Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 47 nº 5 - Set. / Out.  of 2014

EDITORIAL
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Page(s) V to VI



Ressonância magnética multiparamétrica de próstata: a evolução de uma técnica

Autho(rs): Valdair Francisco Muglia

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O câncer de próstata é a neoplasia mais comumente diagnosticada em homens e a segunda causa de morte por câncer, na população masculina, no mundo. No Brasil, o Instituto Nacional de Câncer (INCA) estima que, em 2014, serão diagnosticados cerca de 68.800 casos novos, o que o torna o câncer mais comum, excetuando-se os cutâneos(1).

O diagnóstico do câncer de próstata baseia-se na dosagem sérica do antígeno prostático específico (PSA) e no exame digital retal(2). Quando pelo menos um destes parâmetros está alterado, indica-se a biópsia do órgão, em geral, guiada por ultrassonografia transretal (USTR)(2). Este método diagnóstico tem baixas taxas de complicações(3,4), apesar de algumas reconhecidas e importantes limitações relacionadas a sensibilidade aquém do ideal e a subestimação do volume e grau tumoral(5). Além da USTR na biópsia prostática, outro método de imagem de fundamental importância na abordagem da neoplasia prostática é a ressonância magnética (RM).

A RM teve início pouco promissor nos anos 90(6), quando se limitava ao uso de bobina endorretal, utilizada isoladamente, gerando imagens de baixa resolução espacial e de contraste. Com a melhoria do hardware, como utilização de bobinas pélvicas de alto número de canais (isoladas ou em conjunto com a endorretal), associada à incorporação de técnicas funcionais à análise morfológica tradicional, o papel da RM na abordagem dos pacientes com câncer de próstata mudou consideravelmente(7).

As indicações da RM no câncer de próstata vêm sendo continuamente expandidas(8). Atualmente, pode-se listar vários empregos da RM no manuseio dos pacientes com câncer de próstata: 1 - no diagnóstico, principalmente em paciente com alta suspeição de câncer e com repetidas biópsias guiadas por US negativas(9); 2 - no estadiamento da neoplasia prostática, a RM vem se consolidando como método mais promissor para determinação da extensão extracapsular do tumor(10); 3 - em várias situações, o planejamento terapêutico pode ser alterado em função de informações fornecidas pela RM(11,12). Mesmo em situações em que usualmente não era indicada, por exemplo, nos tumores de baixo grau (devido a baixa probabilidade de extensão extraglandular), com o surgimento de opções terapêuticas como a vigilância ativa (watchful waiting), em que é necessário ter certeza do grau e da extensão tumoral, o uso da RM tem sido advogado(13); 4 - no seguimento e avaliação da resposta tumoral, tanto nas abordagens cirúrgicas, mas principalmente para controle das terapêuticas não cirúrgicas, quimio, radio e hormonioterapia(14), situações nas quais o uso das técnicas quantitativas da RM tem sido fundamental(15,16); 5 - caracterização do potencial de agressividade tumoral, principalmente pela técnica de difusão(17), potencial que ainda está em desenvolvimento, mas que, em princípio, pode resultar em uma melhor seleção de pacientes, evitando tratamentos agressivos desnecessários, tendo em vista que a maioria dos cânceres prostáticos é indolente.

Uma das principais críticas ao uso da RM no câncer de próstata sempre esteve relacionada à falta de padronização dos protocolos de obtenção de imagem(18). Em 2012, a European Society of Uroradiology (ESUR) publicou recomendações para o uso da RM na abordagem do câncer de próstata(19). Além de propor protocolos diferenciados, de acordo com a indicação do exame, este painel de experts recomendou a utilização de pelo menos duas técnicas funcionais em conjunto com as sequências morfológicas (ponderadas em T2 de alta resolução), a saber: difusão, contraste dinâmico e espectroscopia multivoxel de hidrogênios. Esta abordagem combinada recebe o nome de RM multiparamétrica (mpRM) de próstata. É importante destacar que junto com as recomendações relativas à técnica(20), a ESUR propôs um esquema de padronização da interpretação e relato dos achados na mpRM, conhecido pelo acrônimo PI-RADS (Prostate Imaging Reporting and Data System).

O excelente artigo de Bittencourt et al., neste número da Radiologia Brasileira(21), cumpre um importante papel ao contribuir para a disseminação deste método. O texto descreve e ilustra as técnicas utilizadas na mpRM da próstata, enfatizando os requisitos essenciais que devem estar presentes nos protocolos específicos de difusão, contraste dinâmico e espectroscopia de prótons, bem como para obtenção de imagens de alta resolução nas ponderações em T2. Os autores destacam os principais achados de imagem do câncer de próstata, usados tanto para o diagnóstico como para o estadiamento. Por último, abordam as principais utilizações da mpRM, já consolidadas, e aquelas que, embora já descritas em vários estudos, ainda necessitam de maior volume de dados para atingir o nível de evidência requerido para uso clínico disseminado.

Tanto a técnica da mpRM como a padronização proposta pelo PI-RADS estão em constante evolução e, provavelmente, uma nova classificação, em um futuro próximo, já incorporaria mudanças, oriundas de estudos conduzidos para avaliação desta tentativa de padronização da técnica, interpretação e relatório(21,22).

Para finalizar, cumpre ressaltar as perspectivas futuras do uso da mpRM, que incluem a sua utilização na terapia focal do câncer prostático e a fusão de imagens para abreviar o diagnóstico do câncer de próstata.


REFERÊNCIAS

1. Instituto Nacional de Câncer. Estimativa/2014 - Incidência de câncer no Brasil. [acessado em 28 de agosto de 2014]. Disponível em: www.inca.gov.br/estimativa/2014.

2. Johansson JE, Andrén O, Andersson SO, et al. Natural history of early, localized prostate cancer. JAMA. 2004;291:2713-9.

3. Solha RS, Ajzen S, De Nicola H, et al. Morbidity of transrectal ultrasound guided prostate biopsy. Radiol Bras. 2013;46:71-4.

4. Tyng CJ, Maciel MJS, Moreira BL, et al. Preparation and management of complications in prostate biopsies. Radiol Bras. 2013;46:367-71.

5. Berglund RK, Masterson TA, Vora KC, et al. Pathological upgrading and up staging with immediate repeat biopsy in patients eligible for active surveillance. J Urol. 2008;180:1964-8.

6. Rifkin MD, Zerhouni EA, Gatsonis CA, et al. Comparison of magnetic resonance imaging and ultrasonography in staging early prostate cancer. Results of a multiinstitutional cooperative trial. N Engl J Med. 1990;323:621-6.

7. Murphy G, Haider M, Ghai S, et al. The expanding role of MRI in prostate cancer. AJR Am J Roentgenol. 2013;201:1229-38.

8. Dickinson L, Ahmed HU, Allen C, et al. Magnetic resonance imaging for the detection, localisation, and characterisation of prostate cancer: recommendations from a European consensus meeting. Eur Urol. 2011;59:477-94.

9. Hambrock T, Somford DM, Hoeks C, et al. Magnetic resonance imaging guided prostate biopsy in men with repeat negative biopsies and increased prostate specific antigen. J Urol. 2010;183:520-7.

10. Bloch BN, Genega EM, Costa DN, et al. Prediction of prostate cancer extracapsular extension with high spatial resolution dynamic contrast-enhanced 3-T MRI. Eur Radiol. 2012;22:2201-10.

11. Rosenkrantz AB, Scionti SM, Mendrinos S, et al. Role of MRI in minimally invasive focal ablative therapy for prostate cancer. AJR Am J Roentgenol. 2011;197:W90-6.

12. Muglia VF, Westphalen AC, Wang ZJ, et al. Endorectal MRI of prostate cancer: incremental prognostic importance of gross locally advanced disease. AJR Am J Roentgenol. 2011;197:1369-74.

13. Margel D, Yap SA, Lawrentschuk N, et al. Impact of multiparametric endorectal coil prostate magnetic resonance imaging on disease reclassification among active surveillance candidates: a prospective cohort study. J Urol. 2012;187:1247-52.

14. Franca CAS, Vieira SL, Carvalho ACP, et al. Relationship between two year PSA nadir and biochemical recurrence in prostate cancer patients treated with iodine-125 brachytherapy. Radiol Bras. 2014;47:89-93.

15. Morgan VA, Riches SF, Giles S, et al. Diffusion-weighted MRI for locally recurrent prostate cancer after external beam radiotherapy. AJR Am J Roentgenol. 2012;198:596-602.

16. Mueller-Lisse UG, Vigneron DB, Hricak H, et al. Localized prostate cancer: effect of hormone deprivation therapy measured by using combined three-dimensional 1H MR spectroscopy and MR imaging: clinicopathologic case-controlled study. Radiology. 2001;221:380-90.

17. Bittencourt LK, Barentsz JO, de Miranda LC, et al. Prostate MRI: diffusion-weighted imaging at 1.5T correlates better with prostatectomy Gleason grades than TRUS-guided biopsies in peripheral zone tumours. Eur Radiol. 2012;22:468-75.

18. Blomqvist L, Carlsson S, Gjertsson P, et al. Limited evidence for the use of imaging to detect prostate cancer: a systematic review. Eur J Radiol. 2014;83:1601-6.

19. Barentsz JO, Richenberg J, Clements R, et al. ESUR prostate MR guidelines 2012. Eur Radiol. 2012;22:746-57.

20. Westphalen AC, Rosenkrantz AB. Prostate imaging reporting and data system (PIRADS): reflections on early experience with a standardized interpretation scheme for multiparametric prostate MRI. AJR Am J Roentgenol. 2014;202:121-3.

21. Bittencourt LK, Hausmann D, Sabaneeff N, et al. Multiparametric magnetic resonance imaging of the prostate: current concepts. Radiol Bras. 2014;47:292-300.

22. Bomers JG, Barentsz JO. Standardization of multiparametric prostate MR imaging using PI-RADS. Biomed Res Int. 2014;2014:431680.










Professor Associado da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP), Ribeirão Preto, SP, Brasil. E-mail: fmuglia@fmrp.usp.br
 
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