Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

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Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 51 nº 3 - Maio / Jun.  of 2018

CARTAS AO EDITOR
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Page(s) 207 to 208



Pseudocisto de pâncreas ectópico: diagnóstico e tratamento percutâneo guiado por TCMD

Autho(rs): Camila Bastos Lapa1; Eduardo Cesar Freire1; João Maurício Canavezi Indiani1; Marcelo Fontalvo Martins1; Marcelo Souto Nacif2

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Sr. Editor,

Homem, 40 anos, com queixa de dor abdominal intensa, náuseas e vômitos com duração de 12 horas. Negou comorbidades, mas relatou quadro concomitante de constipação e história de libação alcoólica nos últimos três dias. No exame físico, apresentou dor abdominal à palpação no baixo ventre. Tomografia computadorizada multidetectores (TCMD) do abdome total mostrou pâncreas normal e uma formação tecidual com densidade semelhante ao parênquima pancreático (Figura 1), de 30 UH, localizada no mesentério, em íntimo contato com segmento proximal de alça jejunal, medindo 2,8 × 2,9 × 2,9 cm, apresentando líquido adjacente (Figuras 1 e 2). O paciente foi internado, com amilase e lipase elevadas, sendo realizado tratamento de suporte nutricional e cobertura antibiótica. A dor piorou e persistiu nos 12 dias subsequentes. Nova TCMD demonstrou formação de pseudocápsula, com realce pelo meio de contraste, e permanência de líquido adjacente. Optou-se pela drenagem percutânea para avaliação de infecção, citologia oncótica e dosagem de amilase no líquido (Figura 2). A citometria mostrou presença de leucócitos, contagem diferencial com predomínio de mononucleares (60% de linfócitos) e ausência de malignidade. Pesquisas de fungo, BAAR, Gram e bacteriológica foram negativas, pH = 7,79 e LDH = 405 UI/mL, com amilase de 1207,0 UI/L. O paciente apresentou boa evolução pós-drenagem, recebeu alta em boas condições clínicas e está em acompanhamento ambulatorial nos últimos seis meses, assintomático.


Figure 1. TCMD do abdome total, corte axial, após administração de meio de contraste iodado intravenoso, na fase arterial (A) e portal (B). Observar o pâncreas em sua localização habitual, sem sinais inflamatórios (A). Em B, observar tecido pancreático ectópico, localizado no mesentério, em íntimo contato com o segmento proximal de alça jejunal, com líquido adjacente.


Figure 2. TCMD do abdome total, corte coronal oblíquo na fase portal (A), em que o pâncreas normal está em sua localização habitual (asterisco simples) e o pâncreas ectópico possui densidade semelhante e sinais inflamatórios (asterisco duplo). Em B, punção e drenagem percutânea guiada por TCMD.


Lesões tumorais e pseudotumorais do abdome superior têm sido motivo de recentes publicações na literatura radiológica brasileira(1-7). O pâncreas ectópico é uma condição rara, mais comum no sexo masculino, entre a quarta e sexta décadas de vida. É definido como tecido pancreático em localização anômala, sem nenhuma conexão anatômica, neural ou vascular com o pâncreas normal(8). A sua patogenia é desconhecida, porém, existem duas teorias para ele: a primeira diz que ocorre transplantação de células pancreáticas embrionárias para estruturas vizinhas durante o processo de rotação do intestino, e a segunda propõe que brotos embrionários permaneceriam aderidos ao duodeno primitivo, podendo ser transportados, durante o crescimento e formação do trato gastrintestinal, para locais proximais ou distais do duodeno primitivo(9).

A maioria dos portadores de pâncreas ectópico é assintomática e o diagnóstico geralmente é incidental por ocasião de exame de imagem ou de explorações cirúrgicas motivados por outras doenças(10,11). É importante salientar que presença de tecido pancreático ectópico é capaz de reproduzir todas as doenças do pâncreas nativo(12).

O tratamento está diretamente relacionado aos sintomas e ao grau de malignidade. Autores defendem a ressecção em pacientes sintomáticos, com lesões maiores que 3,0 cm, e possível malignidade. Porém, quando menores que 3,0 cm ou incidentalomas, não há ainda um consenso quanto a indicação de ressecção versus tratamento conservador percutâneo com vigilância periódica. A ressecção do pâncreas ectópico pode ser efetuada por via endoscópica ou cirúrgica(13).

Concluindo, acreditamos que, apesar de rara, a abordagem de pseudocisto(14) em pâncreas ectópico é de grande importância para afastar presença de células neoplásica e infecção, facilitando o tratamento clínico e a vigilância periódica do paciente, tendo o radiologista papel imprescindível nesse diagnóstico.


REFERÊNCIAS

1. Sousa CSM, Miranda CLVM, Avelino MC, et al. Diffuse plasmacytoma of the pancreas: a rare entity. Radiol Bras. 2017;50:344-5.

2. Siqueira GRS, Guimarães MD, Franco LFS, et al. Exophytic hepatocellular carcinoma, simulating a mesenchymal tumor, in a non-cirrhotic liver. Radiol Bras. 2017;50:62-3.

3. Staziaki PV, Teixeira BCA, Pedrazzani BM, et al. Hepatoblastoma with solid and multicystic aspect mimicking a mesenchymal hamartoma: imaging and anatomopathologic findings. Radiol Bras. 2017;50:68.

4. Fajardo L, Ramin GA, Penachim TJ, et al. Abdominal manifestations of extranodal lymphoma: pictorial essay. Radiol Bras. 2016;49:397-402.

5. Candido PCM, Pereira IMF, Matos BA, et al. Giant pedunculated hemangioma of the liver. Radiol Bras. 2016;49:57-8.

6. Giardino A, Miller FH, Kalb B, et al. Hepatic epithelioid hemangioendothelioma: a report from three university centers. Radiol Bras. 2016;49: 288-94.

7. Fabro M, Fabro SR, Sales RSO, et al. Pulse granuloma: a rare condition mimicking a gastric tumor. Radiol Bras. 2016;49:272-3.

8. Lee SL, Ku YM, Lee HH, et al. Gastric ectopic pancreas complicated by formation of a pseudocyst. Clin Res Hepatol Gastroenterol. 2014;38: 389-91.

9. Machado MM, Rosa ACF, Barros N, et al. Ultra-sonografia endoscópica (USE) do esôfago, estômago, cólons e reto. Radiol Bras. 2002;35:219-23.

10. Surov A, Hainz M, Hinz L, et al. Ectopic pancreas with pseudocyst and pseudoaneurysm formation. Clin Radiol. 2009;64:734-7.

11. Bromberg SH, Camilo Neto C, Borges AFA, et al. Heterotopia pancreática: análise clínico-patológica de 18 doentes. Rev Col Bras Cir. 2010;37:413-9.

12. Sharma DK, Agarwal S, Saran RK, et al. Pseudocyst of ectopic pancreas of the duodenal wall masquerading as malignant cystic tumor of pancreas. Saudi J Gastroenterol. 2009;15:271-3.

13. Ourô S, Taré F, Moniz L. Ectopia pancreática. Acta Med Port. 2011;24: 361-6.

14. Guaraldi S, Sá E, Romano S, et al. O papel da endoscopia no diagnóstico das neoplasias císticas primárias do pâncreas. Radiol Bras. 2005; 38:451-8.










1. URC Diagnóstico por Imagem, São José dos Campos, SP, Brasil
2. Universidade Federal Fluminense (UFF), Niterói, RJ, Brasil

Endereço para correspondência:
Dra. Camila Bastos Lapa
URC Diagnóstico por Imagem
Rua Teopompo de Vasconcelos, 245, Vila Adyana
São José dos Campos, SP, Brasil, 12243-830
E-mail: camilablapa@hotmail.com
 
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