2. Taveras JM, Wood EH. Cráneo. In: Taveras JM, Wood EH, editores. Diagnóstico neuroradiológico. Buenos Aires: Editora Panamericana; 1968. p. 1467. [ ] 3. Gordon IRS. Measurement of cranial capacity in children. Br J Radiol. 1966;39:37781. [ ] 4. Cronqvist S. Roentgenologic evaluation of cranial size in children. Acta Radiol Diagn (Stockh). 1968;7:97111. [ ] 5. Austin JH, Gooding CA. Roentgenographic measurement of skull size in children. Radiology. 1971;99:6416. [ ] 6. Gooding CA. Skull vault: size and shape. In: Newton TH, Potts DG, editors. Radiology of the skull and brain. St. Louis: CV Mosby; 1971. p. 6193. [ ] 7. Haas LL. Roentgenological skull measurements and their diagnostic applications. Am J Roentgenol Radium Ther Nucl Med. 1952;67:197209. [ ] 8. Meredith HV. Growth in head width during the first twelve years of life. Pediatrics. 1953;12:41129. [ ] 9. Swischuk LE. Radiologia do recém-nascido do lactente e da criança pequena. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2006. [ ] 10. Moss ML, Greenberg SN. Postnatal growth of the human skull base. Angle Orthodontist. 1955;25: 7784. [ ] 11. Shapiro R, Janzen AH. The normal skull. A roentgen study. New York: Paul B. Hoeber; 1960. [ ] 12. Sullivan PG. A method for the study of jaw growth using a computer-based three-dimensional recording technique. J Anat. 1972;112(Pt 3):45770. [ ] 13. Watson EH, Lowrey GH. Growth and development of children. Chicago; Year Book Medical Publisher; 1967. [ ] 14. Tanner JM. Some notes on the reporting of growth data. Hum Biol. 1951;23:93159. [ ] 15. Moss ML. Vertical growth of the human face. Am J Orthodontics. 1964;50:35976. [ ] 16. Dorst JP. Functional craniology: an aid in interpreting roentgenograms of the skull. Radiol Clin North Am. 1964;2:34766. [ ] 17. Momose KJ. Developmental approach in the analysis of roentgenograms of the pediatric skull. Radiol Clin North Am. 1971;9:99116. [ ]
Endereço para correspondência: Recebido para publicação em 4/10/2007. Aceito, após revisão, em 4/12/2007.
* Trabalho realizado no Departamento de Radiologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM-Unicamp), Campinas, SP, Brasil. |