Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 36 nº 1 - Jan. / Fev.  of 2003

ARTIGO ORIGINAL
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Page(s) 27 to 34



Elaboração de um programa de monitoração ocupacional em radiologia para o Hospital Universitário Clementino Fraga Filho

Autho(rs): Sergio Ricardo de Oliveira, Ana Cecília Pedrosa de Azevedo, Antonio Carlos Pires Carvalho

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Texto em Português English Text

Descritores: Proteção radiológica, Exposição ocupacional, Controle de qualidade, Dosimetria de radiação, Radiologia

Keywords: Radiological protection, Occupational exposure, Quality control, Radiation dosimetry, Radiology

Resumo:
Foi elaborado um Programa de Monitoração Ocupacional em radiologia médica para o Hospital Universitário Clementino Fraga Filho da Universidade Federal do Rio de Janeiro, seguindo as normas e legislação nacional. Para a construção do Programa, realizou-se um levantamento de todos os Serviços e funcionários diretamente expostos às radiações ionizantes. Constatou-se que a maioria desses funcionários não era monitorada, que apenas três Serviços mantinham um controle de dose de trabalhadores com contratos de prestação de serviço independentes e que não havia controle para os casos de doses elevadas. Com a implantação do Programa, os passos seguintes foram a contratação da uma nova empresa que prestasse o serviço de monitoração pessoal, reduzindo significativamente o custo anual de operação com o contrato único para o hospital; a inclusão de mais sete Serviços que trabalham com radiações ionizantes, aumentando em mais de 60% o número de trabalhadores monitorados; o controle de doses elevadas, principalmente no setor de Hemodinâmica, que apresentou a maior média de dose (0,32 mSv/mês); e a monitoração de área, que foi realizada em períodos intercalados nos pontos considerados de maior risco para a população e os trabalhadores. Paralelamente, o Programa de Monitoração Ocupacional foi informatizado, sendo construído um banco de dados com o propósito de controlar e armazenar as doses funcionais. Com a implantação do Programa, começa-se a compreender os riscos de se trabalhar com radiações ionizantes, a partir dos conceitos de proteção radiológica, e conscientiza-se quanto ao uso correto dos monitores de dose.

Abstract:
An occupational monitoring program in diagnostic radiology was implemented at the "Hospital Universitário Clementino Fraga Filho - UFRJ", Rio de Janeiro, Brazil, in accordance with the Brazilian legislation. Previously, a survey of all personnel involved with ionizing radiation was performed. Many problems were observed: the great majority of the workers were not properly monitored; only three departments of the hospital kept an independent survey of the occupational doses; there was not a follow-up control of the high doses. With the implementation of the program, a new laboratory was chosen to read the dosemeters and this initiative resulted in reduction of the hospital costs. The inclusion of seven more departments in the program represented an increase of 60% in the number of monitored workers. The program also provided a system to control the high doses, especially in the Hemodynamics department, which presented the highest mean dose value (0.32 mSv/month). An area survey program was performed during different periods in places considered of high risk for the workers and for the public as well. At the same time, a software was used to build a database with the aim of controlling all personnel data. The implementation of the program provided all personnel involved a better knowledge of the risks associated with ionizing radiation and of radioprotection, and also awareness of the need of correct use of the personal dose monitors.

IIIDoutor em Radiologia, Professor Adjunto do Departamento de Radiologia e Coordenador Adjunto de Programa de Pós-Graduação em Radiologia da Faculdade de Medicina da UFRJ

Endereço para correspondência

 

 

INTRODUÇÃO

Apesar do benefício gerado pelo uso das radiações ionizantes, sabe-se que a interação da radiação com a matéria biológica pode produzir efeitos nocivos(1). Dentre todas as fontes de radiações ionizantes criadas pelo homem, as que mais contribuem para a sua exposição são as utilizadas em radiologia diagnóstica, se considerarmos que aproximadamente metade da população mundial realiza um exame radiológico por ano. Portanto, é necessária uma atenção especial para as exposições médicas. Segundo a International Commission on Radiological Protection (ICRP), a exposição médica é a única categoria na qual é possível a redução na dose média para a população(2).

Um estudo de 1992 apresentou a falta de vestimentas de proteção individual nos estabelecimentos e a ausência de controle médico periódico como alguns exemplos que demonstram o descaso em relação aos trabalhadores que estão expostos às radiações ionizantes, no Brasil(3).

Em um programa de monitoração ocupacional, os pontos de maior preocupação em relação aos trabalhadores expostos são: a jornada de trabalho, a formação dos funcionários, o treinamento periódico, a dosimetria pessoal e os exames médicos de rotina.

Constata-se, atualmente, que a maioria dos estabelecimentos fornece monitores individuais para os trabalhadores ocupacionalmente expostos às radiações ionizantes, porém os trabalhadores não são instruídos corretamente sobre as suas normas de utilização(3). Verifica-se, também, que em alguns casos os trabalhadores desconhecem a importância do uso dos monitores individuais, bem como desconhecem os limites de doses mensais recomendados. Como prova disso, em sua maioria, os trabalhadores não guardam seus monitores individuais junto ao monitor padrão, ao final do expediente, nem o utilizam corretamente, posicionando-o sobre o avental, conforme recomendações contidas na legislação nacional(4).

A Portaria 453/98(4) regulamenta que todo indivíduo que trabalha em área controlada deve usar, durante sua jornada de trabalho, monitor individual de leitura indireta, trocado mensalmente. A Portaria regulamenta, também, os limites de doses individuais, que são valores de dose efetiva ou de dose equivalente, não podendo exceder ao preestabelecido na resolução no 12/88 da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN).

Em 1999, a Comissão Técnica de Assessoramento à Reitoria para Atividades com Radiações Ionizantes (Cotar X) fez um levantamento das condições de monitoração individual do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho da Universidade Federal do Rio de Janeiro (HUCFF-UFRJ). Constatou-se que ocorriam várias discrepâncias de procedimentos no que se refere à proteção radiológica individual(1). Segundo a Cotar X, os trabalhadores foram divididos em três níveis de exposições, conforme a lei 8270/91: categoria 1 – trabalhadores ocasionalmente expostos e que circulam em área controlada; categoria 2 – trabalhadores que sofrem riscos indiretos (técnicos de radiologia); categoria 3 – trabalhadores que potencialmente poderão estar expostos (atividades com radioscopia e fontes não seladas).

As grandezas e os conceitos utilizados em dosimetria e proteção radiológica são apresentados nas publicações da International Commission on Radiation Units and Measurements (ICRU) e da ICRP. Presentemente, as principais grandezas recomendadas pela ICRP(2) e pela ICRU(5), para uso em proteção radiológica, com objetivos de limitação da exposição do homem à radiação ionizante, são:

a) Dose no órgão (DT), definida como sendo:

onde, mT é a massa do tecido ou órgão e D é a dose absorvida na massa de elemento dm.

b) Dose equivalente (HT) é:

onde, DT,R é a dose absorvida média no órgão ou tecido T, relativa à radiação incidente R, e WR é o fator de peso para os diversos tipos de radiação.

c) Dose efetiva (E) é definida como sendo o somatório do produto das doses equivalentes por um fator de peso para tecidos ou órgãos T:

Existem vários tipos de monitores de dose, que trabalham com materiais diferentes e que realizam a mesma tarefa. Entre os principais podemos destacar o monitor fotográfico (filme), o termoluminescente (TLD) e o eletrônico(6).

A dosimetria fotográfica é a avaliação da dose recebida pelo trabalhador, utilizando como medidor emulsões fotográficas dentro de um porta-dosímetro. A Tabela 1 apresenta as vantagens e desvantagens deste sistema.

 

 

Em 1895, o processo físico de liberação térmica da luminescência induzida pela radiação armazenada (termoluminescência) foi usado pela primeira vez para a detecção de radiação ionizante(7). Existem algumas vantagens e desvantagens listadas na Tabela 2 a respeito da utilização desse novo sistema de dosimetria, em comparação com o sistema utilizado anteriormente.

 

 

Existem, ainda, monitores eletrônicos, constituídos por detectores semicondutores na sua grande maioria, que podem fornecer, de imediato, o valor de dose de um trabalhador após qualquer procedimento. São de especial interesse em radiologia intervencionista(8).

Os benefícios provenientes de um programa de monitoração ocupacional são: demonstrar a adequação da supervisão, do treinamento e dos padrões de segurança do local de trabalho; avaliar e desenvolver práticas com radiação, por intermédio da coleta de dados, tanto para indivíduos como para grupos. Estes dados podem, também, ser utilizados para estudos epidemiológicos, análise de risco-benefício e para propósitos médico-legais, e para motivar os trabalhadores a reduzir suas exposições como resultado das informações que lhes são fornecidas.

Um programa abrangente de monitoração ocupacional de radiação não deve apenas controlar os registros de doses dos trabalhadores, mas também deve verificar todas as possíveis exposições à radiação que os indivíduos podem receber. De acordo com os padrões de segurança básica, publicados pela Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA)(9), um sistema deve incluir a avaliação das exposições externas, avaliação das doses absorvidas ou equivalente dose de corpo inteiro, de partes e órgãos do corpo. Deve incluir, ainda, um mecanismo para investigação das doses elevadas.

Os erros e as incertezas associados à monitoração são semelhantes aos encontrados nos processos experimentais. Porém, devido à estratégia utilizada na proteção radiológica, os erros resultam em uma subestimativa da exposição e merecem atenção especial(10,11).

Na Portaria do Ministério da Saúde (MS)(4), que retrata a ICRP 60(2,12), a dose efetiva média anual não deve exceder a 20 mSv em qualquer período de cinco anos consecutivos, não podendo exceder a 50 mSv em nenhum ano. Da mesma forma, a Portaria determina que a dose equivalente anual não deve exceder 500 mSv para extremidades e 150 mSv para o cristalino.

A ICRP definiu o nível de registro como sendo o valor a partir do qual deve ser realizado o registro numérico do valor medido da grandeza de interesse. Valores inferiores ao nível de registro são de pouca importância para a proteção radiológica, sendo considerados como zero(13).

No Brasil, segundo a Norma 3.01 da CNEN(14) e a Portaria 453/98 do MS(4), o valor considerado para nível de registro deve ser igual ou superior a 0,20 mSv.

A classificação de um trabalhador constando no "nível de investigação" significa que a sua dose mensal está entre 1,2 mSv e 4,0 mSv. Nesses casos, são realizadas investigações locais para averiguar o ocorrido, sendo necessária a justificativa de procedimentos do trabalhador durante o mês de referência(14,15).

A classificação de "ultrapassado no mês" é quando os valores de dose atingem o limite de 4,0 mSv. Nestas condições, as autoridades competentes são comunicadas do ocorrido, podendo a instituição ser vistoriada por órgão de fiscalização, e o funcionário, dependendo da gravidade da exposição, pode vir a ser suspenso de qualquer tipo de atividade que utilize radiações ionizantes(14,15).

O termo "dose desconhecida" é utilizado apenas nos casos em que o trabalhador foi monitorado, mas por algum motivo a dose não foi avaliada. Segundo o United Nations Scientific Committee on the Effects of Atomic Radiation (UNSCEAR)(16), deve-se atribuir ao período em que a dose é desconhecida um valor médio, obtido através de algumas medições, ou fração correspondente ao limite anual de dose.

No Brasil, para fins do cômputo da dose anual, o valor da dose desconhecida em um mês é estimado como a média dos valores medidos no ano em questão(14).

Classificação dos trabalhadores

Segundo as normas da AIEA, os trabalhadores devem ser classificados em duas categorias, de acordo com as condições de trabalho(9):

a) Condições de trabalho A – Nesta categoria os trabalhadores devem ser submetidos à monitoração individual para a radiação externa. As condições de saúde desses trabalhadores devem ser verificadas periodicamente a partir dos registros adequados de todas as exposições ocupacionais. Quando o equivalente de dose anual de um indivíduo se aproxima do limite, são necessárias medidas adicionais para demonstrar que as exposições estão dentro dos limites de dose. Essas medidas podem incluir dosímetros adicionais, ou mesmo o uso de dispositivos de leitura direta com nível de alarme ajustável.

b) Condições de trabalho B – Nesta categoria os trabalhadores normalmente não necessitam ser submetidos à monitoração individual para a radiação externa, sendo suficiente a monitoração do local de trabalho. Entretanto, a monitoração individual na condição de trabalho B pode ser realizada algumas vezes, para garantir que as condições são satisfatórias, ou para a compilação de dados estatísticos sobre distribuição de dose.

Monitoração de área

A monitoração do local de trabalho também segue os padrões da AIEA, sendo realizada para demonstrar que as condições de trabalho são satisfatórias ou para alertar sobre qualquer deterioração. Serve, também, para fornecer informações que facilitem a estimativa da exposição à radiação. Tal monitoração pode ser subdividida em três tipos(9,17):

a) Monitoração de rotina – A monitoração de rotina tem como objetivo aferir se as condições são satisfatórias para a continuação das operações. Sua natureza é predominantemente confirmatória.

b) Monitoração operacional – A monitoração é conduzida para fornecer informações sobre uma operação particular e, se necessário, servir de base para decisões imediatas na condução da operação. Ela é particularmente necessária quando são realizados procedimentos de curta duração sob condições que seriam insatisfatórias para o uso de longa duração.

c) Monitoração especial – A monitoração especial visa fornecer informações mais detalhadas, de modo a esclarecer os problemas e definir procedimentos futuros. Qualquer programa de monitoração especial deve, dessa forma, ter objetivos bem determinados e duração limitada, dando lugar à rotina apropriada, ou à monitoração operacional, quando os objetivos forem atingidos.

 

MATERIAL E MÉTODO

Ao iniciar o trabalho, constatou-se que existiam apenas três Serviços — Radiodiagnóstico, Medicina Nuclear e Patologia Clínica (Laboratório de Hormônios) — que já realizavam o controle dosimétrico. O Centro Cirúrgico, que abrange outros Serviços (Cirurgias em geral, Traumato-Ortopedia e Enfermagem) foi incluído posteriormente. Paralelamente ao levantamento de pessoal, foi feito o levantamento das empresas que prestam este tipo de serviço. Das propostas recebidas, foram analisados alguns pontos importantes, como: o tipo de monitor que seria utilizado (ergonomia); a disponibilidade para inclusão e/ou cancelamento de novos usuários mensalmente, pois trata-se de um hospital-escola e constantemente há alteração no quadro de pessoal (residentes, estagiários, prestadores de serviço, etc.), fato importante para a escolha da empresa prestadora de serviço; o custo mensal de leitura dos dosímetros. A empresa selecionada foi a que melhor atendeu a todas essas necessidades.

Iniciado o programa de monitoração, foram realizadas reuniões com cada Serviço e informações foram transmitidas a respeito da utilização do novo monitor.

A empresa que atualmente está realizando as atividades de monitoração individual fornece, além do monitor de lapela, que registra as doses na altura do tórax, o monitor de pulso, para registrar as doses de extremidade. O monitor de lapela é composto por três sensores do tipo TLD de CaSO4:Dy + teflon. Este monitor é considerado de alto desempenho, projetado para medir radiações do tipo X e gama.

Para o gerenciamento do programa foi elaborado um banco de dados, sobre a plataforma do Microsoft© Access 97®, que permite, de maneira simples e rápida, consultar dados como: doses mensais e acumuladas durante o ano; informações gerais sobre todos os trabalhadores monitorados, sobre a instituição e os Serviços aos quais estão vinculados os funcionários.

Monitoração de área

A monitoração de área foi iniciada no segundo semestre de 2000. A distribuição na fase de implantação ocorreu em apenas dez pontos, uma vez que o sistema estava em teste. No ano seguinte, a monitoração de área foi retomada e ampliada com a seleção de novos locais de monitoração, totalizando 20 pontos críticos.

 

RESULTADOS

Os funcionários, separados por Serviços, totalizavam 376 usuários monitorados, distribuídos conforme o Gráfico 1. Os valores entre parênteses são os números absolutos de trabalhadores por Serviço.

 

 

O Centro Cirúrgico, por sua vez, foi subdividido em outros Serviços, como se vê no Gráfico 2. Da mesma forma, os valores entre parênteses são os valores reais de funcionários.

 

 

No Gráfico 3 é apresentada a distribuição da dose média mensal, obtida segundo os Serviços analisados e a quantidade de funcionários. Estes valores são calculados utilizando as médias de dose registradas, ou seja, os valores de dose encontrados de todos os usuários de um mesmo Serviço, calculando-se a média aritmética. Deste modo, determina-se um valor aproximado de dose mensal para cada Serviço.

 

 

Foi aplicado para o Centro Cirúrgico o mesmo cálculo, porém observando os Serviços separadamente. No Gráfico 4 podemos notar uma discrepância acentuada no valor de dose média mensal entre o Serviço de Traumato-Ortopedia e os demais.

 

 

Foi criado um "software" para gerenciamento e armazenamento dos dados do programa, contendo: CGC, endereço, responsável pelo controle da monitoração ocupacional e o responsável pela proteção radiológica. Para o cadastro dos Serviços foram elaboradas duas telas, uma servindo para o cadastro de novos Serviços ou como consulta imediata, e outra servindo exclusivamente para alteração e/ou exclusão dos Serviços cadastrados. Igualmente aos anteriores, foi criado um formulário para o cadastro de pessoal. Nesse formulário, além de cadastrar, é possível localizar, editar ou excluir qualquer informação pessoal ou administrativa, de qualquer trabalhador monitorado, ou mesmo verificar as doses recebidas por ele.

Armazenamento e uso dos dosímetros

Uma das primeiras etapas de implantação do Programa de Monitoração Ocupacional foi a instrução quanto ao uso e forma correta de armazenamento dos monitores. Para isso, foi distribuído um aviso contendo as informações necessárias para a correta utilização dos monitores, ficando este aviso afixado ao lado do quadro de guarda dos monitores. Também devem ficar afixados os valores de dose mensal de todos os trabalhadores, fazendo com que o usuário seja estimulado a diminuir cada vez mais o seu valor de dose, simplesmente melhorando seus próprios procedimentos de trabalho.

Um questionamento, em relação aos monitores, é a utilização do avental plumbífero. De acordo com as recomendações da Portaria 453/98 do MS(4), os monitores devem ser usados por fora do avental e ao valor de dose correspondente será aplicado um fator de correção. Contudo, existem outros pesquisadores(18,19), e o próprio National Council on Radiation Protection and Measurements (NCRP)(20,21), que criticam a utilização exclusiva do monitor por fora do avental e sugerem, neste caso, a utilização de dois monitores por funcionário, um sendo utilizado por baixo do avental plumbífero e outro por cima do avental.

Monitoração de área

A monitoração de área foi realizada durante os meses de janeiro a julho de 2001, com períodos de análise de um, dois e até três meses de utilização do mesmo monitor. Os resultados podem ser visto no Quadro 1.

A Tabela 3 apresenta os resultados encontrados, com os respectivos valores de porcentagem para os casos de doses elevadas (NI, nível de investigação; UM, ultrapassado no mês), monitores entregues com atraso e monitores extraviados, separados por Serviços.

 

 

As vantagens do fornecimento dos monitores por uma só empresa estão apresentadas no Quadro 2. Pode-se observar que, se o modelo adotado fosse o contrato individual, o custo anual da monitoração aumentaria mais de 30% em comparação ao custo com o contrato único para todo o hospital.

 

 

DISCUSSÃO

O resultado do levantamento feito pela Cotar X mostrou que os profissionais classificados na categoria 3 não utilizavam monitores de dose pessoal, enquanto a maioria dos profissionais classificados na categoria 1, em que o fator de risco é pequeno, era monitorada mensalmente, sem apresentar nenhum valor de dose mensal. Assim, houve a necessidade de criar um Programa de Monitoração Ocupacional que reorganizasse essa estrutura.

Com base nos resultados apresentados nos Gráficos 1 e 2, foi percebido o quanto era falho o sistema de monitoração ocupacional, se considerarmos que mais da metade dos trabalhadores que lidam diretamente com radiações ionizantes não eram monitorados. Dois fatores podem justificar essa falta de controle da instituição: o primeiro seria a descentralização dos contratos de prestação de serviço de monitoração, ficando sob responsabilidade de cada Serviço; o segundo seria a distribuição e classificação errônea dos trabalhadores, uma vez que não havia na instituição quem pudesse orientar tal controle.

No Centro Cirúrgico foi observado que todo o corpo de Enfermagem (45% dos indivíduos estudados) é monitorado, embora nem todos os funcionários realizem atividades em que se empregam radiações ionizantes. Este fato ocorre porque há sempre revezamento de trabalhadores, isto é, não existem funcionários fixos em cada sala de cirurgia.

No Gráfico 3 percebe-se que é justificada a preocupação com a proteção radiológica no setor de Hemodinâmica, pois o valor encontrado para a dose média mensal neste setor é 88% maior que o somatório dos outros Serviços.

O Laboratório de Hormônios e a Medicina Nuclear, que trabalham com fontes não seladas, foram os Serviços que apresentaram os menores índices de dose média mensal. Este fator se deve, principalmente, ao treinamento a que foram submetidos os funcionários de ambos os Serviços, e à presença de um físico no local, como é o caso da Medicina Nuclear, que orienta e controla constantemente os funcionários para os riscos de se trabalhar com radiações ionizantes(22).

Nos resultados apresentados pelo Centro Cirúrgico foi verificado que a dose média mensal do Serviço de Traumato-Ortopedia é 62,5% maior que o somatório dos outros Serviços. Tal fato se justifica pelo número elevado de procedimentos que usam equipamentos móveis de radiografia e cirurgias que necessitam do uso de radioscopia.

Em determinados momentos a monitoração pessoal foi prejudicada, por causa de extravio de monitores, falta de cuidado com o equipamento de monitoração (molhando ou danificando o lacre de segurança), entrega com atraso ou três meses de utilização sem troca, ou mesmo o uso incorreto (expondo diretamente à radiação ou posicionando o monitor sob o avental plumbífero). É importante ressaltar que o registro de doses baixas durante a monitoração não é uma justificativa suficiente, por si só, para a reclassificação de um trabalhador da condição A para a condição B, devendo ficar claro que as condições que resultam em doses baixas têm baixa probabilidade de serem alteradas.

No que se refere à monitoração de área, foi verificado que o período de um mês é o mais eficiente para diagnosticar problemas de exposição excessiva nas áreas. Os períodos de dois ou três meses mostraram ser menos eficientes. Esta conclusão justifica-se pelos resultados apresentados nos monitores 9 e 13 localizados na sala 02 do setor de Hemodinâmica. Observa-se que os valores de dose durante o período de um mês foram superiores aos períodos de dois e três meses, à exceção do período de dois meses do monitor 13, que registrou um valor zero. Isso foi provocado por uma alteração no posicionamento do monitor em relação à mesa de exame, fazendo com que o monitor não ficasse diretamente exposto à radiação. Outros resultados que poderiam deixar dúvidas quanto às conclusões foram os apresentados pelos monitores 6 e 11 para o período de três meses, mas que foram justificados. O resultado apresentado pelo monitor de número 6 se justifica pela inconsistência de funcionamento do equipamento dentro deste período, que esteve fora de operação quase todos os meses. Já o resultado do monitor 11 se justifica pelo pouquíssimo uso da sala, onde quase não houve realização de exames durante esses meses. Por outro lado, os valores para os monitores 12 e 16 para o período de dois meses só se justificam por problemas de procedimentos. Outra observação é a redução de dose, se compararmos os resultados obtidos nos meses de janeiro e maio de 2001. À exceção dos monitores que estavam localizados na sala 02 da Hemodinâmica, que apresentava problemas de colimação no aparelho, todos os outros apresentaram redução ou não registraram valores de dose.

Quanto ao registro de dose em níveis acima de 1,2 mSv (NI), observa-se pela Tabela 3 que na maioria dos Serviços não houve casos dessa natureza, mesmo para os Serviços de Medicina Nuclear e Laboratório de Hormônios, que trabalham com fontes não seladas. O ponto de maior destaque na Tabela 3, na parte de NI, são os resultados encontrados para o Serviço de Radiodiagnóstico em comparação com os resultados da Hemodinâmica. Percebe-se que a quantidade de casos registrados para a Hemodinâmica é pouco menos que a metade dos casos registrados no Radiodiagnóstico, número elevado considerando que o Serviço de Radiodiagnóstico tem aproximadamente o triplo de funcionários que a Hemodinâmica.

Da mesma forma, foram comparados os resultados para os casos de dose registrados acima dos 4,0 mSv ao mês (UM). Novamente, o número de casos registrados na Hemodinâmica foi bastante significativo, em comparação com os demais Serviços.

Outro ponto importante foram os três casos registrados para o Serviço de Traumato-Ortopedia. Um dos casos foi comentado anteriormente, em que o usuário esqueceu seu monitor na sala de exames; os outros dois foram justificados pelo número excessivo de cirurgias realizadas durante o mês e pela falta de conhecimento a respeito da proteção radiológica.

Para o controle das doses elevadas, foi criado um formulário em que o usuário justifica os procedimentos realizados e, conseqüentemente, são tomadas medidas de segurança para o controle das doses. Este documento, posteriormente, é arquivado, servindo de justificativa para futuras investigações pelos órgão sanitários competentes.

Seguindo o mesmo esquema, nas quantidades de monitores entregues com atraso ou extraviados, observa-se que os resultados encontrados para ambos foram elevados. A principal causa, no início, para a entrega de monitores com atraso, deveu-se ao fato de que os Serviços não possuíam um local adequado para o armazenamento dos monitores. Posteriormente, foi verificado, também, que os usuários não armazenavam seus monitores no quadro junto aos demais no final do expediente e, como conseqüência, isto prejudicava na veracidade do valor de dose do usuário, uma vez que os monitores somente eram devolvidos no mês seguinte.

Para os casos de monitores extraviados, o número excessivo se justifica pela falta de punição para os usuários por parte da direção do hospital, pois como se trata de funcionários públicos, o único meio legal para a cobrança do custo do monitor é mediante um inquérito administrativo, e processos cível e penal, conforme contido na lei 8112/90.

Como já mencionado, cada Serviço era responsável pela monitoração ocupacional de seus trabalhadores e, como conseqüência, cada um mantinha o seu contrato de prestação de serviço com uma determinada empresa. Curiosamente, os três Serviços tinham como contratante a mesma empresa para monitoração, porém havia três contratos diferentes para a realização do mesmo serviço. A comparação entre os contratos, único e individual de prestação de serviço de monitoração, apresentados no Quadro 2, foi realizada com o propósito de apresentar para a direção do hospital a diferença de custos de cada um dos contratos. Perante os resultados, que apresentavam uma economia de 23,3% ao mês para o hospital, a decisão da direção foi em permanecer com o contrato único, cabendo a cada Serviço o controle de seus funcionários e a um setor do hospital o controle geral da monitoração ocupacional.

 

CONCLUSÕES

É possível gerenciar toda a dosimetria de uma instituição como o HUCFF-UFRJ, apenas usando aplicativos do tipo banco de dados, que são disponibilizados comercialmente ou mesmo gratuitamente. É possível gerenciar a monitoração de áreas críticas em uma instituição com o porte e a complexidade do HUCFF, assegurando o controle de dose em áreas livres ou em circulação de pessoas e/ou funcionários. Com a elaboração do Programa de Monitoração Ocupacional, é possível corrigir o problema de distribuição de monitores e classificação dos usuários que não são expostos às radiações ionizantes. Este programa, elaborado para o HUCFF, pode servir de modelo para outras instituições realizarem o controle de monitoração ocupacional.

Agradecimentos

Agradecemos à Capes, que foi de extrema importância para a conclusão deste trabalho.

 

REFERÊNCIAS

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Endereço para correspondência
Dra. Ana Cecília P. de Azevedo
Fiocruz, ENSP/CESTEH
Rua Leopoldo Bulhões, 1480
Rio de Janeiro, RJ, 21041-210
E-mail: acpa@ensp.fiocruz.br

Recebido para publicação em 22/8/2002.
Aceito, após revisão, em 3/9/2002.

 

 

* Trabalho realizado no Departamento de Radiologia da Faculdade de Medicina e no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF), ambos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Rio de Janeiro, RJ
1 Físico, Mestre em Ciências do Curso de Pós-Graduação em Radiologia pela Faculdade de Medicina da UFRJ
2 Doutora em Física, Física da Escola Nacional de Saúde Pública (ENSP) da Fundação Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz)
3 Doutor em Radiologia, Professor Adjunto do Departamento de Radiologia e Coordenador Adjunto de Programa de Pós-Graduação em Radiologia da Faculdade de Medicina da UFRJ


 
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