A gripe espanhola, como ficou conhecida, acabou em 1919. Mas não o agente causal: o vírus H1N1 continuou circulando e sofrendo mutações, formando outras linhagens virais, como o H2N2 (gripe asiática, 1957), o H3N2 (gripe de Hong Kong, 1968) e o H5N1 (gripe aviária, 1997 e 2003). Em abril de 2009, o Secretariado Mexicano de Saúde notificou um surto de doença respiratória por um vírus de origem suína, conhecido como influenza A (H1N1)(1). O velho vilão estava de volta. No mesmo mês, a Organização Mundial da Saúde classificava a doença como uma pandemia de preocupação mundial. Como previsto, esta se disseminou por todo o planeta, com cerca de 400.000 casos descritos e quase 5.000 óbitos.
Embora o diagnóstico seja eminentemente clínico e laboratorial, exames de imagem têm sido frequentemente empregados na avaliação de pacientes com suspeita de infecção pelo H1N1. A radiografia de tórax é normal em mais da metade dos pacientes ou demonstra opacidades pulmonares acinares, geralmente centrais e nos lobos inferiores, podendo assumir padrão difuso(2,3). A tomografia computadorizada (TC) é muito mais eficaz na avaliação dos achados, que consistem em opacidades esparsas com atenuação de vidro fosco, usualmente peribroncovasculares ou subpleurais, por vezes associadas a focos de consolidação, lembrando o aspecto visto na síndrome de angústia respiratória aguda ou na bronquiolite respiratória com pneumonia em organização/pneumonia em organização criptogênica(2-4). Por outro lado, opacidades com aspecto de árvore em brotamento, nódulos centrolobulares e perfusão pulmonar em mosaico, achados comumente encontrados em pneumonias virais, são infrequentes na infecção pelo H1N1. Alguns estudos relatam uma maior predisposição ao desenvolvimento de tromboembolismo pulmonar em pacientes infectados(2).
O Brasil, um dos países mais populosos do mundo, foi dos mais afetados pela doença, principalmente nas regiões Sul e Sudeste, durante os meses de inverno(5), e alguns relatos de casos nacionais sobre os aspectos de imagem da infecção por H1N1 encontram-se no prelo em revistas internacionais(6,7). Um dos primeiros artigos originais relatando os achados de imagem na infecção pelo vírus H1N1, realizado simultaneamente aos internacionais, foi o de Marchiori et al.(8), no qual foram avaliados 20 pacientes com a doença, por meio de radiografia simples e TC de alta resolução, tendo como principais achados opacidades em vidro fosco e consolidações bilaterais, predominantemente subpleurais.
O artigo de Verrastro et al.(9), publicado nesta edição da Radiologia Brasileira, confirma os achados encontrados nos estudos anteriores, ao demonstrar, nos nove pacientes avaliados, predomínio de opacidades em vidro fosco e consolidações. Como os pacientes avaliados eram de ambiente hospitalar, cinco tinham características de risco para desenvolvimento de doença grave (uma gestante e quatro transplantados renais) e foram os com as alterações tomográficas mais extensas. Além disto, nos pacientes transplantados renais, um caso apresentava como principal aspecto tomográfico nódulos centrolobulares com padrão de árvore em brotamento, achado incomum na infecção por H1N1, mas já descrito nas pneumonias por influenza em imunocomprometidos(10). Neste mesmo grupo, foram evidenciados derrames pleurais e linfonodomegalias mediastinais, também pouco frequentes nas infecções virais em imunocompetentes.
Com o aumento da temperatura no hemisfério sul, as taxas de infecção no Brasil encontram-se em declínio, com patamares abaixo da linha de base e poucos casos de influenza pandêmica. Contudo, com a proximidade da chegada do inverno no hemisfério Norte, observa-se aumento nas taxas da doença na América do Norte, Europa Ocidental e Norte da Ásia. Num mundo cada dia mais globalizado, com as distâncias cada vez menores, o conhecimento dos achados clínicos e de imagem da infecção pelo vírus H1N1 se torna de extrema importância no combate à doença. Afinal, quase 100 anos após a epidemia de gripe espanhola, não gostaríamos de repetir o mesmo insucesso.
REFERÊNCIAS
1. Perez-Padilla R, de la Rosa-Zamboni D, Ponce de Leon S, et al. Pneumonia and respiratory failure from swine-origin influenza A (H1N1) in Mexico. N Engl J Med. 2009;361:680-9. [ ]
2. Agarwal PP, Cinti S, Kazerooni EA. Chest radiographic and CT findings in novel swine-origin influenza A (H1N1) virus (S-OIV) infection. AJR Am J Roentgenol. 2009;193:1488-93. [ ]
3. Ajlan AM, Quiney B, Nicolaou S, et al. Swine-origin influenza A (H1N1) viral infection: radiographic and CT findings. AJR Am J Roentgenol. 2009;193:1494-9. [ ]
4. Lee CW, Seo JB, Song JW, et al. Pulmonary complication of novel influenza A (H1N1) infection: imaging features in two patients. Korean J Radiol. 2009;10:531-4. [ ]
5. Oliveira WK, Carmo EH, Penna GO, et al. Pandemic H1N1 influenza in Brazil: analysis of the first 34,506 notified cases of influenza-like illness with severe acute respiratory infection (SARI). Euro Surveill. 2009;14(42). [ ]
6. Marchiori E, Zanetti G, Hochhegger B, et al. High-resolution computed tomography findings in a patient HIV-positive with swine-origin influenza A (H1N1) virus-associated pneumonia. Br J Radiol. In Press 2009. [ ]
7. Marchiori E, Zanetti G, Hochhegger B, et al. High-resolution CT findings in a patient with influenza A (H1N1) virus-associated pneumonia. Br J Radiol. In Press 2009. [ ]
8. Marchiori E, Zanetti G, Hochhegger B, et al. High-resolution computed tomography findings from adult patients with influenza A (H1N1) virus-associated pneumonia. Eur J Radiol. In Press 2009. [ ]
9. Verrastro CGY, Abreu Junior L, Hitomi DZ, et al. Manifestações da infecção pelo novo vírus influenza A (H1N1) na tomografia computadorizada de tórax. Radiol Bras. 2009;42:343-8. [ ]
10. Oikonomou A, Müller NL, Nantel S. Radiographic and high-resolution CT findings of influenza virus pneumonia in patients with hematologic malignancies. AJR Am J Roentgenol. 2003;181:507-11. [ ]