Radiologia Brasileira - Publicação Científica Oficial do Colégio Brasileiro de Radiologia

AMB - Associação Médica Brasileira CNA - Comissão Nacional de Acreditação
Idioma/Language: Português Inglês

Vol. 41 nº 4 - Jul. / Ago.  of 2008

ARTIGO ORIGINAL
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Page(s) 251 to 254



Ressonância magnética das vias lacrimais: estudo comparativo entre bobinas de superfície convencionais e microscópicas

Autho(rs): Luiz de Abreu Junior, Angela Maria Borri Wolosker, Maria Lucia Borri, Mário de Melo Galvão Filho, Giuseppe D'Ippolito, Luiz Guilherme de Carvalho Hartmann, Cláudio Campi de Castro

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Texto em Português English Text

Descritores: Imagem por ressonância magnética, Vias lacrimais, Dacriocistografia, Bobina microscópica

Keywords: Magnetic resonance imaging, Lacrimal apparatus, Dacryocystography, Microscopic coil

Resumo:
OBJETIVO: A ressonância magnética tem sido utilizada para avaliar as vias lacrimais, com vantagens em relação à dacriocistografia por raios-X. O objetivo deste trabalho é obter imagens de alta resolução utilizando bobinas de superfície microscópicas para avaliação de estruturas normais das vias lacrimais, comparando com o aspecto observado utilizando-se bobinas de superfície convencionais. MATERIAIS E MÉTODOS: Cinco voluntários assintomáticos, sem histórico de lacrimejamento, submeteram-se a ressonância magnética de alto campo, com bobinas de superfície (convencional e microscópica), com seqüência STIR após instilação de soro fisiológico. A identificação das estruturas anatômicas normais das vias lacrimais foi comparada utilizando-se as duas bobinas. Mediante uso de um sistema de escore, um valor médio de cada estrutura foi calculado por dois examinadores, consensualmente. RESULTADOS: Em 90% das vezes houve aumento do escore, atribuído à estrutura anatômica no estudo com a bobina microscópica. Em média, houve aumento de 1,17 ponto no escore, por estrutura anatômica visualizada, quando se utilizou a bobina microscópica. Observou-se, ainda, melhora subjetiva da relação sinal-ruído ao se utilizar a bobina microscópica. CONCLUSÃO: A dacriocistografia por ressonância magnética com bobinas microscópicas é um método adequado para o estudo das vias lacrimais, resultando em imagens de melhor qualidade quando comparada ao uso de bobinas de superfície convencionais.

Abstract:
OBJECTIVE: Magnetic resonance imaging has been utilized in the evaluation of the lacrimal apparatus with some advantages over conventional dacryocystography. The present study was aimed at acquiring high-resolution images utilizing microscopic coils for evaluating typical structures of the lacrimal apparatus as compared with the findings observed with conventional surface coils. MATERIALS AND METHODS: Five asymptomatic volunteers with no history of epiphora were submitted to high-field magnetic resonance imaging with microscopic and conventional surface coils, and STIR sequence after instillation of saline solution. The definition of normal anatomic structures of lacrimal apparatuses was compared utilizing conventional and microscopic surface coils. Based on a consensual scoring system, the mean values for each structure were calculated by two observers. RESULTS: In 90% of cases, higher scores were attributed to images acquired with the microscopic coil. On average, a 1.17 point increase was observed in the scoring of anatomic structures imaged with the microscopic coil. Additionally, a subjective improvement was observed in the signal-to-noise ratio with the microscopic coil. CONCLUSION: Magnetic resonance dacryocystography with microscopic coils is the appropriate method for evaluating the lacrimal apparatus, providing images with better quality as compared with those acquired with conventional surface coils.

Endereço para correspondência

 

 

INTRODUÇÃO

Os problemas de drenagem das lágrimas têm prevalência estimada de 3%(1) e representam queixa relativamente freqüente em pacientes oftalmológicos. Epífora, que representa lacrimejamento excessivo por causa obstrutiva, pode dever-se a inflamações, tumores, trauma, intervenção cirúrgica, radioterapia ou alterações congênitas. A avaliação propedêutica das vias lacrimais inclui provas clínicas (sondagem e irrigação) e exames de imagem.

Os métodos de imagem disponíveis para a avaliação das vias lacrimais são a dacriocistografia por raios-X, a dacriocintilografia (medicina nuclear), a dacriocistografia por tomografia computadorizada e a dacriocistografia por ressonância magnética (RM).

A dacriocistografia por RM é hoje excelente opção diagnóstica ao estudo das vias lacrimais, com potenciais vantagens. Por não utilizar radiações ionizantes, não há acúmulo de risco ao desenvolvimento de catarata. A RM oferece elevada resolução (contraste) de partes moles, valendo-se da instilação de soro fisiológico ou de solução de gadolínio diluído, combinando a ausência de invasibilidade com a possibilidade de avaliação de alterações de natureza funcional. Tradicionalmente, utilizam-se bobinas de superfície para a obtenção de imagens diagnósticas. Com a introdução de bobinas ditas microscópicas, isto é, bobinas de superfície com diâmetros reduzidos, permitindo aumento do sinal de estruturas superficiais e conseqüente melhora da relação sinal-ruído, vislumbramos a possibilidade do estudo das estruturas normais das vias lacrimais em voluntários assintomáticos, comparando com os resultados obtidos por bobinas de superfície convencionais.

 

MATERIAIS E MÉTODOS

Foi realizado estudo prospectivo em cinco voluntários assintomáticos (dez vias lacrimais), duas mulheres e três homens, com idade variando entre 29 e 33 anos (média de 31,2 anos). Esses indivíduos foram submetidos a exames de RM em aparelho Intera 1.5T (Philips Medical Systems; Best, Holanda) utilizando-se bobinas de superfície convencional (C1 – 160 mm) e microscópica (47 mm).

Inicialmente, o exame era realizado com bobina denominada C1, utilizada na maior parte das aplicações clínicas que exigem estudo de estruturas superficiais. Em seguida, utilizava-se uma outra bobina de superfície, denominada de "microscópica", que se caracteriza por diâmetros internos reduzidos (menores que 5,0 cm). Pelas suas características, tal bobina resulta em aumento significativo do sinal de estruturas com localização superficial, sem aumento concomitante do ruído, oferecendo voxels menores sem prejuízo da qualidade. A bobina utilizada em nosso estudo tinha diâmetro interno de 47 mm (microscopic coil – Philips Medical Systems; Best, Holanda). Utilizou-se seqüência STIR (TR = 3.800 ms / TE = 90 ms / TI = 180 ms / 1,8 mm de espessura) com ponderação T2, após instilação de duas gotas de soro fisiológico por minuto, em ambos os sacos conjuntivais, durante cinco minutos. A mesma seqüência foi realizada utilizando-se as duas bobinas diferentes, com intervalos de cinco a dez minutos entre as suas aquisições.

Dois examinadores (uma radiologista especialista em cabeça e pescoço e um radiologista geral), em consenso, qualificaram subjetivamente, por meio de sistema de escore, a definição anatômica das diversas estruturas que compõem as vias lacrimais (canalículos lacrimais superior e inferior, saco lacrimal e ducto nasolacrimal). O sistema de escore utilizado foi: 0, estrutura não-visualizada; 1, má-visualização da estrutura; 2, boa visualização da estrutura; 3, ótima visualização da estrutura.

 

RESULTADOS

A avaliação realizada por consenso pelos dois radiologistas está resumida na Tabela 1.

 

 

 

 

Em 90% das vezes (36 das 40 estruturas das vias lacrimais analisadas) houve aumento do escore atribuído à estrutura anatômica no estudo com a bobina microscópica, quando comparado ao estudo realizado com a bobina de superfície C1. Em média, houve aumento de 1,17 ponto no escore utilizado, por estrutura anatômica visualizada, quando se utilizou a bobina microscópica. Para apenas quatro estruturas — 10% do total das estruturas analisadas (os dois ductos nasolacrimais do caso 2 e os dois sacos lacrimais do caso 5) — não houve incremento do escore atribuído a elas com o uso da bobina microscópica. Observou-se melhora subjetiva da relação sinal-ruído em todos os casos analisados, quando se compararam as imagens com a bobina microscópica em relação às obtidas com a bobina de superfície convencional.

 

 

 

 

 

 

DISCUSSÃO

Epífora — hiperlacrimejamento decorrente de deficiência de drenagem — representa queixa freqüente(1) em consultórios oftalmológicos (cerca de 3% das visitas ambulatoriais). Para se estabelecer a melhor conduta terapêutica a ser adotada (dacriocistorrinostomia, dacriocistoplastia, stent nasolacrimal ou irrigação com antibióticos), a informação sobre o nível e o tipo de obstrução é muito importante. Para tanto, além do exame clínico, deve se utilizar também um método de imagem para se atingir este objetivo.

Os princípios da dacriocistografia por raios-X foram descritos por Ewing em 1909 e até recentemente foi o método de imagem mais freqüentemente utilizado para o estudo das vias lacrimais. Apesar de proporcionar excelente delineamento anatômico, esta técnica é relativamente invasiva e envolve certos riscos, como trauma iatrogênico e estenoses após a cateterização. Há também as desvantagens de utilizar radiação ionizante (nociva ao cristalino) e de não oferecer informações funcionais, uma vez que o contraste é administrado sob pressão por uma seringa/cateter.

A dacriocintilografia é uma alternativa para o estudo de alterações funcionais das vias lacrimais, apresentando, entretanto, como desvantagem, a baixa resolução espacial para as estruturas de partes moles orbitárias, além de também expor o cristalino à radiação.

A dacriocistografia por tomografia computadorizada, apesar de se revelar boa alternativa para o estudo das vias lacrimais, apresenta também desvantagens relativas, ligadas ao uso de radiação ionizante e ao potencial irritativo do contraste iodado para a conjuntiva.

A RM tem sido relatada, na literatura, como um método viável ao estudo das vias lacrimais. Suas principais vantagens em relação aos demais métodos são: não-utilização de radiação ionizante; ausência de invasibilidade (instilação em vez de cateterização); avaliação anatômica e funcional; avaliação bilateral simultânea.

 

 

 

 

O exame pode ser realizado utilizando-se seqüências com ponderação T1 ou com ponderação T2(2–7). Nas seqüências T1, uma solução de gadolínio diluída funciona como meio de contraste; nas seqüências T2, como utilizado em nossos casos, o soro fisiológico a 0,9% é o meio que permite a identificação da via lacrimal.

O uso de bobinas de superfície permite a obtenção de imagens de alta qualidade de estruturas anatômicas de localização superficial, condição na qual se incluem as estruturas normais das vias lacrimais. As bobinas convencionais, com diâmetros maiores, podem produzir imagens com relação sinal-ruído não-ótima, ao se utilizar cortes de espessura muito fina. Em nosso protocolo, os cortes de 1,8 mm de espessura apresentaram-se relativamente ruidosos com o uso da bobina convencional. Apesar de a maior parte das estruturas ter sido visualizada com esta bobina, tais estruturas foram qualificadas como de visualização não-ótima.

Há vários relatos na literatura referentes à melhora da relação sinal-ruído com o uso de bobinas microscópicas para a avaliação de estruturas de vários tecidos diferentes, como ligamentos e meniscos do joelho(8) e linfonodos cervicais patológicos(9). O nosso estudo é condizente com esses relatos, tendo em vista que todas as estruturas das vias lacrimais foram mais bem caracterizadas ao exame com bobina microscópica, mesmo quando algum artefato esteve presente (por exemplo, artefatos de movimento). Este aspecto é especialmente relevante quando consideramos a identificação dos canalículos lacrimais. Por serem estruturas de pequeno calibre, a visualização destas é algumas vezes limitada quando são utilizadas bobinas de superfície convencionais(2). No nosso estudo houve melhora da caracterização dos canalículos lacrimais com a utilização da bobina microscópica. Tal constatação permite que vislumbremos a possibilidade de aprimoramento do diagnóstico de obstrução das vias lacrimais, especialmente das obstruções altas (pré-saculares). Entretanto, serão necessários estudos com indivíduos sintomáticos para a certificação dessa hipótese.

 

CONCLUSÃO

A dacriocistografia por RM utilizando-se bobinas microscópicas é um método adequado para a identificação de estruturas normais das vias lacrimais, resultando em imagens de melhor qualidade quando comparada ao uso de bobinas de superfície convencionais.

 

REFERÊNCIAS

1. Linberg JV, McCormick SA. Primary acquired nasolacrimal duct obstruction. A clinicopathologic report and biopsy technique. Ophthalmology. 1986;93:1055–63.         [  ]

2. Caldemeyer KS, Stockberger SM Jr, Broderick LS. Topical contrast-enhanced CT and MR dacryocystography: imaging the lacrimal drainage apparatus of healthy volunteers. AJR Am J Roentgenol. 1998;171:1501–4.         [  ]

3. Kirchhof K, Hähnel S, Jansen O, et al. Gadolinium-enhanced magnetic resonance dacryocystography in patients with epiphora. J Comput Assist Tomogr. 2000;24:327–31.         [  ]

4. Yoshikawa T, Hirota S, Sugimura K. Topical contrast-enhanced magnetic resonance dacryocystography. Radiat Med. 2000;18:355–62.         [  ]

5. Takehara Y, Isoda H, Kurihashi K, et al. Dynamic MR dacryocystography: a new method for evaluating nasolacrimal duct obstructions. AJR Am J Roentgenol. 2000;175:469–73.         [  ]

6. Manfrè L, de Maria M, Todaro E, et al. MR dacryocystography: comparison with dacryocystography and CT dacryocystography. AJNR Am J Neuroradiol. 2000;21:1145–50.         [  ]

7. Hoffmann KT, Hosten N, Anders N, et al. High-resolution conjunctival contrast-enhanced MRI dacryocystography. Neuroradiology. 1999;41: 208–13.         [  ]

8. Niitsu M, Ikeda K. Magnetic resonance microscopic images with 50-mm field-of-view of the medial aspect of the knee. Acta Radiol. 2004;45: 760–8.         [  ]

9. Sumi M, Van Cauteren M, Nakamura T. MR microimaging of benign and malignant nodes in the neck. AJR Am J Roentgenol. 2006;186:749–57.         [  ]

 

 

Endereço para correspondência:
Dr. Luiz de Abreu Jr
Rua Doutor Alceu de Campos Rodrigues, 95/143, 1º subsolo
São Paulo, SP, Brasil, 04544-000
E-mail: abreu_jr@terra.com.br

Recebido para publicação em 4/9/2007. Aceito, após revisão, em 4/12/2007.

 

 

* Trabalho realizado na Scopo Diagnóstico, Serviço de US, TC e RM do Hospital São Luiz, São Paulo, SP, Brasil.


 
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