Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

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Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 51 nº 4 - Jul. / Ago.  of 2018

CARTAS AO EDITOR
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Page(s) 268 to 278



Síndrome de Bouveret e seu diagnóstico por imagem

Autho(rs): Isabela Lemos Murelli Rodrigues

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Texto em Português English Text

Sr. Editor,

Paciente mulher, 84 anos, hipertensa, relatou dor no andar superior do abdome associada a náuseas e vômitos pós-prandiais imediatos e parada de eliminação de gases e fezes por três dias. Exame físico: afebril, abdome distendido, doloroso à palpação profunda do andar superior, sem sinais de irritação peritonial. A radiografia simples de abdome (Figura 1A) mostrou ar em configuração ramificada na projeção hepática e nível hidroaéreo na câmara gástrica. A ultrassonografia (Figura 1B) demonstrou vias biliares intra-hepáticas e extra-hepáticas de dimensões normais e presença de aerobilia, não sendo identificada a vesícula biliar. Caracterizou-se distensão da câmara gástrica, com segmento distal aparentando estar aderido ao hilo hepático, além de cálculo na região antral/pilórica, sendo sugerida a hipótese diagnóstica de obstrução gástrica por cálculo vesicular. Para melhor elucidação diagnóstica e avaliação de possíveis complicações, foi realizada tomografia computadorizada de abdome (Figuras 1C e 1D), que demonstrou correlação com os achados ultrassonográficos, confirmando-se diagnóstico imaginológico de síndrome de Bouveret.


Figura 1. A: Radiografia de abdome em ortostase mostrando nível hidroaéreo no estômago (seta preta) e aerobilia intra-hepática (setas brancas). B: Ultrassonografia de abdome caracterizando a região pilóricoduodenal com cálculo impactado no seu interior (seta). C: Tomografia computadorizada de abdome com contraste oral demonstrando nível hidroaéreo no estômago (seta vertical) e conteúdo gasoso em vias biliares-intra-hepáticas/pneumobilia (setas horizontais). D: Tomografia computadorizada de abdome com contraste oral identificando cálculo de densidade mista localizado na região pilórica (seta), causando obstrução e dilatação a montante do estômago.



Síndrome de Bouveret é uma causa rara de obstrução da saída gástrica, por impactação de grande cálculo da vesícula no bulbo duodenal/piloro após a migração através de uma fístula bilioduodenal/biliogástrica(1). Íleo biliar é uma doença que afeta principalmente mulheres e com frequência a fisiopatologia se explica por um episódio prévio de colecistite aguda(2). A maior incidência ocorre nos idosos com comorbidades e doenças das vias biliares. Quanto ao sítio da obstrução, relata-se a seguinte distribuição: íleo terminal, 60%; íleo proximal, 24%; jejuno distal, 9%; cólon e reto, 2% a 4%; duodeno distal, 1% a 3%; e, em menor frequência, na porção proximal do duodeno quando causa imediata obstrução do esvaziamento(1,3). De todos os íleos biliares, 1% a 3% decorrem de impacção de cálculos na região pilórica ou duodenal, conhecido como síndrome de Bouveret.

O diagnóstico pode ser suspeitado em exame de radiografia simples, baseado na tríade de Rigler, o qual é patognomônico de íleo biliar e ocorre em 40% a 50% dos casos. A tríade de Rigler é a soma de alças dilatadas com nível hidroaéreo, litíase biliar ectópica e gás no trato biliar(4). O estudo contrastado do trato digestivo alto pode ser útil, com a visualização de falha de enchimento correspondente ao cálculo e contrastação do orifício fistuloso colecistoduodenal/colecistogástrico(3,5). A ultrassonografia pode mostrar aerobilia, distensão gástrica/alças intestinais, além de, às vezes, localizar o cálculo biliar. A tríade de Rigler é mais comumente vista na tomografia, na qual a aerobilia e a dilatação da câmara gástrica são facilmente identificadas e a fístula pode ser diagnosticada após administração de contraste oral, caracterizando seu pertuito, ou indiretamente pela identificação de contraste no interior da vesícula biliar(3). O diagnóstico pode ajudar na extração rápida de um cálculo obstruído, porém, a mortalidade permanece relativamente alta, provavelmente secundária ao estereótipo do paciente, em geral de idade avançada e apresentando comorbidades, e seu impacto na intervenção cirúrgica(6,7).

Apesar de a síndrome de Bouveret ser uma doença relativamente rara, o diagnóstico por imagem é possível e importante para que seja instituída intervenção endoscópica e cirúrgica precoces(1–8).


REFERÊNCIAS

1. Torres J, Costa Almeida CE, Ferreira M, et al. Ileus biliar – complicação rara de litíase vesicular. J Port Gastrenterol. 2009;16:159–62.

2. Rodríguez Hermosa JI, Codina Cazador A, Gironès Vilà J, et al. Íleo biliar: resultados del análisis de una serie de 40 casos. Gastroenterol Hepatol. 2001;24:489–94.

3. Guniganti P, Bradenham CH, Raptis C, et al. CT of gastric emergencies. Radiographics. 2015;35:1909–21.

4. Patel NB, Oto A, Thomas S. Multidetector CT of emergent biliary pathologic conditions. Radiographics. 2013;33:1867–88.

5. Brennan GB, Rosenberg RD, Arora S. Bouveret syndrome. Radiographics. 2004;24:1171–5.

6. Rodríguez-Hermosa JI, Roig J, Gironès J, et al. Síndrome de Bouveret: descripción de 5 casos. Cir Esp. 2004;76:256–60.

7. Jukemura J, Machado MAC, Salem MZ, et al. Síndrome de Bouveret: relato de caso. Rev Hosp Clin Fac Med Univ São Paulo. 1994;49:250–2.

8. Carmo JWC. Complicação da colecistite calculosa com obstrução duodenal: síndrome de Bouveret. Relato de caso. Rev Med Res. 2008;10:127–30.










Conjunto Hospitalar do Mandaqui, São Paulo, SP, Brasil

Endereço para correspondência:
Dra. Isabela Lemos Murelli Rodrigues
Conjunto Hospitalar do Mardaqui
Rua Voluntários da Pátria, 4110, Santana
São Paulo, SP, Brasil, 02401-400
E-mail: isalemos.m@gmail.com
 
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