ARTIGO ORIGINAL
|
|
|
|
Autho(rs): Adilson Prando |
|
Descritores: Metástases pancreáticas, Carcinoma de células renais, Tomografia computadorizada |
|
Resumo:
INTRODUÇÃO Carcinoma de células renais (CCR) é o câncer renal mais comum e representa 2% de todas as lesões malignas do adulto(1). Apresenta significativas morbidade e mortalidade, tendo sido estimados, nos Estados Unidos em 2003, cerca de 35.000 novos casos e 12.480 óbitos(2). Até o presente momento, a ressecção cirúrgica completa deste tumor continua sendo o único tratamento curativo. No entanto, a recorrência ocorre em cerca de 20% a 30% dos pacientes com tumores localizados. A maioria das recorrências ocorre dentro de três anos após a cirurgia, com tempo médio para recorrer que varia de um a três anos(3). Ocasionalmente, pode ocorrer recorrência tumoral tardia, recorrência esta que acontece muitos anos após o tratamento inicial. Os sítios mais comuns de recorrência são pulmões, osso, loja renal, cérebro, fígado e rim contralateral(4). Os órgãos menos freqüentemente acometidos são glândulas adrenais, vesícula biliar, tireóide, pâncreas, músculo, pele ou tecido subcutâneo. O objetivo deste trabalho é apresentar os achados, na tomografia computadorizada (TC), observados em quatro pacientes com metástases pancreáticas após nefrectomia radical. Dois desses pacientes apresentavam apenas metástase pancreática solitária (confinada apenas ao pâncreas), o terceiro apresentava metástase pancreática única associada a recorrência tumoral no rim contralateral, e o quarto paciente apresentava metástases pancreáticas múltiplas, tumor recorrente no rim contralateral e metástases pulmonares e subcutâneas.
MATERIAIS E MÉTODOS Foram realizados revisão dos prontuários médicos e estudos de TC de quatro pacientes (três mulheres e um homem) com metástases de CCR para o pâncreas. A idade dos pacientes variou de 38 a 63 anos. Na época do diagnóstico, os tumores primários eram todos carcinoma de células claras convencionais e estádio T1 (dois pacientes) e estádio T3a (dois pacientes). O intervalo médio entre a nefrectomia e a detecção das metástases pancreáticas foi de oito anos. Todos os pacientes foram avaliados por TC helicoidal single slice. Após a localização do pâncreas (cortes sem contraste, colimação de 10 mm e intervalo de 10 mm), foram obtidas duas fases após administração intravenosa de contraste na área pancreática (aos 25 segundos e aos 70 segundos). Cada série foi obtida em uma única apnéia, utilizando-se colimação de 3 mm, pitch 2:1, 120 kVp e 240280 mA. Uma terceira fase foi obtida aos 120 segundos (7 mm de colimação e pitch 1:1), incluindo todo o abdome superior. Foram injetados 150 ml de contraste não-iônico contendo 300 mg de iodo/dl, à velocidade de 3 ml/s. As imagens foram então reconstruídas para 2,5 mm, para obtenção das reformatações multiplanares. Metástase pancreática solitária, ou seja, com lesão apenas no pâncreas, foi observada em dois pacientes, ambos assintomáticos. O terceiro paciente apresentou metástase pancreática única associada a recorrência tumoral no rim contralateral, e o quarto paciente apresentou múltiplas metástases pancreáticas associadas a metástases pulmonares e subcutâneas e recorrência tumoral no rim contralateral. Estes dois últimos pacientes eram sintomáticos (perda de peso, dores abdominais ou hematúria).
RESULTADOS Quatro pacientes (três mulheres e um homem) com idade média de 50 anos apresentaram-se com metástases pancreáticas de CCR, sendo estas metástases solitária (n = 2), única (n = 1) ou múltiplas (n = 1). Na época da nefrectomia radical todos os pacientes apresentavam CCR (convencional de células claras) estádio T1 (n = 2) e estádio T3a (n = 2). O intervalo médio entre a nefrectomia e a detecção das metástases pancreáticas foi de oito anos. Todas as lesões eram hipervascularizadas ao estudo por TC com contraste intravenoso, simulando, quando única, tumor das ilhotas celulares pancreáticas. O tamanho médio das lesões foi de 1,8 cm (variando de 0,8 cm a 2,8 cm). Em dois pacientes com metástase solitária a lesão era localizada na cauda do pâncreas (Figuras 1 e 2). Estes dois pacientes foram tratados mediante pancreatectomia parcial, estando ambos livres da doença quatro e dois anos após a cirurgia, respectivamente. Um paciente apresentou metástase pancreática única no corpo do pâncreas (Figura 3) e recorrência tumoral no rim contralateral. O acompanhamento deste paciente foi descontinuado. O quarto paciente apresentou múltiplas pequenas metástases hipervascularizadas no pâncreas, tumor recorrente no rim contralateral e metástases pulmonares e subcutâneas (Figura 4). Este paciente está sendo tratado com imunoterapia, e 27 meses após o diagnóstico mostra doença metastática estabilizada.
DISCUSSÃO Vinte e três por cento dos pacientes com CCR apresentam-se com metástases na época da detecção da doença. Vinte e cinco por cento deles desenvolvem metástases dentro de um prazo de cinco anos após nefrectomia(5). O maior diâmetro, o estágio do tumor e o seu grau nuclear são importantes fatores para a determinação da probabilidade do paciente desenvolver recorrência tumoral(4). Metástases pancreáticas originárias de qualquer tumor são excepcionalmente raras. Comprometimento pancreático por metástases de CCR representa apenas 0,25% a 3% dos casos(6). O modo de propagação do CCR para o pâncreas pode se dar por via hematogênica ou por via linfática(7). As metástases pancreáticas de CCR são solitárias (confinadas apenas ao pâncreas) em 80% dos pacientes e apresentam prognóstico mais favorável do que os tumores pancreáticos primários(811). Embora não exista consenso sobre o protocolo de seguimento dos pacientes após nefrectomia radical por doença neoplásica localizada(12), consideramos a TC com contraste intravenoso, particularmente com a obtenção da fase arterial do estudo, a modalidade de escolha para o seguimento dos pacientes operados de câncer renal. Como as metástases de CCR podem aparecer muitos anos após a ressecção cirúrgica, torna-se necessário que o paciente realize, pelo menos uma vez ao ano, TC do tórax, abdome e pelve. Este método é útil não só para a detecção da recorrência local como para a detecção de metástases a distância. A ressonância magnética e o PET-CT são também muito úteis no seguimento de casos selecionados(13). As metástases pancreáticas de CCR são usualmente solitárias e hipervascularizadas, podendo simular tumor primário das ilhotas celulares(14), como observado em dois pacientes da nossa série. Estes dois pacientes com metástases pancreáticas solitárias apresentavam tumor estádio T1 à época da nefrectomia e desenvolveram metástases 12 e 5 anos após tratamento cirúrgico, respectivamente. O terceiro paciente apresentou metástase pancreática única e recorrência tumoral no rim contralateral. Estes achados foram detectados seis anos após nefrectomia por um CCR estádio T3a. O quarto paciente apresentou múltiplas metástases pancreáticas, recorrência tumoral no rim contralateral, metástases pulmonares e subcutâneas 11 anos após ressecção cirúrgica de um CCR estádio T3a. A distinção entre tumor primário das ilhotas celulares pancreáticas e comprometimento metastático por CCR pode ser difícil, pois ambas as lesões são hipervascularizadas no estudo por TC. Nesta situação, deve-se pesquisar antecedentes de tumor primário, pois metástase de CCR pode ocorrer muitos anos após a nefrectomia. Os tumores funcionantes das ilhotas celulares geralmente são pequenos e sintomáticos, enquanto os tumores não-funcionantes são geralmente de grandes dimensões. Em caso de dúvida, e quando possível, deve-se realizar biópsia aspirativa percutânea com agulha fina dirigida por TC, a qual usualmente possibilita adequado diagnóstico pré-operatório(11). O achado de metástases pancreáticas múltiplas em um paciente de nossa série é consistente com descrições anteriores(10,15). Embora a maioria dos tumores bilaterais se apresente sincronicamente, lesões assincrônicas podem ocorrer muitos anos após a nefrectomia original, fazendo com que esses pacientes sejam submetidos a longo período de seguimento evolutivo(16). Metástases pancreáticas associadas com lesões renais sincrônicas, como as observadas em dois pacientes de nossa série, não têm sido ilustradas na literatura. Quando a lesão metastática é solitária (confinada ao pâncreas) e o tumor pode ser ressecado completamente, os pacientes podem apresentar excelentes índices de sobrevida livre da doença em cinco anos(17).
CONCLUSÕES As metástases pancreáticas de CCR são raras e podem ocorrer muitos anos após a apresentação inicial. A grande maioria dessas metástases é solitária, ou seja, restrita apenas ao pâncreas. À TC, as metástases pancreáticas aparecem como lesões hipervascularizadas, simulando tumores das ilhotas celulares. Pacientes com metástases pancreáticas solitárias beneficiam-se com a ressecção cirúrgica da lesão. As metástases pancreáticas múltiplas e metástases pancreáticas associadas a recorrência tumoral no rim contralateral são incomuns.
REFERÊNCIAS 1. Levine E, King BF Jr. Adult malignant renal parenchymal neoplasms. In: Pollack HM, McClennan BL, editors. Clinical urography. 2nd ed. Philadelphia: Saunders; 2000. p. 144059. [ ] 2. Prasad SR, Humphrey PA, Catena JR, et al. Common and uncommon histologic subtypes of renal cell carcinoma: imaging spectrum with pathologic correlation. Radiographics. 2006;26:1795806. [ ] 3. Sandock DS, Seftel AD, Resnick MI. A new protocol for the follow-up of renal cell carcinoma based on pathological stage. J Urol. 1995;154:2831. [ ] 4. Chae EJ, Kim JK, Kim SH, et al. Renal cell carcinoma: analysis of postoperative recurrence patterns. Radiology. 2005;234:18996. [ ] 5. Ritchie AWS, de Kernion JB. The natural history and clinical features of renal cell carcinoma. Semin Nephrol. 1987;7:1319. [ ] 6. Ninan S, Jain PK, Paul A, et al. Synchronous pancreatic metastases from asymptomatic renal cell carcinoma. JOP. 2005;6:268. [ ] 7. Tongio J, Peruta O, Wenger JJ, et al. Metastases duodenales et pancreatiques du nephro-epitheliome: a propôs de quatre observations. Ann Radiol. 1997;20:6417. [ ] 8. Diner EK, Williams CR, Behari A, et al. Metastatic renal cell carcinoma to contralateral ureter presenting as acute obstructive renal failure after radical nephrectomy. Urology. 2005;65:10013. [ ] 9. Hirota T, Tomida T, Iwasa M, et al. Solitary pancreatic metastasis occurring eight years after nephrectomy for renal cell carcinoma: a case report and surgical review. Int J Pancreatol. 1996;19: 14553. [ ] 10. Kassabian A, Stein J, Jabbour N, et al. Renal cell carcinoma metastatic to the pancreas: a single-institution series and review of the literature. Urology. 2000;56:2115. [ ] 11. Minni F, Casadei R, Perenze B, et al. Pancreatic metastases: observations of three cases and review of the literature. Pancreatology. 2004;4:50920. [ ] 12. Breda A, Konijeti R, Lam JS. Patterns of recurrence and surveillance strategies for renal cell carcinoma following surgical resection. Expert Rev Anticancer Ther. 2007;7:84762. [ ] 13. Tollefson MK, Takahashi N, Leibovich BC, et al. Contemporary imaging modalities for the surveillance of patients with renal cell carcinoma. Curr Urol Rep. 2007;8:3843. [ ] 14. Ichikawa T, Peterson MS, Federle MP, et al. Islet cell tumor of the pancreas: biphasic CT versus MR imaging tumor detection. Radiology. 2000; 216:16371. [ ] 15. Ascenti G, Visalli G, Genitori A, et al. Multiple hypervascular pancreatic metastases from renal cell carcinoma: dynamic MR and spiral CT in three cases. Clin Imaging. 2004;28:34952. [ ] 16. Grimaldi G, Reuter V, Russo P. Bilateral non-familial renal cell carcinoma. Ann Surg Oncol. 1998;5:54852. [ ] 17. Sohn TA, Yeo CJ, Cameron JL, et al. Renal cell carcinoma metastatic to the pancreas: results of surgical management. J Gastrointest Surg. 2001; 5:34651. [ ]
Endereço para correspondência: Recebido para publicação em 26/7/2007. Aceito, após revisão, em 24/9/2007.
* Trabalho realizado no Hospital Vera Cruz, Campinas, SP, Brasil. |