Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 41 nº 4 - Jul. / Ago.  of 2008

ARTIGO ORIGINAL
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Page(s) 225 to 228



Achados da tomografia computadorizada em metástases pancreáticas do carcinoma de células renais

Autho(rs): Adilson Prando

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Texto em Português English Text

Descritores: Metástases pancreáticas, Carcinoma de células renais, Tomografia computadorizada

Keywords: Pancreatic metastases, Renal cell carcinoma, Computed tomography

Resumo:
OBJETIVO: Apresentar os achados da tomografia computadorizada observados em quatro pacientes submetidos a nefrectomia radical por carcinoma de células renais e que apresentaram metástases pancreáticas. MATERIAIS E MÉTODOS: Os quatro pacientes foram submetidos a nefrectomia radical por carcinoma de células renais, estádios T1 (n=2) e T3a (n=2). O intervalo médio entre a nefrectomia e a detecção das metástases foi de oito anos. Dois pacientes apresentaram metástase pancreática solitária (confinada ao pâncreas) e dois apresentaram metástases pancreáticas única e múltiplas, respectivamente, ambos com recorrência tumoral no rim contralateral. RESULTADOS: As metástases pancreáticas foram visualizadas, na tomografia computadorizada, como lesões hipervascularizadas, solitária (n=2), única (n=1) ou múltiplas (n=1). Foi realizada pancreatectomia parcial em dois pacientes com metástase solitária. Estes pacientes estão livres da doença quatro e dois anos após a cirurgia, respectivamente. CONCLUSÃO: Metástases pancreáticas de carcinoma de células renais são raras, podendo ocorrer muitos anos após a apresentação inicial. Metástases pancreáticas múltiplas e metástases pancreáticas associadas a recorrência tumoral no rim contralateral são incomuns. À tomografia computadorizada, as metástases pancreáticas aparecem como lesões hipervascularizadas e solitárias, simulando tumores das ilhotas celulares. O tratamento cirúrgico das lesões solitárias deve ser considerado.

Abstract:
OBJECTIVE: To present computed tomography findings observed in four patients submitted to radical nephrectomy for renal cell carcinoma who developed pancreatic metastases afterwards. MATERIALS AND METHODS: The four patients underwent radical nephrectomy for stage T1 (n=2) and stage T3a (n=2) renal cell carcinoma. The mean interval between nephrectomy and detection of pancreatic metastases was eight years. Two asymptomatic patients presented with solitary pancreatic metastases (confined to the pancreas). Two symptomatic patients presented with single and multiple pancreatic metastases, both with tumor recurrence in the contralateral kidney. RESULTS: Computed tomography studies demonstrated pancreatic metastases as solitary (n=2), single (n=1) or multiple (n=1) hypervascular lesions. Partial pancreatectomy was performed in two patients with solitary pancreatic metastases and both are free of disease at four and two years after surgery. CONCLUSION: Pancreatic metastases from renal cell carcinoma are rare and can occur many years after the primary tumor presentation. Multiple pancreatic metastases and pancreatic metastases associated with tumor recurrence in the contralateral kidney are uncommon. Usually, on computed tomography images pancreatic metastases are visualized as solitary hypervascular lesions, simulating islet-cell tumors. Surgical management should be considered for patients with solitary pancreatic lesions.

 

 

INTRODUÇÃO

Carcinoma de células renais (CCR) é o câncer renal mais comum e representa 2% de todas as lesões malignas do adulto(1).

Apresenta significativas morbidade e mortalidade, tendo sido estimados, nos Estados Unidos em 2003, cerca de 35.000 novos casos e 12.480 óbitos(2). Até o presente momento, a ressecção cirúrgica completa deste tumor continua sendo o único tratamento curativo. No entanto, a recorrência ocorre em cerca de 20% a 30% dos pacientes com tumores localizados. A maioria das recorrências ocorre dentro de três anos após a cirurgia, com tempo médio para recorrer que varia de um a três anos(3). Ocasionalmente, pode ocorrer recorrência tumoral tardia, recorrência esta que acontece muitos anos após o tratamento inicial. Os sítios mais comuns de recorrência são pulmões, osso, loja renal, cérebro, fígado e rim contralateral(4). Os órgãos menos freqüentemente acometidos são glândulas adrenais, vesícula biliar, tireóide, pâncreas, músculo, pele ou tecido subcutâneo.

O objetivo deste trabalho é apresentar os achados, na tomografia computadorizada (TC), observados em quatro pacientes com metástases pancreáticas após nefrectomia radical.

Dois desses pacientes apresentavam apenas metástase pancreática solitária (confinada apenas ao pâncreas), o terceiro apresentava metástase pancreática única associada a recorrência tumoral no rim contralateral, e o quarto paciente apresentava metástases pancreáticas múltiplas, tumor recorrente no rim contralateral e metástases pulmonares e subcutâneas.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Foram realizados revisão dos prontuários médicos e estudos de TC de quatro pacientes (três mulheres e um homem) com metástases de CCR para o pâncreas. A idade dos pacientes variou de 38 a 63 anos.

Na época do diagnóstico, os tumores primários eram todos carcinoma de células claras convencionais e estádio T1 (dois pacientes) e estádio T3a (dois pacientes). O intervalo médio entre a nefrectomia e a detecção das metástases pancreáticas foi de oito anos.

Todos os pacientes foram avaliados por TC helicoidal single slice. Após a localização do pâncreas (cortes sem contraste, colimação de 10 mm e intervalo de 10 mm), foram obtidas duas fases após administração intravenosa de contraste na área pancreática (aos 25 segundos e aos 70 segundos). Cada série foi obtida em uma única apnéia, utilizando-se colimação de 3 mm, pitch 2:1, 120 kVp e 240–280 mA. Uma terceira fase foi obtida aos 120 segundos (7 mm de colimação e pitch 1:1), incluindo todo o abdome superior. Foram injetados 150 ml de contraste não-iônico contendo 300 mg de iodo/dl, à velocidade de 3 ml/s. As imagens foram então reconstruídas para 2,5 mm, para obtenção das reformatações multiplanares.

Metástase pancreática solitária, ou seja, com lesão apenas no pâncreas, foi observada em dois pacientes, ambos assintomáticos. O terceiro paciente apresentou metástase pancreática única associada a recorrência tumoral no rim contralateral, e o quarto paciente apresentou múltiplas metástases pancreáticas associadas a metástases pulmonares e subcutâneas e recorrência tumoral no rim contralateral. Estes dois últimos pacientes eram sintomáticos (perda de peso, dores abdominais ou hematúria).

 

RESULTADOS

Quatro pacientes (três mulheres e um homem) com idade média de 50 anos apresentaram-se com metástases pancreáticas de CCR, sendo estas metástases solitária (n = 2), única (n = 1) ou múltiplas (n = 1). Na época da nefrectomia radical todos os pacientes apresentavam CCR (convencional de células claras) estádio T1 (n = 2) e estádio T3a (n = 2). O intervalo médio entre a nefrectomia e a detecção das metástases pancreáticas foi de oito anos. Todas as lesões eram hipervascularizadas ao estudo por TC com contraste intravenoso, simulando, quando única, tumor das ilhotas celulares pancreáticas.

O tamanho médio das lesões foi de 1,8 cm (variando de 0,8 cm a 2,8 cm). Em dois pacientes com metástase solitária a lesão era localizada na cauda do pâncreas (Figuras 1 e 2). Estes dois pacientes foram tratados mediante pancreatectomia parcial, estando ambos livres da doença quatro e dois anos após a cirurgia, respectivamente. Um paciente apresentou metástase pancreática única no corpo do pâncreas (Figura 3) e recorrência tumoral no rim contralateral. O acompanhamento deste paciente foi descontinuado. O quarto paciente apresentou múltiplas pequenas metástases hipervascularizadas no pâncreas, tumor recorrente no rim contralateral e metástases pulmonares e subcutâneas (Figura 4). Este paciente está sendo tratado com imunoterapia, e 27 meses após o diagnóstico mostra doença metastática estabilizada.

 

 

 

 

 

 

 

 

DISCUSSÃO

Vinte e três por cento dos pacientes com CCR apresentam-se com metástases na época da detecção da doença. Vinte e cinco por cento deles desenvolvem metástases dentro de um prazo de cinco anos após nefrectomia(5). O maior diâmetro, o estágio do tumor e o seu grau nuclear são importantes fatores para a determinação da probabilidade do paciente desenvolver recorrência tumoral(4).

Metástases pancreáticas originárias de qualquer tumor são excepcionalmente raras. Comprometimento pancreático por metástases de CCR representa apenas 0,25% a 3% dos casos(6). O modo de propagação do CCR para o pâncreas pode se dar por via hematogênica ou por via linfática(7).

As metástases pancreáticas de CCR são solitárias (confinadas apenas ao pâncreas) em 80% dos pacientes e apresentam prognóstico mais favorável do que os tumores pancreáticos primários(8–11). Embora não exista consenso sobre o protocolo de seguimento dos pacientes após nefrectomia radical por doença neoplásica localizada(12), consideramos a TC com contraste intravenoso, particularmente com a obtenção da fase arterial do estudo, a modalidade de escolha para o seguimento dos pacientes operados de câncer renal. Como as metástases de CCR podem aparecer muitos anos após a ressecção cirúrgica, torna-se necessário que o paciente realize, pelo menos uma vez ao ano, TC do tórax, abdome e pelve. Este método é útil não só para a detecção da recorrência local como para a detecção de metástases a distância. A ressonância magnética e o PET-CT são também muito úteis no seguimento de casos selecionados(13).

As metástases pancreáticas de CCR são usualmente solitárias e hipervascularizadas, podendo simular tumor primário das ilhotas celulares(14), como observado em dois pacientes da nossa série. Estes dois pacientes com metástases pancreáticas solitárias apresentavam tumor estádio T1 à época da nefrectomia e desenvolveram metástases 12 e 5 anos após tratamento cirúrgico, respectivamente. O terceiro paciente apresentou metástase pancreática única e recorrência tumoral no rim contralateral. Estes achados foram detectados seis anos após nefrectomia por um CCR estádio T3a. O quarto paciente apresentou múltiplas metástases pancreáticas, recorrência tumoral no rim contralateral, metástases pulmonares e subcutâneas 11 anos após ressecção cirúrgica de um CCR estádio T3a.

A distinção entre tumor primário das ilhotas celulares pancreáticas e comprometimento metastático por CCR pode ser difícil, pois ambas as lesões são hipervascularizadas no estudo por TC. Nesta situação, deve-se pesquisar antecedentes de tumor primário, pois metástase de CCR pode ocorrer muitos anos após a nefrectomia. Os tumores funcionantes das ilhotas celulares geralmente são pequenos e sintomáticos, enquanto os tumores não-funcionantes são geralmente de grandes dimensões. Em caso de dúvida, e quando possível, deve-se realizar biópsia aspirativa percutânea com agulha fina dirigida por TC, a qual usualmente possibilita adequado diagnóstico pré-operatório(11).

O achado de metástases pancreáticas múltiplas em um paciente de nossa série é consistente com descrições anteriores(10,15). Embora a maioria dos tumores bilaterais se apresente sincronicamente, lesões assincrônicas podem ocorrer muitos anos após a nefrectomia original, fazendo com que esses pacientes sejam submetidos a longo período de seguimento evolutivo(16). Metástases pancreáticas associadas com lesões renais sincrônicas, como as observadas em dois pacientes de nossa série, não têm sido ilustradas na literatura. Quando a lesão metastática é solitária (confinada ao pâncreas) e o tumor pode ser ressecado completamente, os pacientes podem apresentar excelentes índices de sobrevida livre da doença em cinco anos(17).

 

CONCLUSÕES

As metástases pancreáticas de CCR são raras e podem ocorrer muitos anos após a apresentação inicial. A grande maioria dessas metástases é solitária, ou seja, restrita apenas ao pâncreas. À TC, as metástases pancreáticas aparecem como lesões hipervascularizadas, simulando tumores das ilhotas celulares. Pacientes com metástases pancreáticas solitárias beneficiam-se com a ressecção cirúrgica da lesão. As metástases pancreáticas múltiplas e metástases pancreáticas associadas a recorrência tumoral no rim contralateral são incomuns.

 

REFERÊNCIAS

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Endereço para correspondência:
Dr. Adilson Prando
Hospital Vera Cruz
Avenida Andrade Neves, 707, Centro
Campinas, SP, Brasil, 13013-161
E-mail: adilson.prando@gmail.com

Recebido para publicação em 26/7/2007. Aceito, após revisão, em 24/9/2007.

 

 

* Trabalho realizado no Hospital Vera Cruz, Campinas, SP, Brasil.


 
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