Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

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Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 41 nº 4 - Jul. / Ago.  of 2008

EDITORIAL
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Page(s) V to VI



Novos paradigmas na avaliação por imagem dos tumores parenquimatosos renais

Autho(rs): Ronaldo Hueb Baroni

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O advento da ultra-sonografia (US) representou um divisor de águas neste cenário, pois pequenas lesões subclínicas passaram a ser diagnosticadas de forma incidental — os chamados incidentalomas. Com isto, houve significativa melhora da sobrevida, visto que pacientes com tumores incidentais menores que 4 cm (estádio T1) têm 95% de probabilidade de sobrevida em dez anos(1). A maior disponibilidade do Doppler e dos meios de contraste ultra-sonográficos contribuiu, nos últimos anos, para aumentar a aplicabilidade da US na detecção, planejamento terapêutico e seguimento pós-tratamento das lesões focais renais.

A tomografia computadorizada (TC) com contraste iodado endovenoso, por sua vez, tornou-se o método de escolha na avaliação da grande maioria das lesões focais renais, pois, além de possibilitar uma melhor caracterização de lesões detectadas à US, também permitiu um acurado estadiamento pré-terapêutico destas lesões. As tecnologias atuais, com tomógrafos helicoidais de múltiplas fileiras de detectores (TCMD ou TC multislice) e utilizando protocolos dedicados com quatro fases de exame (pré-contraste, córtico-medular, nefrográfica e excretora) ampliaram ainda mais a aplicabilidade da TC, com exames mais rápidos, de maior resolução espacial e com possibilidade de reconstruções multiplanares e tridimensionais(2).

Por fim, a ressonância magnética (RM), com sua excepcional resolução de contraste e possibilidade de subtração digital de imagens, veio a contribuir de modo positivo na avaliação de lesões renais focais, especialmente nos pacientes alérgicos a contraste iodado e na caracterização das lesões indeterminadas à TC(3).

Os tumores renais parenquimatosos englobam uma gama extensa e heterogênea de lesões expansivas, desde lesões benignas ou de baixa agressividade, até tumores malignos extremamente agressivos com sobrevida média de poucos meses após o diagnóstico. Como regra geral, 90% dos tumores parenquimatosos renais são malignos, e, destes, cerca de 90% são carcinomas de células renais (CCR).

Frente a um tumor parenquimatoso sólido renal detectado de forma incidental em um método de imagem, cabe ao radiologista realizar o estadiamento da lesão, pela TCMD ou pela RM, mediante avaliação dos seguintes parâmetros:

•Tamanho tumoral: nódulos menores que 4 cm apresentam maior chance de tratar-se de lesão benigna (20%) ou não-cirúrgica (30%), enquanto massas maiores que 7 cm têm pior prognóstico(4).

•Invasão das gorduras perirrenal e sinusal, ou de órgãos adjacentes: a acurácia da TCMD e da RM para detecção de invasão da gordura perirrenal chega a 90%, desde que critérios específicos de análise sejam seguidos(5,6).

•Invasão de veias renais e da veia cava inferior: os valores preditivos positivo e negativo para invasão vascular são maiores que 92%, tanto para a TCMD quanto para a RM(2).

•Acometimento linfonodal: considerando-se linfonodos maiores que 1 cm (no menor diâmetro) como comprometidos por tumor, a sensibilidade dos métodos de imagem é de mais de 95%, mas a especificidade é de apenas 50%(2). Este cenário deve melhorar sobremaneira com a liberação comercial dos contrastes superparamagnéticos linfotróficos à base de nanopartículas de ferro, que mostraram sensibilidade de 100% e especificidade de 95% no estadiamento linfonodal em estudos preliminares(7).

•Metástases a distância: a TC é o método mais indicado para detecção de lesões secundárias, sendo os sítios mais comuns de metástases pulmões, mediastino, ossos e fígado.

O artigo publicado nesta edição da Radiologia Brasileira(8) chama a atenção para um importante aspecto dos CCRs: a possibilidade de recorrência tumoral tardia, anos (ou décadas) após o tratamento da lesão primária. Como particularidade, o artigo destaca o padrão hipervascularizado das metástases pancreáticas do CCR e enfatiza o diagnóstico diferencial com tumores pancreáticos de linhagem neuroendócrina. Duas outras mensagens relevantes podem ser obtidas da leitura deste artigo: a importância de um protocolo de exame adequado, incluindo uma fase arterial ou córtico-medular do abdome superior, e a necessidade de controles oncológicos prolongados nos pacientes com CCR.

Também o tratamento do CCR passou por mudanças significativas nos últimos anos, com o desenvolvimento de técnicas cirúrgicas preservadoras de néfrons, como a nefrectomia parcial e a enucleação. Estas abordagens cirúrgicas podem ser aplicadas principalmente em pacientes com tumores pequenos, circunscritos e periféricos, sendo as taxas de recorrência similares àquelas encontradas em pacientes submetidos a nefrectomia total(9). Além disso, existe também a possibilidade de cirurgias laparoscópicas e robóticas, abordagens percutâneas minimamente invasivas (ablação por radiofreqüência e crioterapia) e mesmo observação vigilante, em casos selecionados.

O surgimento dessas novas modalidades terapêuticas criou novos paradigmas na avaliação por imagem dos tumores renais. Além do estadiamento propriamente dito, cabe ao radiologista fornecer ao urologista informações relevantes para a decisão da modalidade terapêutica mais adequada, ou para o manejo intra-operatório das lesões. Detalhes topográficos (como distância da lesão em relação ao seio renal e contato com vasos hilares) e vasculares (existência de artérias supranumerárias, veias com trajeto anômalo ou varizes peritumorais) devem sempre ser mencionados.

A biópsia percutânea dos tumores renais guiada por TC ou US, outrora proscrita em decorrência de risco teórico de disseminação neoplásica no trajeto da agulha, tem-se mostrado método seguro e eficaz, especialmente com a utilização de agulhas coaxiais (com risco de disseminação menor que 0,01%) e com técnicas combinadas de punção-aspirativa e de fragmento (core-biopsy). As indicações estabelecidas de biópsia de lesão focal renal são: pacientes com suspeita de lesão renal de origem neoplásica secundária ou etiologia infecciosa, suspeita de lesão irressecável, ou ausência de condições cirúrgicas. Outras indicações emergentes são: nódulos menores que 3 cm hiperatenuantes e com realce homogêneo, pacientes candidatos a tratamento percutâneo (radiofreqüência ou crioterapia), ou lesões císticas complexas indeterminadas (Bosniak III)(10).

Por fim, estudos recentes têm demonstrado a capacidade de predição pré-operatória da agressividade, ou mesmo do subtipo histológico dos tumores pela TC e RM, especialmente em relação aos carcinomas de células claras e papilíferos. Os primeiros costumam apresentar hipervascularização heterogênea com focos de necrose e podem conter gordura microscópica detectável nas seqüências de RM gradiente-eco com água e gordura "fora-de-fase" (a especificidade da RM para este subtipo histológico é de 83%). Já os tumores papilíferos costumam apresentar-se como nódulos homogêneos, hipovascularizados e com baixo sinal nas seqüências de RM ponderadas em T2 (especificidade de 94% na RM)(11). Estes resultados são extremamente promissores, com grande perspectiva de aplicação em pacientes com lesões incidentais, candidatos a terapêuticas minimamente invasivas ou observação vigilante.

Em resumo, o salto tecnológico dos métodos de imagem nos últimos anos, somado às novas possibilidades terapêuticas, trouxeram novos paradigmas à avaliação por imagem dos tumores parenquimatosos renais.

 

REFERÊNCIAS

1. Ficarra V, Novara G, Galfano A, et al. Application of TNM, 2002 version, in localized renal cell carcinoma: is it able to predict different cancer-specific survival probability? Urology. 2004;63:1050–4.         [  ]

2. Sheth S, Scatarige JC, Horton KM, et al. Current concepts in the diagnosis and management of renal cell carcinoma: role of multidetector CT and three-dimensional CT. Radiographics. 2001;21:S237–54.         [  ]

3. Zhang J, Lefkowitz RA, Bach A. Imaging of kidney cancer. Radiol Clin North Am. 2007;45:119–47.         [  ]

4. Lebret T, Poulain JE, Molinie V, et al. Percutaneous core biopsy for renal masses: indications, accuracy and results. J Urol. 2007;178:1184–8.         [  ]

5. Catalano C, Fraioli F, Laghi A, et al. High-resolution multidetector CT in the preoperative evaluation of patients with renal cell carcinoma. AJR Am J Roentgenol. 2003;180:1271–7.         [  ]

6. Roy C Sr, El Ghali S, Buy X, et al. Significance of the pseudocapsule on MRI of renal neoplasms and its potential application for local staging: a retrospective study. AJR Am J Roentgenol. 2005;184:113–20.         [  ]

7. Guimaraes AR, Tabatabei S, Dahl D, et al. Pilot study evaluating use of lymphotrophic nanoparticle-enhanced magnetic resonance imaging for assessing lymph nodes in renal cell cancer. Urology.2008;71:708–12.         [  ]

8. Prando A. Achados da tomografia computadorizada em metástases pancreáticas do carcinoma de célular renais. Radiol Bras. 2008;41:225–228.         [  ]

9. Lerner SE, Hawkins CA, Blute ML, et al. Disease outcome in patients with low stage renal cell carcinoma treated with nephron sparing or radical surgery. J Urol. 1996;155:1868–73.         [  ]

10. Silverman SG, Gan YU, Mortele KJ, et al. Renal masses in the adult patient: the role of percutaneous biopsy. Radiology. 2006; 240:6–22.         [  ]

11. Pedrosa I, Chou MT, Ngo L, et al. MR classification of renal masses with pathologic correlation. Eur Radiol. 2008;18:365–75.        [  ]

 
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